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MP diz que Lacerda pode continuar alegada actividade criminosa porque Costa, "o seu melhor amigo", está em funções até dia 10 de março

Procuradores recorrem para a Relação de Lisboa para que sejam reconhecidos perigos de actividade criminosa e perturbação de inquérito, mas deixam cair pedido de prisão preventiva.

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Os três procuradores do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) que estão à frente da investigação da Operação Influencer solicitam no recurso que apresentaram no Tribunal da Relação de Lisboa que este tribunal superior reconheça os perigos de continuação de atividade criminosa e de perturbação de inquérito dos cinco arguidos detidos em novembro. Para tal, alegam que “existe a forte possibilidade de o arguido Diogo Lacerda Machado” poder “continuar a actividade criminosa”, “tanto mais que o primeiro-ministro [António Costa]”, tido “como o seu melhor amigo, continuará em funções pelo menos até ao dia 10 de Março de 2024”, lê-se no texto do recurso ao qual o Observador teve acesso.

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Os procuradores João Paulo Centeno, Hugo Neto e Ricardo Correia Lamas consideram que o mesmo perigo, e as mesmas razões, “sucedem quanto ao arguido Vítor Escária”. Para enfatizarem a ligação de Escária a António Costa, os magistrados recordam o facto de o economista ter sido nomeado por Costa como chefe de gabinete do primeiro-ministro logo após o final do prazo da suspensão provisória de processo Galpgate.

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O que quer o Ministério Público com o recurso?

Apesar de o recurso do DCIAP solicitar ao Tribunal da Relação de Lisboa que imponha uma parte das medidas cautelares que o juiz de instrução Nuno Dias Costa recusou, o certo é que os pedidos de prisão preventiva acabam por cair.

Os procuradores mantêm que, com os “elementos probatórios existentes”, era possível ao juiz Nuno Dias Costa decretar a prisão preventiva de Escária e Lacerda. Mas reconhecem que a “exoneração de funções de Vítor Escária”, o “pedido de demissão do primeiro-ministro” e a “dissolução da Assembleia da República e a marcação de eleições a 10 de março de 2024” são “circunstâncias com manifesto relevo para a tomada de decisão” — o que motiva a retirada da solicitação de prisão preventiva.

Contudo, o Ministério Público continua a entender que existe perigo de perturbação de inquérito e continuidade da atividade criminosa.

Os procuradores destacam mesmo que Diogo Lacerda Machado pode "continuar a actividade criminosa", nomeadamente devido aos seus "conhecimentos pessoais". "tanto mais que o primeiro-ministro [António Costa], tido como o seu melhor amigo, continuará em funções pelo menos até ao dia 10 de Março de 2024".

“Nada exclui que [Lacerda Machado e Vitor Escária] possam continuar a desenvolver a sua rede de contactos junto de diversas entidades e titulares de cargos políticos em prol de entidades privadas, como a Start Campus”, lê-se no recurso apresentado pelo Ministério Público.

Os procuradores destacam mesmo que existe “a forte probabilidade” de Diogo Lacerda Machado poder “continuar a actividade criminosa”, nomeadamente devido aos seus “conhecimentos pessoais”. “Tanto mais que o primeiro-ministro [António Costa], tido como o seu melhor amigo, continuará em funções pelo menos até ao dia 10 de Março de 2024”.

O mesmo acontece com Vítor Escária. Daí que o Ministério Público solicite à Relação de Lisboa que imponha a Escária uma caução de 150 mil euros — idêntica à de Lacerda Machado — e aplique proibição de contactos com “outros arguidos”, bem como “com membros do Governo — atuais ou futuros — e ainda dirigentes de diversos organismos públicos com interações com a Start Campus. E ainda uma obrigação de não frequentarem os espaços da Start Campus e todos os ministérios que foram contactados.

Galamba: “autor e verdadeiro mentor” sobre alegado favorecimento legislativo à Start Campus

Além de contestar as medidas de coação aplicadas pelo juiz de instrução criminal, o Ministério Público quer ainda que a Relação de Lisboa dê como “fortemente indiciados os imputados crimes de corrupção e prevaricação, bem como na parte em que considerou também que determinada factualidade não integrava o crime de tráfico de influência”.

Por exemplo, os procuradores querem que sejam reconhecidos os indícios recolhidos da alegada prática do crime de prevaricação por parte do ex-ministro João Galamba — que classificam como o “autor e verdadeiro mentor dos factos” relacionados com um alegado favorecimento da Start Campus de legislação feita à medida dos interesses urbanísticos da empresa que irá criar um dos maiores data centers da União Europeia.

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O crime de prevaricação que o Ministério Público imputa a João Galamba terá sido praticado em regime de co-autoria com os advogados Rui Oliveira Neves e João Tiago Silveira e está relacionado com a aprovação de legislação em sede de Conselho de Ministros denominada Simplex Industrial.

Na prática, e segundo o Ministério Público, João Galamba terá contactado a 12 de outubro Diogo Lacerda Machado para lhe solicitar informação concreta para incluir os data centers na legislação Simplex Industrial. Mais tarde, Rui Oliveira Neves contactou o seu colega de escritório João Tiago Silveira, que coordenava um grupo de trabalho para a criação do Simplex Industrial, e solicitou-lhe alterações concretas. Tudo em articulação e mesmo a pedido do arguido Galamba, diz o Ministério Público.

Na prática, e segundo o MP, João Galamba terá contactado a 12 de outubro Diogo Lacerda Machado para lhe solicitar informação concreta para incluir os data centers na legislação "Simplex Industrial". Mais tarde, Rui Oliveira Neves contactou o seu colega de escritório João Tiago Silveira, que coordenava um grupo de trabalho para a criação do Simplex Industrial, e solicitou-lhe alterações concretas. Tudo em articulação e mesmo a pedido do arguido Galamba.

“Ora, tendo tomado conhecimento do regime legal que estava em vias de ser aprovado e com o propósito de beneficiar indevidamente os interesses da Start Campus, o arguido João Galamba formulou o propósito de fazer introduzir em tal diploma disposições legais que abrangessem” a empresa do data center e “permitissem que esta beneficiasse das medidas de agilização de procedimentos que ficaram consagradas”, lê-se no recurso.

O juiz de instrução Nuno Dias Costa não deu estes factos com fortemente indiciados, mas o Ministério Público vem agora insistir no contrário.

Os erros do juiz, segundo o Ministério Público

Os três procuradores do DCIAP apontam um conjunto de erros ao magistrado titular dos autos no Tribunal Central de Instrução Criminal, nomeadamente em termos de interpretação jurídica dos requisitos dos crimes de prevaricação, tráfico de influência e corrupção.

Em termos genéricos, os erros terão sido os seguintes:

  • “Na apreciação dos elementos típicos dos crimes em apreço e na qualificação jurídica, em abstracto, dos factos que foram descritos pelo Ministério Público”;
  • “Na apreciação da prova carreada para os autos e no juízo de indiciação desses factos”;
  • “Na apreciação dos perigos e exigências cautelares verificadas e nas medidas de coacção demandadas”.

Por exemplo, o Ministério Público contesta a interpretação do juiz sobre o que é o crime de tráfico de influência e o que é um crime de prevaricação. Na óptica dos procuradores, o juiz Nuno Dias Costa exige uma relação causa/efeito entre a solicitação e a consumação da influência.

Por exemplo, o Ministério Público contesta a interpretação do juiz sobre o que é o crime de tráfico de influência e o que é um crime de prevaricação. Na óptica dos procuradores, o juiz Nuno Dias Costa exige uma relação causa/efeito entre a solicitação e a consumação da influência.

Na ótica do Ministério Público, a “ilicitude” da decisão pretendida ou “vendida” por quem exerceu influência afere-se à luz da violação ou não de deveres inerentes ao cargo da pessoa ou entidade a influenciar. E não tendo em conta o resultado da influência ou o objetivo da mesma.

Por defender que os crimes de tráfico de influência, prevaricação e corrupção ativa e passiva devem ser considerados como fortemente indiciados pela Relação de Lisboa, o Ministério Público defende a imposição das seguintes medidas de coação para os seguintes arguidos:

Diogo Lacerda Machado e Vítor Escária:

  • Obrigação de não contactarem com membros do Governo — “atuais ou futuros” — e ainda dirigentes de várias entidades públicas, como da Câmara Municipal de Sines, a AICEP e a Agência Portuguesa do Ambiente, por exemplo.
  •  Prestação de caução de 150 mil euros para Vitor Escária, semelhante à que foi prestada por Lacerda Machado.

Nuno Mascarenhas:

  • Suspensão do exercício de qualquer cargo político, concretamente do cargo de Presidente da Câmara Municipal de Sines
  • Obrigação de não contactar com todos os demais arguidos, bem como os funcionários da Câmara Municipal de Sines referidos no despacho de apresentação
  • Obrigação de não frequentar diversos edifícios da Câmara Municipal de Sines.

Afonso Salema e Rui Oliveira Neves:

  • Obrigação de não contactar com outros arguidos, bem como com membros do Governo — actuais ou futuros — e ainda dirigentes das demais entidades referidas no despacho de apresentação, concretamente a Câmara Municipal de Sines, a AICEP, a AICEP Global parques, a ApA, o ICNF, a DGEG e a REN;
  • Obrigação de não frequentar os espaços da Start Campus, Ministérios e Secretarias de Estado e respectivos gabinetes de apoio e as restantes entidades atrás referidas;
  • Obrigação de não se ausentar para o estrangeiro;
  • Prestação de caução.

Start Campus:

  • Obrigação de que os representantes da empresa apenas contactem com qualquer membro do Governo em contexto formal e institucional — ou seja, com registo documentado do que foi falado e apresentado. E proibição de contactos com os restantes arguidos em qualquer circunstância.

Três pontos em que o Ministério Público mudou a sua perspetiva sobre os factos indiciados

Há três erros que o Ministério Público assume no seu recurso, sendo que apenas um deles está relacionado com erros que foram assinalados na comunicação social.

Em primeiro lugar, e apesar de assumirem que mantêm a sua visão sobre a alegada prática de vários crimes de corrupção relacionados com Nuno Mascarenhas, os procuradores dizem que que Rui Oliveira Neves nada tem a ver com o alegado acordo entre Diogo Lacerda Machado e Nuno Mascarenhas, logo não dão como fortemente indiciado o crime de corrupção ativa imputado a Oliveira Neves.

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O segundo erro já foi noticiado pelo semanário Expresso e relaciona-se com a alegada atuação de Rui Oliveira Neves e Afonso Salema para que fosse alterada a redação da Portaria n.º 248/2022. O Ministério Público mudou de visão e diz agora que os mesmos não devem ser “considerados fortemente indiciados”.

E, finalmente, o terceiro erro prende-se com alegados contactos entre Afonso Salema e João Galamba que não terão acontecido sobre alegados favorecimentos para a Start Campus, o que fez cair um artigo do despacho de indiciação.

MP insiste na imputação de crimes de corrupção e prevaricação a autarca de Sines

Sobre o arguido Nuno Mascarenhas, os procuradores João Paulo Centeno, Hugo Neto e Ricardo Correia Lamas insistem na imputação dos crimes de corrupção passiva e prevaricação. Daí que solicitem ao Tribunal da Relação de Lisboa, tal como escrito acima, na imposição de várias medidas de coação gravosas.

O Ministério Público faz uma leitura muito diferente do juiz de instrução de instrução criminal sobre os factos. Enquanto Nuno Dias Costa diz que o presidente da Câmara de Sines não tinha competências sobre matérias do Urbanismo, logo não podia favorecer a Start Campus em termos de aprovação de licenciamento, os procuradores dizem o contrário e apontam as diligências alegadamente realizadas por Mascarenhas para “acelerar” prazos ou “conferir andamento mais célere” — o que configura, na ótica do Ministério Público, uma “violação de deveres funcionais, designadamente dos princípios da igualdade e da transparência”, lê-se no recurso.

O MP faz uma leitura muito diferente do juiz de instrução de instrução criminal sobre os factos. Enquanto Nuno Dias Costa diz que o presidente da Câmara de Sines não tinha competências sobre matérias do Urbanismo, logo não podia favorecer a Start Campus em termos de aprovação de licenciamento, os procuradores dizem o contrário e apontam as diligências alegadamente realizadas por Mascarenhas para "acelerar" prazos ou "conferir andamento mais célere".

Por exemplo, e além de insistirem que o presidente da Câmara de Sines tem competências em matérias de urbanismo que não são delegáveis (como poder de avocar processos ou decretamento do embargo das obras), o MP diz que Nuno Mascarenhas ajudou a encurtar os prazos na “aprovação do inicio do procedimento e aprovação das normas provisórias a incidir no Plano de Urbanização da Zona Industrial de Sines”.

Como? Marcando a reunião da Câmara de Sines que permitiu desencadear o procedimento de revisão do Plano de Urbanização da Zona Industrial de Sines (PUZILS) — um procedimento fundamental para que o projeto dos primeiros edifícios do data center da Start Campus fosse aprovado. E estabelecendo a ordem do dia em que tal proposta foi apresentada e votando a favor da mesma.

“Fica assim demonstrado, à saciedade, que dependia do arguido Nuno Mascarenhas conferir maior ou menor celeridade a uma matéria fundamental para a Start Campus, que consistia no desencadear do procedimento de revisão do PUZILS e do regime aplicável até à conclusão de tal procedimento”, lê-se no recurso.

Daí que, devido a estes alegados factos, o Ministério Público impute um crime de prevaricação a Nuno Mascarenhas.

Por outro lado, os procuradores insistem na imputação do crime de corrupção passiva ao autarca de Sines e dizem que o juiz de instrução criminal não teve em consideração a jurisprudência definida sobre a consumação do crime de corrupção.

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Isto, e tendo em conta os factos relacionados com um alegado favorecimento da Câmara de Sines à Start Campus no licenciamento das obras do data center, os procuradores afirmam que a “consumação do crime de corrupção não depende da efetiva realização do acto previsto”. Isto é, basta que Nuno Mascarenhas tenha alegadamente manifestado a disponibilidade para alegadamente favorecer a Start Campus a troco de alegadas contrapartidas para que o crime se tenha consumado.

Além disso, o facto de as contrapartidas terem sido para terceiros — um patrocínio de 5.000 euros para o Festival de Músicas do Mundo em Sines e um apoio de valor não apurado para as camadas jovens do Clube de Futebol Vasco da Gama — é igualmente admitido pela lei, dizem os procuradores. “Na verdade, a pessoa que recebe pode nem estar conluiada com o funcionário e actuar de boa-fé, pelo que é desnecessário aferir se essa pessoa é ou não susceptível de responsabilidade penal”, afirmam.

Para terminar, os procuradores citam ainda escutas telefónicas de Diogo Lacerda Machado com Fabíola Bordino, mulher de Afonso Salema e funcionária da Start Campus. Nessa conversa, Lacerda Machado diz a Fabíola que esteve a falar “longamente” com Nuno Mascarenhas sobre a “questão do loteamento” dos terrenos do data center da Start Campus e que o autarca lhe “prometeu que encurtaria os prazos todos a grande velocidade” e que “mandou agendar” o tema “para a reunião de Câmara próxima”. Lacerda garantiu que “conseguimos acelerar aí as coisas (…) acelerar tudo (…) E que o fará”.

Na mesma conversa, Lacerda Machado disse à mulher de Afonso Salema que Nuno Mascarenhas tinha ficado “profundamente dececionado com a míngua do patrocínio” de “5.000 euros”. Isto porque tinha pedido a outras empresas patrocínio entre os “25 mil e os 50 mil euros” e o “patrocínio mais miserável que veio foram esses 5.000 euros.”

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