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Como vão Presidente, Parlamento e o Governo gerir o chumbo inédito da proposta orçamental
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Como vão Presidente, Parlamento e o Governo gerir o chumbo inédito da proposta orçamental

ANA MARTINGO/OBSERVADOR

Como vão Presidente, Parlamento e o Governo gerir o chumbo inédito da proposta orçamental

ANA MARTINGO/OBSERVADOR

O que cai com o chumbo do Orçamento? O que pode ainda decidir o Governo? Os próximos passos até às eleições? 16 perguntas sobre o que aí vem

Cai o Orçamento e caem as alterações à lei laboral, mas o Governo ainda tem margem para aumentar salário mínimo e tomar decisões que não dependam do Parlamento. 16 perguntas sobre o que aí vem.

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O inédito chumbo da proposta de Orçamento do Estado na história da democracia portuguesa levanta dúvidas jurídicas e financeiras sobre o que pode o Governo em funções ainda fazer. António Costa já disse que não se demitia do cargo, mas com a dissolução do Parlamento pré-anunciada pelo Presidente da República, passo prévio a eleições antecipadas, sobra pouca margem para fazer aprovar medidas, sobretudo aquelas que, tal como o Orçamento ou por causa da falta dele, teriam de passar por votações em plenário.

Mas se há propostas do Orçamento que caem, como o aumento dos escalões do IRS, outras decisões anunciadas pelo Governo no contexto da negociação poderão eventualmente manter-se do ponto de vista jurídico, ainda que se possa levantar a questão da legitimidade política. Também há medidas que já foram aprovadas há anos, mas que precisam de ser renovadas anualmente e que por isso deixam de estar em vigor até ser aprovado um novo OE — entre elas as contribuições sobre a banca e energia, mas também a taxa de carbono sobre passageiros de aviões e cruzeiros ou a contribuição sobre embalagens de uso único. O que pode o Governo fazer sem Orçamento? E o que é terreno proibido do ponto de vista legal? Quais os próximos passos? São perguntas que o Executivo vai analisar nos próximos dias e para as quais o Observador procura dar resposta.

O que acontece no momento a seguir ao chumbo do OE?

A partir desse momento em que o Orçamento foi chumbado o país ficou a saber que começará o ano de 2022 em regime de duodécimos e a política continua num turbilhão, com os partidos a prepararem-se para eleições legislativas antecipadas no início do próximo ano. Haveria a possibilidade de o Governo apresentar um novo Orçamento, ou mesmo governar um ano em duodécimos (até ao próximo período orçamental, em outubro de 2022), mas o Presidente da República considera que essa não seria a solução mais estável e adequada para o país. Em 2019 — como houve eleições legislativas — o Orçamento para 2020 só foi aprovado em fevereiro desse ano, tendo o país iniciado o ano em duodécimos, não sendo uma situação propriamente rara (ao contrário do chumbo de um Orçamento do Estado, que nunca acontecera em democracia). Marcelo Rebelo de Sousa colocou o ónus do momento seguinte em si próprio quando garantiu que — em caso de chumbo do Orçamento — iria iniciar “logo, logo, logo a seguir” o processo de dissolução. A gestão da crise fica assim agora, por intervenção do próprio, nas mãos do Presidente da República.

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O que terá de fazer o Presidente para dissolver a Assembleia da República?

O Presidente da República já disse que iniciará no imediato — o que pode começar a fazer já esta quarta-feira — as diligências para a dissolução da Assembleia da República. Marcelo Rebelo de Sousa até já o começou a fazer antes do chumbo. Marcelo, como noticiou o jornal Público, pediu ao presidente da Assembleia da República que ouvisse os líderes dos grupos parlamentares sobre a data das eleições. Ainda decorria o primeiro turno de debate do OE no plenário, na terça-feira, e já Ferro Rodrigues ouvia os partidos: à saída, uns diziam que queriam eleições já; outros um pouco mais tarde.

Ferro Rodrigues (aqui com João Leão) começou a ouvir os partidos ainda o debate estava a meio

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Esta etapa que já decorreu no Parlamento não é obrigatória nos termos da Constituição, mas foi pedida pelo Presidente da República que assim já sabe mais com o que contar no momento em que receber os partidos com assento parlamentar em Belém. Marcelo explicou que ia ouvir primeiro Ferro Rodrigues e o primeiro-ministro, António Costa, e, por fim, os partidos. A Constituição define que apenas o Presidente tem o poder de dissolver a Assembleia da República, “ouvidos os partidos nela representados e o Conselho de Estado”. É isso que fará Marcelo Rebelo de Sousa: a audição aos partidos foi marcada já para este sábado (e Marcelo chamou o Livre além dos partidos com representação parlamentar); o Conselho de Estado para quarta-feira, dia 3.

Os deputados mantêm-se em funções, tendo a Comissão Permanente da Assembleia da República plenos poderes até que ocorra a primeira reunião na Assembleia da República após as próximas eleições.

Quando (e para que datas) marcará o Presidente eleições?

Após cumprir as formalidades de ouvir os partidos com assento parlamentar e o Conselho de Estado — de auscultação obrigatória, mas sem qualquer poder de codecisão ou parecer vinculativo — o Presidente fica habilitado a dissolver a Assembleia da República nos termos do artigo 172.º da Constituição. O Presidente não tem um prazo definido para o fazer. Aliás, mesmo que não seja uma obrigação constitucional, é natural que o chefe de Estado queira ouvir outros setores da sociedade (como, por exemplo, os parceiros sociais com quem até já marcou reuniões para esta sexta-feira).

Marcelo tem pressa e há, na história, exemplos que mostram que todo este processo pode ser muito rápido. O antigo Presidente da República, Jorge Sampaio, fez as audiências e decidiu avançar com a dissolução da AR em 48 horas no governo de Santana Lopes. O Presidente da República também estará com pressa, mas não tão acelerado como Sampaio em 2004. Marcelo Rebelo de Sousa pretende ouvir os partidos já sábado, 30, e convocou o Conselho de Estado para a próxima quarta-feira, 3 de novembro, para que os conselheiros se pronunciem sobre a dissolução da Assembleia da República.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, conduz um carro, durante a visita à fábrica Renault Cacia, por ocasião do 40.º aniversário, em Cacia, Aveiro, 27 de outubro de 2021. JOSÉ COELHO/LUSA

A audição do Conselho de Estado é um dos passos prévios antes da dissolução do Parlamento

JOSÉ COELHO/LUSA

Ouvidos os conselheiros e os partidos, é tempo de olhar para a Lei Eleitoral da Assembleia da República. Normalmente, o Presidente tem de convocar as eleições 60 dias antes do ato eleitoral, mas, em caso de dissolução, o prazo encurta para 55 dias. Esta é uma antecedência mínima e não máxima, podendo o chefe de Estado convocar as eleições com um intervalo maior entre a data da marcação e o dia de eleição. Se o fizesse logo na quarta-feira, 3 de novembro, as eleições nunca podiam ser antes de 28 de dezembro. Ou melhor: a 1 de janeiro de 2022, que é o domingo seguinte.

Não há nenhum impedimento constitucional em que as eleições sejam no dia de Ano Novo, ou que a campanha aconteça na quadra festiva, mas Marcelo Rebelo de Sousa já fez saber que não quer que isso aconteça. Se as eleições fossem no dia 1 ou no dia 9 de janeiro, a campanha eleitoral — que tem de ocorrer 10 dias antes — correria necessariamente em simultâneo com o período de Natal e Ano Novo. A data mais próxima — e que esteve na cabeça de Marcelo desde a semana em que foi apresentado o Orçamento — é o dia 16 de janeiro, como o Observador já tinha noticiado. Assim, a campanha oficial começava precisamente no fim da época festiva, a 5 de janeiro (um dia antes do Dia de Reis).

Marcelo só trabalha com um cenário, mas tem calendário para mais (imune à pressão de Rangel)

Os partidos ainda podem tentar demover o Presidente e sugerir outras datas, mas Marcelo Rebelo de Sousa mantém a posição de que são os partidos — que estão em processos eleitorais internos, caso de PSD, CDS e Chega — que têm de acelerar os seus processos e adaptar-se ao calendário que mais serve o interesse nacional. Marcelo é claro: o País não pode esperar. Daí que o chefe de Estado mantenha o que disse em meados de outubro: eleições em janeiro, para haver Orçamento em abril.

Como vai funciona o orçamento em duodécimos em 2022?

“Quando se diz que o Orçamento do ano anterior pode ser executado por duodécimos significa que a execução das despesas não pode exceder, em cada mês, o correspondente a um doze avos da despesa total prevista no Orçamento. A ideia é, portanto, a de dividir as verbas do orçamento anterior pelos 12 meses do ano seguinte”, explica ao Observador a especialista em finanças públicas, Maria d’Oliveira Martins.

Esta regra dos duodécimos justifica-se como tentativa de controlo de despesa e assunção de encargos, em relação ao que tiver sido objeto de consentimento expresso no ano anterior. Mas tem duas exceções, assinala a mesma especialista: 1. As despesas com prestações sociais devidas a beneficiários da segurança social. 2. E as despesas com aplicações financeiras. Significa isto que estas despesas podem exceder esse limite mensal.

Que despesas pode o Governo alterar sem passar pelo Parlamento?

Fora as alterações que são por lei da competência da Assembleia da República, o Governo pode executar o Orçamento, ao abrigo de um princípio de gestão flexível, que dá liberdade para algumas alterações orçamentais.

Maria d’Oliveira Martins adianta que o artigo 59 da Lei de Enquadramento Orçamental é que estabelece as alterações orçamentais que cabem à Assembleia da República. “Estas são as linhas vermelhas com as quais o Governo tem de se coser durante a execução orçamental do Orçamento de 2021 neste regime de duodécimos”. Entre estas linhas vermelhas destacam-se alterações que impliquem aumento de despesa total da Administração Central, alterações que impliquem aumento de despesa total de cada missão de base orgânica, alterações que impliquem aumento dos compromissos do Estado, aumento dos limites de endividamento.

O Estado pode emitir nos mercados a dívida de que necessita?

Na proposta de Orçamento do Estado para 2022 está inscrito que o Estado português terá autorização para se endividar em mais 18,3 mil milhões de euros no próximo ano, uma emissão de dívida que é gerida pela Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP) através da colocação de Obrigações do Tesouro nos mercados internacionais e de produtos de poupança junto dos aforradores portugueses.

Caso o próximo ano se inicie com  duodécimos, continua a valer a autorização que está no orçamento anterior – que tem previsto um valor que até é mais elevado: 19 mil milhões de euros. Pelo que explicou ao Observador uma fonte conhecedora destes processos, os duodécimos não se aplicam à emissão de dívida pelo Estado porque não são uma despesa (nem uma receita). Em teoria, não haveria limitações a que o IGCP pudesse emitir a dívida (até àquele montante) ao ritmo que considerasse mais adequado. Porém, na prática, caso Portugal entre em 2022 com um governo de transição, isso poderia limitar a ação do IGCP – desde logo porque no diálogo com os investidores essa indefinição poderia ser um constrangimento.

Que medidas emblemáticas desta proposta caem? Escalões de IRS, aumentos salariais?

Do lado da receita, sem novo orçamento, mantêm-se em vigor os escalões de IRS que estão a ser aplicados atualmente. Ou seja, não entram em vigor as alterações propostas pelo Ministério das Finanças e que previam a criação de mais dois escalões (um desdobramento do terceiro e do sexto). Era uma alteração que faria com que a generalidade dos contribuintes pagassem um pouco menos IRS em 2022.

De 34 cêntimos a 400 euros. Quanto é que cada contribuinte vai poupar em IRS (135 simulações)

Cai também a proposta de passar a obrigar os contribuintes do último escalão de IRS a englobar no cálculo desse imposto as mais-valias em investimentos bolsistas (detidos por menos de um ano).

Do lado da despesa, pode cair por terra o aumento salarial de 0,9% anunciado para a função pública. Ainda que esta medida possa ser aprovada por legislação autónoma que não vai ao Parlamento, implica um aumento generalizado da despesa dos organismos com salários (o impacto previsto é de 225 milhões de euros). Já o descongelamento de carreiras e progressões, medidas introduzidas este ano, prolonga-se pelo regime de duodécimos. Também deve ficar sem efeito o aumento extraordinário das pensões no valor de 10 euros e que iria custar em termos anuais 600 milhões de euros.

Isso significa que pode não haver aumento de pensões em 2022?

Como vimos, por via do aumento extraordinário sim. Mas a lei prevê um mecanismo automático de subida das pensões segundo uma fórmula que inclui o crescimento da economia e a inflação. O resultado desse cálculo dará, segundo o Governo já tinha previsto, uma atualização automática em 2022 de 0,9% para as pensões até 877,62 euros por mês, de 0,4% para as pensões acima desse valor e até 2.632,86 euros, e de 0,15% além desse montante.

A ministra do Trabalho e da Segurança Social, Ana Mendes Godinho, durante a conferência de imprensa no final da reunião do Conselho de Ministros, que decorreu no Palácio da Ajuda, em Lisboa, 01 de julho de 2021. ANTÓNIO COTRIM/LUSA

Negociação do Orçamento centrou-se nas áreas do trabalho e pensões lideradas por Ana Mendes Godinho

ANTÓNIO COTRIM/LUSA

Como explica ao Observador Maria d’Oliveira Martins, professora da Universidade Católica, a lei de enquadramento orçamental prevê que à Assembleia da República competem revisões orçamentais que envolvam “o aumento das despesas do orçamento da segurança social”, mas com uma exceção: “as despesas referentes a prestações sociais devidas aos beneficiários do sistema de segurança social“, o que inclui as pensões. Ou seja, o aumento automático das pensões não tem de passar pelos deputados. Como a lei apenas prevê a fórmula de cálculo, será, no entanto, necessária uma portaria autónoma que quantifique o valor do aumento e para que pensões ao certo, tal como aconteceu, por exemplo, em 2020.

O que acontece às propostas de alterações laborais que foram aprovadas em Conselho de Ministros?

As propostas de alteração à lei laboral — na chamada Agenda do Trabalho Digno — foram uma das armas do Governo para convencer os parceiros à esquerda. E mesmo sem o Orçamento garantido, o Governo aprovou em Conselho de Ministros medidas como o alargamento da suspensão da caducidade das convenções coletivas, a reposição das compensações por despedimento para o pré-troika (mas só para os contratos a termo) e do pagamento das horas extra (embora apenas acima das 120 horas).

Só que as iniciativas legislativas do Governo que ainda não tenham sido aprovadas na generalidade na Assembleia da República, como é o caso da Agenda, caducam caso o Parlamento seja dissolvido pelo Presidente da República, segundo explica ao Observador o constitucionalista Jorge Reis Novais. Ou seja, é como se deixassem de existir.

Há, porém, exceções. É que a Agenda pode conter alterações que são apenas da competência do Governo (nesse caso, o Executivo pode aprová-las sozinho). Mas as outras — que serão a grande maioria e as que causaram mais fricções à esquerda — têm de passar pela Assembleia. Estando esta dissolvida, e uma vez que não chegaram a ser votadas na generalidade, caem por terra. Para que possam manter-se, o novo governo ou um partido político teria de as voltar a apresentar no Parlamento na nova legislatura.

A mesma lógica aplica-se a iniciativas dos partidos que tenham entrado no Parlamento, mas ainda não foram aprovadas na generalidade. Por outro lado, aquelas propostas que passaram diretamente à especialidade sem votação na generalidade (como aconteceu com a regulação do teletrabalho) mantêm-se sem ser necessário que sejam novamente apresentadas.

O aumento do salário mínimo pode ser decidido só pelo Governo?

A atualização do salário mínimo é definida por decreto-lei do Governo, depois de consultados os parceiros sociais. O diploma remete para o Código do Trabalho cujo texto refere apenas: “É garantida aos trabalhadores uma retribuição mínima mensal, seja qual for a modalidade praticada, cujo valor é determinado anualmente por legislação específica, ouvida a Comissão Permanente de Concertação Social”. Não implicando a atualização do valor qualquer mexida na lei principal das relações laborais, os especialistas ouvidos pelo Observador consideram que não há obstáculo legal ao aumento de salário mínimo decidido ainda por este Executivo que anunciou a intenção de fixar o SMN em 705 euros a partir de janeiro.

Contribuições setoriais e taxas sobre plásticos e viagens mantêm-se?

Apesar de se repetirem todos os anos desde que foram criadas, e de funcionarem como impostos, as contribuições sobre setores são descritas como extraordinárias e temporárias e tem a receita consignada a uma política ou organismo. Por isso, são renovadas todos os anos em cada proposta orçamental. E mesmo que o Governo pedisse uma autorização legislativa para as aprovar de forma autónoma, esta cai assim que o Presidente dissolver o Parlamento, explica a professora da Universidade Católica. As contribuições extraordinárias com mais receita — as duas valem mais de 200 milhões de euros — são as da banca e da energia, mas esta modalidade tem-se propagado a vário setores, desde a indústria farmacêutica até aos fornecedores de dispositivos médicos do SNS.

Portuguese Minister for the Economy and Digital Transition Pedro Siza Vieira (R) is greeted by Portuguese Minister of Environment and Energy Transition Joao Pedro Matos Fernandes (L) after attending a Conference on "Sustainable Financing: New Developments" included in the official program of the Portuguese Presidency of the Council of the European Union in Lisbon, Portugal, 25 May 2021. ANTONIO PEDRO SANTOS/LUSA

João Matos Fernandes, o ministro que dá cara às taxas ambientais, com Siza Vieira da Economia

ANTONIO PEDRO SANTOS/LUSA

Mas há mais taxas a cair sem novo orçamento em janeiro porque foram criadas por um exercício orçamental e têm sido renovadas anualmente. Segundo Afonso Arnaldo, da Deloitte, estão nestas situação a taxa de carbono, que este ano começou a ser cobrada sobre os passageiros de aviação e cruzeiros, e a taxa de 30 cêntimos sobre as embalagens de uso único.

Quanto ao adicional criado sobre o imposto único de circulação que onera carros a gasóleo que alguns especialistas admitiam que caísse, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, veio esclarecer que esta taxa (0,7 cêntimos na gasolina e 0,35 cêntimos no gasóleo) aprovada em 2004 faz parte do imposto petrolífero. O que cai é a consignação da receita que está afeta ao financiamento do Fundo Florestal Permanente. Esta verba de30 milhões de euros por ano é usada para medidas de prevenção e combate a fogos. Mas este não é o adicional de que falam PSD e CDS quando exigem a anulação do aumento extraordinário do imposto introduzida em 2016 (e que não existe tecnicamente).

O desconto no preço dos combustíveis cai?

Tudo indica que não, a não ser que o Governo recue. O desconto de 10 cêntimos por litro e por 50 litros por semana, com reembolso via IVAucher, anunciado pelo Governo na semana passada, é para entrar em vigor já este ano, sem qualquer necessidade de rever o atual Orçamento.

O grosso do impacto previsto na queda de receita de 135 milhões de euros será sentido no próximo ano já que a medida estará em vigor até final de março, mas não será necessário inscrever essa previsão nas estimativas de receita até porque há folga, considerando que o Orçamento de 2021, que será aplicado em regime de duodécimos, previa uma perda de receita de 200 milhões de euros com o IVAucher que não será alcançada.

Desconto nos combustíveis disponível a partir de 10 de novembro

Os fundos do PRR podem ser executados?

A implementação do PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) terá um maior grau de dificuldade sem um Orçamento do Estado na plenitude, que comporte o cabimento das despesas a realizar em cada programa. No entanto, não pára. É que um orçamento em duodécimos implica que a despesa executada em 2021 pode ser igualmente realizada em 2022, pelo que já houve verbas gastas em 2021 que podem, à mesma escala, ser usadas no próximo ano. Maria d’Oliveira Martins realçou esta semana que a execução da despesa associada aos projetos do PRR “é possível” porque o espaço para gastos em vigor este ano “está empolado”. É o caso das despesas relacionadas com a pandemia que não se esperam necessárias em 2022.

Parlamento: Debate e votação na generalidade ao Orçamento do Estado para 2022, na Assembleia da República. Bloco de Esquerda e PCP votarão contra o orçamento o que provocará a queda do Governo de António Costa e eleições antecipadas. Conversa entre o ministro das finanças, João Leão, António Costa, primeiro-ministro e Duarte Cordeiro ao telefone. Lisboa, 27 de outubro de 2021. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

João Leão troca palavras com António Costa com o secretário de Estado Duarte Cordeiro, responsável pelas negociações do OE. pelo meio

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Além disso entre o lançamento dos concursos e a efetivação da despesa decorre um período de tempo que pode permitir a aprovação de novo orçamento. Certo é que em 2022 o Governo previa um investimento público acima de 30% de 2021, e esse gasto estatal pode sim ficar comprometido ou pelo menos adiado. Ainda assim o PRR tem a vantagem de não obrigar a contrapartida nacional — ao contrário dos outros programas europeus — o que, mais uma vez, facilita a sua execução com uma gestão em duodécimos.

O Governo tem assumido dificuldades de execução do PRR sem orçamento, mas, ao mesmo tempo, já admitiu poder haver soluções passíveis de serem exploradas. Ao Observador, vários economistas tinham já sustentado haver alternativas para limitar o impacto. Uma coisa é certa a não execução das verbas pode ditar a perda de financiamentos e há metas e objetivos trimestrais previstos: um total de 94. O PRR tem previsto, para 2022, a entrada de três tranches, num valor global de 5,3 mil milhões de euros.

Baixa execução de fundos europeus até 2020 eleva risco de Portugal não conseguir aproveitar os milhões do PRR

Além do PRR, no entanto, há outros fundos que continuam em vigor. É o caso do PT 2020 que já tem verbas em 2021, pelo que manter-se-á cabimento orçamental em 2022. E no caso do PT 2030 ainda há negociações com Bruxelas para o Acordo de Parceria, pelo que o impasse político poderia ditar atrasos na sua ratificação. O economista Fernando Alexandre alerta para a possibilidade de o PT2030 poder ser preparado “num contexto de incertezas”, com “menos foco”. “Um dos maiores problemas que vejo é que será feito num ambiente político em que pode haver falta de liderança nestes processos, como normalmente acontece quando os governos são demissionários”, observa.

O que acontece às injeções previstas na TAP e na CP para o próximo ano?

Seguindo a lógica da aplicação dos tetos de despesa autorizados e executados para 2021, a TAP poderá receber os quase mil milhões de euros previstos para o próximo ano, já que esse montante corresponde à verba que o Estado deve entregar à empresa este ano. Até agora, só foram entregues 462 milhões de euros porque é preciso a autorização da Comissão Europeia para cada injeção.

Queda do Orçamento deixa em dúvida cheque de 1.8 mil milhões à CP que o ministro Pedro Nuno Santos tanto defendeu

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Já o caso da CP é mais bicudo. O OE tinha finalmente inscrito uma verba de 1.800 milhões de euros para resolver o problema da dívida histórica da operadora ferroviária como exigia o ministro das Infraestruturas. A operação descrita no documento é a de um aumento de capital que não tem correspondência na dimensão com o dinheiro que chegou à CP este ano. Mas a transação está inscrita no capítulo dos ativos financeiros e o montante registado em 2021 dá margem para acomodar esta injeção, mas eventualmente à custa de outras operações.

Entre o anúncio de dissolução do Parlamento e a sua efetivação poderiam  ser aprovadas alterações ao OE de 2021, a pensar na execução em duodécimos em 2022?

Teoricamente, enquanto a Assembleia da República se mantiver em funções, pode legislar como entender, esclarece Maria d’Oliveira Martins. Pode, portanto, aprovar, se assim o entender, alterações ao Orçamento em vigor. Mas “na prática, pode ser difícil concretizar estas alterações”, destaca a professora da Universidade Católica que dá duas razões. “Porque se trata de uma corrida contra o tempo: a dissolução fará caducar todos os processos legislativos que não tenham terminado”. E “porque será difícil para o Governo reunir uma maioria parlamentar que se disponha a facilitar-lhe a tarefa de execução do Orçamento de 2021 por duodécimos”.

O Governo que sair das eleições terá condições políticas para aprovar novo um Orçamento?

Essa é a grande incógnita. Se as sondagens estiverem certas, o problema que existe atualmente vai manter-se após as eleições, sem uma maioria clara para apoiar documentos estratégicos como um Orçamento do Estado. Se houver um dos partidos (o mais próximo disso é o PS) com maioria absoluta, o Orçamento pode ser prontamente aprovado, caso contrário o impasse mantém-se. Mesmo que haja uma maioria de esquerda (com PCP, com BE ou com ambos), será sempre mais difícil para o PS voltar a confiar nos parceiros depois do chumbo desta quarta-feira.

Uma forma de contornar isso seria Marcelo Rebelo de Sousa, ao contrário do que aconteceu em 2019, exigir logo um acordo escrito (que garanta a aprovação de um ou mais orçamentos) antes de dar posse a um novo governo minoritário. Uma condição prévia, como exigiu Cavaco Silva em 2015 antes de dar posse ao Governo apoiado pela geringonça.

Além de uma maioria de esquerda, outra hipótese seria os partidos de direita e do espaço não-socialista (PSD, CDS, Chega e IL) conseguirem mandatos suficientes para ter uma maioria na Assembleia da República e acordarem uma solução que permitisse à direita substituir o PS no poder. Também aí, era necessário sempre ter uma aritmética parlamentar maioritária para que um novo Orçamento passasse na Assembleia da República. A esquerda teme que a direita esteja a ensaiar uma solução parecida com a que levou o PSD à liderança do Governo Regional dos Açores.

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