A máquina que se juntou para tentar dar a vitória a Paulo Rangel nas últimas diretas já desmobilizou – se é que alguma vez esteve verdadeiramente unida. Nos últimos dias, houve uma tentativa para consensualizar uma lista de união para o Conselho Nacional, órgão máximo do partido entre congressos, mas as negociações acabaram por falhar. O anti-rioísmo vai chegar partido à reunião magna do PSD.

Apesar de ter perdido as eleições diretas, Paulo Rangel conseguiu juntar à volta da mesma mesa apoiantes próprios, uma parte considerável do aparelho de Miguel Pinto Luz (cuja força reside sobretudo na região de Lisboa, Coimbra e uma parte do Porto) e o que restava da estrutura que apoiou Luís Montenegro nas eleições internas de 2019.

Aliás, os dois – Pinto Luz e Montenegro – abdicaram de recandidaturas que seriam naturais à luz do que aconteceu há dois anos em prol de Paulo Rangel. Existia, por isso, alguma expectativa para perceber o que fariam as tropas da oposição interna neste congresso e se se manteriam ou não unidas para começar a preparar uma alternativa conjunta para o pós-Rui Rio.

Com Paulo Rangel a autoexcluir-se do jogo e a fazer saber publicamente que não queria ter qualquer envolvimento nos bastidores, houve conversações para que se chegasse a um entendimento entre as partes e para que se promovesse uma lista conjunta entre todos (ou quase todos) os que estiveram nas eleições ao lado do eurodeputado.

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Pedro Alves e Hugo Soares, em representação de Luís Montenegro, tentaram uma aproximação a José Manuel Fernandes, eurodeputado e um dos grandes apoiantes de Paulo Rangel. O objetivo era encontrar uma solução pacificadora que passaria, por exemplo, por Miguel Poiares Maduro, uma figura mais neutra, relativamente consensual e sem anti-corpos de maior, como primeiro nome nesta lista de união ao Conselho Nacional. Mas as rivalidades e os cálculos estratégicos acabaram por levar a melhor.

Os apoiantes de Luís Montenegro, que deve ir ao Congresso discursar e previsivelmente marcar uma posição para o futuro do partido, tentaram convencer Miguel Pinto Luz, vice-presidente da Câmara de Cascais e um dos grandes aliados de Paulo Rangel, a abdicar de protagonismo na lista para permitir que o montenegrismo saísse reforçado – algo que Pinto Luz acabou por recusar.

O vice-presidente da Câmara de Cascais entende que depois de ter dado a cara pelo projeto de Paulo Rangel e de ter alargado a sua base de apoio nestas diretas tem agora uma palavra a dizer na definição da vida interna do partido e obrigação de manter mobilizados os seus apoiantes mais leais. Tanto mais que, sabe o Observador, deverá ser ele o primeiro nome da lista que vai a votos no Congresso.

A posição de Montenegro é ligeiramente diferente. O antigo líder parlamentar manteve-se neutro nestas diretas, apesar de uma parte importante da estrutura que o tinha apoiado em 2019 ter estado envolvida na candidatura de Rangel. Acontece que os resultados conseguidos por Rangel nos terrenos de Montenegro (Espinho, Braga, Famalicão ou Viseu, por exemplo) ficaram muito aquém das expectativas e do potencial prometido.

Aliás, na cabeça dos operacionais de Rangel, os apoiantes de Montenegro traíram o eurodeputado para neutralizarem o maior adversário que poderiam ter no pós-Rio. Caído Rangel, as tropas do antigo líder parlamentar estão organizadas e vão mesmo protagonizar uma lista alternativa ao Conselho Nacional — mas que não será encabeçada por Montenegro. A ideia é transmitir uma imagem de força já nesta reunião magna.

Agora, com Rangel fora de combate, começa já a jogar-se o futuro pós-Rio. O Congresso deste fim de semana servirá, também por isso, para perceber quem tem mais força neste momento: se Pinto Luz que tem vindo a amealhar apoios e que reforçou alianças nestas diretas; ou se Montenegro, que até então tem estado muito discreto. O facto de as duas fações se estarem a medir neste momento travou toda e qualquer hipótese de entendimento.

Não é de excluir, no entanto, que venham a surgir mais listas do universo de apoiantes de Paulo Rangel ou de gente próxima de Luís Montenegro. Mas o mais certo é que sejam estas duas máquinas – a de Pinto Luz com a espinha dorsal que esteve com Rangel contra o aparelho de Montenegro – as duas principais alternativas à lista que terá o carimbo de Rui Rio.

Rangel vai falar ao Congresso, mas não apoia listas ao Conselho Nacional nem vai confrontar Rio

Carlos Eduardo Reis pode integrar equipa oficial

Do lado de Rui Rio também se fazem contas: existe a consciência de que se o PSD perder as próximas eleições legislativas, o futuro não será um passeio no parque para o atual presidente do partido. Rio já deu sinais públicos e privados de que estaria disposto a continuar à frente do partido mesmo em caso de derrota e que entende ter condições para cumprir o mandato de dois anos que agora recebe.

Para isso, ainda assim, precisa de ter uma maioria confortável no Conselho Nacional do PSD. Se há coisa que ficou demonstrada neste último período foi que Rui Rio tinha perdido o controlo do órgão máximo do partido entre congressos o que fez com que tivesse sofrido duas derrotas pesadas consecutivas – primeiro, não conseguiu adiar as diretas; depois, não conseguiu fixar a data que preferia nem abrir a votação a todos os militantes.

Recentemente, a mesma maioria que tinha infligido estas duas derrotas a Rio permitiu que o líder social-democrata conseguisse aprovar uma lista de candidatos a deputados muito criticada por ter varrido do mapa grande parte dos adversários internos. Os equilíbrios internos são voláteis e os homens de Rio sabem o quão importante é evitar que existam mais surpresas no futuro.

De resto, no passado recente do PSD, o Conselho Nacional já foi instrumental para proteger Rui Rio e travar as intenções de Luís Montenegro. Em 2019, os apoiantes eleitos pela lista de Carlos Eduardo Reis foram instrumentais para travar a tentativa de impeachment de Rui Rio. Daí para cá, o homem de Barcelos tornou-se uma figura ainda mais relevante nos equilíbrios internos no PSD.

Nas últimas diretas, a influência de Carlos Eduardo Reis, já envolvido diretamente na campanha de Rui Rio, permitiu ao líder social-democrata derrotar Paulo Rangel por quase 300 votos de diferença, o que ajudou a garantir a vitória de Rio e a consolidar ainda mais a imagem política do barcelense.

Resta saber o que fará agora com um capital político reforçado. Por norma, Carlos Eduardo Reis tem protagonizado listas alternativas às duas oficiais – a da direção e a do candidato derrotado – e com isso tem criado uma rede de apoios importantes por todo o país.

Desta vez, no entanto, depois de ter assumido um papel tão determinante na reeleição de Rio, Carlos Eduardo Reis pode estar tentando em integrar a lista patrocinada pela direção do partido e abdicar de uma equipa própria.

Os homens de Rio vão fazendo contas e acreditam que pode ser mais vantajoso para o futuro incentivar alguma proliferação de listas tendencialmente afetas à direção para garantir que existem mais condições de se chegar a uma maioria no Conselho Nacional.

Nesse cenário, empurrar Carlos Eduardo Reis para uma lista autónoma pode dar uma margem mais confortável à direção de Rio no futuro — em cada reunião daquele órgão do partido seriam os seus homens mais os de Carlos Eduardo Reis.

Só que, ao contrário do que aconteceu no passado, a equação desta vez não é assim tão simples. A afinidade de Carlos Eduardo Reis com Rui Rio é agora uma evidência, muitos dos seus apoiantes foram integrados nas listas de candidatos a deputados e criar uma lista alternativa à da direção nacional pode ser um esforço contra-natura.

Além disso, corre nos bastidores do partido a expectativa de que Carlos Eduardo Reis possa vir a integrar de facto a direção de Rui Rio, o que tornaria a criação de uma lista concorrencial ainda mais desprovida de senso. Os próximos dias serão decisivos para fechar essa e outras questões.