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António Costa fala com Kyriakos Mitsotakis, o primeiro-minsitro grego, durante o Conselho Europeu.
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António Costa fala com Kyriakos Mitsotakis, o primeiro-minsitro grego, durante o Conselho Europeu.

POOL/AFP via Getty Images

António Costa fala com Kyriakos Mitsotakis, o primeiro-minsitro grego, durante o Conselho Europeu.

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Os apoios europeus a Portugal são uma pipa de massa, mas nada bate a tragédia grega

Portugal recebe menos dinheiro do que a Grécia porque teve menos desemprego nos últimos anos e porque regiões não são tão pobres. Fundo de Recuperação permite melhorar comparação com apoios anteriores

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Na próxima década, entre o dinheiro “fresco” que chega da União Europeia (a fundo perdido e, potencialmente, por empréstimo) e o que ainda há para gastar dos apoios anteriores, Portugal tem uma “bazuca” de 73,6 mil milhões de euros para atirar à economia portuguesa — de dimensão comparável ao resgate financeiro da Troika, entre 2011 e 2014, em que Comissão Europeia, FMI e Banco Central Europeu emprestaram 78 mil milhões.

Dessa “bazuca”, no entanto, fazem parte 15,7 mil milhões de euros em empréstimos para fazer face às consequências da pandemia — se Portugal quiser ativar este mecanismo (o que ainda não é certo); e os 12,8 mil milhões de euros que sobraram do Portugal 2020 — que o Governo terá ainda de executar até 2023.

Sobram, por isso, 45,1 mil milhões de euros de novos apoios a fundo perdido. Por via do Quadro Financeiro Plurianual (a próxima vaga dos habituais fundos comunitários), Portugal vai receber 29,8 mil milhões de euros, e do Plano de Recuperação Europeu outros 15,3 mil milhões de euros. É, para todos os efeitos, uma soma avultada, mas será que resiste à comparação com a “concorrência” direta na UE?

Fundo de Recuperação. Afinal, Portugal vai ter mais dinheiro emprestado do que a fundo perdido

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Envelopes financeiros que (quase) são do mesmo campeonato

Para perceber o que representa o envelope português face a economias com o mesmo nível de rendimento per capita, o Observador analisou os casos de República Checa e Grécia, que, no ano passado, estavam no encalce da economia portuguesa na tabela de riqueza europeia — e que têm também populações comparáveis, ambos na casa dos 10 milhões de habitantes. Resultado? Envelopes financeiros que refletem realidades distintas.

A Grécia terá direito a 38 mil milhões de euros a fundo perdido dos habituais fundos comunitários — mais cerca de 8 mil milhões do que o envelope português —, e outros 19 mil milhões de euros por via dos novos apoios às economias europeias (mais 4 mil milhões do que o valor a que Portugal tem direito)de acordo com o think thank grego Macropolis, que cita os números fornecidos pelo primeiro-ministro Kyriakos Mitsotakis.

Deste montante, 70%, ou 13,3 mil milhões de euros, estarão disponíveis nos próximos dois anos e o dinheiro restante em 2023. No total, o cheque europeu para a Grécia a fundo perdido vale cerca de 12 mil milhões de euros a mais do que o português.

A estes valores juntam-se ainda os empréstimos disponíveis, de 12 mil milhões de euros — menos cerca de 4 mil milhões do que as possibilidades para Portugal. Entre subvenções e empréstimos, a Grécia pode vir a gastar mais de 70 mil milhões de euros, o equivalente a mais de um terço do PIB grego —  “um valor sem precedentes”, de acordo com Kyriakos Mitsotakis, para quem “este é um dia histórico para a Europa e uma ótima oportunidade para a Grécia”.

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Depois de ter recebido um total de 289 mil milhões de euros em empréstimos durante o resgate (em três fases), a Grécia estava a crescer há três anos consecutivos (1,5% em 2017, e 1,9% tanto em 2018 como em 2019) e mantinha um saldo positivo nas contas públicas ainda há mais tempo, desde 2016, quando obteve um excedente de 0,5% — seguiram-se saldos de 0,7% em 2017, 1,0% em 2018 e 1,5% em 2019.

A pandemia trouxe, no entanto, a economia grega à “estaca zero”. A Comissão Europeia espera uma recessão de 9% este ano — apesar de tudo, um pouco menos grave do que para Portugal (-9,8%) — e uma recuperação igual à portuguesa em 2021, de 6%.

Já em termos de saúde pública, a situação é incomparável, tendo em conta os números reportados pelas autoridades gregas. No total, 200 mortes e 4.077 casos de infeção desde que teve início a pandemia, em linha com alguns dos países vizinhos nos Balcãs — e muito abaixo das 1.705 mortes e 49.379 casos registados até ao momento em Portugal.

A proposta grega de plano de recuperação — que todos os estados-membros têm de entregar à Comissão Europeia em outubro — vai basear-se nas recomendações de um “conselho de sábios” liderado por Christopher Pissarides, Nobel da Economia britânico-cipriota.

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No caso da República Checa, estão em causa 27 mil milhões de euros em subvenções relativas aos fundos comunitários tradicionais (cerca de 3 mil milhões de euros a menos do que o valor recebido por Portugal) e 8,7 mil milhões de euros por via do Fundo de Recuperação económica (quase metade do dinheiro que calha ao estado português). No total, o primeiro-ministro checo, Andrej Babiš, levou do Conselho Europeu um cheque a fundo perdido de 35,7 mil milhões de euros (menos 10 mil milhões do que António Costa).

Face ao anterior período de dinheiros europeus, a República Checa tem direito a um acréscimo de quatro mil milhões de euros a fundo perdido (já contando com os 8,7 mil milhões de euros do Fundo de Recuperação).

A estes valores, junta-se ainda o empréstimo de 15,4 mil milhões de euros, muito semelhante à verba que fica disponível para o governo português. Entre empréstimos e subvenções, o envelope financeiro da República Checa ascende a 51,1 mil milhões de euros.

Nos últimos anos, a República Checa, que não faz parte da zona Euro, tem crescido a ritmos sempre superiores a 2% (2,5% em 2016, 4,4% em 2o17, 2,8% em 2o18 e 2,6% em 2019). E, apesar do tombo previsto para este ano, a economia terá sofrido um impacto menos severo do que Portugal ou Grécia, com a Comissão a prever uma recessão de 7,8% este ano. Para 2021, a recuperação já se espera menos intensa do que nos dois países do Sul da Europa, atingindo um crescimento de 4,5%.

Tal como a Grécia, os números da pandemia na República Checa são muito mais baixos do que em Portugal, tendo morrido 364 pessoas desde que o novo coronavírus fez a primeira vítima, num total de 14.570 casos de infeção.

Andrej Babis, o primeiro-ministro checo (de casaco) esteve reunido com os restantes líderes de Visegrado (Eslováquia, Hungria e Polónia) e o presidente do Conselho durante a "maratona" de Bruxelas.

POOL/AFP via Getty Images

Nenhum destes envelopes financeiros de Portugal, Grécia ou República Checa se aproximam, no entanto, do dinheiro que é canalizado para Itália e Espanha, dois dos maiores países entre os 27 e aqueles que foram mais afetados pela pandemia.

Apenas contando com o Fundo de Recuperação, Itália deverá receber, segundo as contas do primeiro-ministro Giuseppe Conte, 81 mil milhões de euros em subvenções, quase 21% de todo o dinheiro distribuído a fundo perdido neste novo apoio à retoma. Não estão aqui contabilizados os fundos comunitários tradicionais, de que vão beneficiar em grande medida as regiões mais pobres do sul de Itália.

Juntando os 127 mil milhões de euros em empréstimos que ficam também disponíveis para Roma, o envelope financeiro do Fundo de Recuperação para Itália ascende a 209 mil milhões de euros — 28% dos 750 mil milhões de euros disponíveis para todos os estados-membros.

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Logo de seguida, Espanha receberá 72 mil milhões de euros em subvenções no âmbito do Fundo de Recuperação — 18,5% do total —, de acordo com o primeiro-ministro Pedro Sanchez, que ainda conta com 68 mil milhões de euros em empréstimos. O pacote global de ajudas ascende, por isso, a 140 mil milhões de euros, sem contar também aqui com os habituais fundos comunitários.

Em apenas dois países — Itália e Espanha — são absorvidos cerca de 4 em cada 10 euros de dinheiro a fundo perdido das verbas decididas em Bruxelas para o novo Fundo de Recuperação — e mais de 5 em cada 10 euros dos empréstimos que ficam disponíveis para mitigar os efeitos da pandemia. O restante dinheiro será distribuído pelos restantes 25 países.

Critério do baixo desemprego “trama” Portugal na comparação com a Grécia

No Fundo de Recuperação, a contribuição máxima prevista para cada estado-membro depende da população, do PIB per capita e da taxa de desemprego — a média dos últimos cinco anos, até 2019, comparando com a média europeia. Ou seja, um país que tenha muita população, menos riqueza por habitante e muito desemprego receberá muito mais do que um pequeno país rico sem grandes problemas no mercado de trabalho.

A proposta das instituições europeias também prevê, no entanto, que haja mecanismos para evitar “excessiva concentração de recursos”, impondo limites ao peso que os indicadores do crescimento e do desemprego podem ter na conta final.

Foi esta a proposta, da Comissão Europeia, que o Conselho aceitou — mas apenas para 2021-2022, porque para 2023 entram em jogo outros critérios. Os líderes europeus decidiram que no terceiro ano do Fundo de Recuperação, o critério do desemprego dos últimos cinco anos (entre 2015 e 2019) seja “substituído, em iguais proporções, pela perda de PIB real em 2020 e pela perda acumulada de PIB real em 2020-2021”. Estas contas serão feitas em junho de 2022, já tendo então uma noção mais clara dos estragos que a pandemia fez às economias europeias este ano e no próximo.

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Tendo em consideração que as populações de Portugal (10,3 milhões), República Checa (10,7 milhões) e Grécia (10,7 milhões) eram muito similares no início do ano, segundo o Eurostat, não terá sido este o elemento que pesou na diferença de dinheiro a receber pelo Fundo de Recuperação. E mesmo no PIB per capita, Portugal (18.540 euros por habitante), República Checa (18.330 euros) e Grécia (18.150 euros) estavam taco a taco em 2019.

O fator que fará a diferença para 2021 e 2022 tem que ver com o desemprego nos últimos cinco anos. Enquanto na República Checa a taxa de desemprego anual nunca chegou a atingir os 6%, segundo os dados do Eurostat, ficando mesmo na casa dos 2% durante os últimos três anos (5,1% em 2015, 4% em 2016, 2,9% em 2017, 2,2% em 2018 e 2% em 2019), em Portugal os números foram piores, apesar de ter havido uma queda de 12,6% em 2015 para 6,5% nesse período (tendo, pelo meio, taxas de 11,2% em 2016, 9,0% em 2017 e 7,1% em 2018).

Já o caso da Grécia é substancialmente mais grave — apesar das melhorias progressivas nos últimos cinco anos — sendo, por isso, favorecida por este critério. O melhor resultado da Grécia no desemprego nos últimos cinco anos foi alcançado em 2019, com 17,3%. Antes disso, teve um desemprego anual de 24,9% em 2015, 23,6% em 2016, 21,5% em 2017 e 19,3% em 2018.

Para 2023, o critério do desemprego já será substituído pela quebra do PIB real este ano e pela quebra conjunta de 2020 e 2021. Portugal terá aqui sido ligeiramente beneficiado pelo critério, a acreditar nas previsões da Comissão Europeia. Com uma recessão prevista de 9,8% este ano e uma recuperação de 6% no próximo, a situação da economia portuguesa deverá ser ligeiramente mais grave do que na Grécia (-9% em 2020 e +6% em 2021) e do que na República Checa (recessão de 7,8% seguida de crescimento de 4,5%).

Maioria das regiões portuguesas é pobre, mas na Grécia só escapa Atenas

Os habituais fundos comunitários procuram alavancar sobretudo as regiões mais pobres da Europa (na divisão administrativa NUTS II) e boa parte do dinheiro (202 mil milhões de euros) — que fica enquadrado no Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), no novo Fundo Social Europeu (FSE+) e no Fundo de Coesão —, vai para as regiões que tenham o PIB per capita abaixo de 75% da média europeia (tendo em conta os dados em paridade de poder de compra (PPS) entre 2015 e 2017).

Deverão caber nesta lista 12 das 13 regiões gregas, tendo em conta os números do Eurostat, o que justificará a maior verba de fundos comunitários, por comparação com Portugal ou República Checa.

Só escapa a região de Atiki, de que Atenas é capital (com 94% do PIB per capita europeu em 2015 e 92% nos dois anos seguintes). Entre as restantes, 11 tinham um PIB per capita mais baixo do que a região mais empobrecida de Portugal — o Norte, que variou entre 64% e 65% neste período.

A realidade regional grega já estava longe de ser satisfatória antes da chegada da Troika, mas agravar-se-ia substancialmente com a quase falência do país e posterior resgate financeiro em três partes. A quebra do PIB per capita na comparação com a média europeia foi de pelo menos cinco pontos percentuais em 10 regiões entre 2011 e 2017. Uma delas, Macedónia Oriental-Trácia, entrou mesmo no lote de 10 regiões mais pobres da Europa, depois de uma quebra de oito pontos percentuais — que nem foi a maior — para 46% da média europeia.

Região grega da Macedónia Oriental-Trácia - habitual corredor de migrantes - é uma das 10 regiões mais pobres da Europa.

GEORGI LICOVSKI/EPA

No caso de Portugal, quatro das sete regiões portuguesas estão claramente nesta lista das regiões mais pobres, embora com dimensões diferentes: além do Norte, o Centro (entre 66% e 67%) e os Açores (entre 68% e 69%) estão na cauda do desenvolvimento no país, enquanto que o Alentejo (72% nos três anos) se aproxima já do patamar seguinte.

A Madeira (que teve 73% em 2015, 75% em 2016 e 76% em 2017) está a conseguir sair da zona de menor desenvolvimento, o Algarve já ultrapassou atingiu os 84% em 2017 e Lisboa caiu de 102% em 2015 para a média europeia (100%) em 2017.

No caso checo, metade das oito regiões são empobrecidas, mas três delas com PIB per capita muito próximo de deixarem de o ser, na casa dos 70%. A região de Praga é um meteorito face ao resto do país, ficando mesmo no top 10 das regiões mais ricas da Europa, com mais de 180% da média europeia ao longo desses três anos (em 2018, continuaria a subir até aos 191%).

O restante dinheiro europeu será distribuído pelas chamadas regiões de transição, que tenham entre 75% e 100% do PIB per capita europeu (num total de 47 mil milhões de euros), pelas regiões ricas, acima de 100% da média europeia (27,2 mil milhões de euros), pelos países que são apoiados pelo Fundo de Coesão (42,5 mil milhões de euros) e por outros programas europeus.

Sem Fundo de Recuperação, Portugal receberia menos dinheiro a fundo perdido

Independentemente da comparação com outros países, Portugal recebe de Bruxelas um envelope financeiro mais chorudo do que no anterior quadro comunitário. Só que não pela via habitual.

Nos fundos de coesão tradicionais, há um ligeiro acréscimo (mais 100 milhões de euros) face ao período 2014-2020, totalizando 22,9 mil milhões de euros, mas a situação não é a mesma na Política Agrícola Comum, em que há menos 800 milhões do que no período 2014-2020 (Portugal recebe no total 8,7 mil milhões de euros).

Ou seja, se estivessem em causa apenas os fundos comunitários habituais, Portugal voltaria a receber menos dinheiro a fundo perdido do que no quadro comunitário anterior — depois de já ter recebido menos 3,6 mil milhões de euros no atual quadro de apoios face a 2007-2013.

Marcelo diz que 45 mil milhões de euros do plano de retoma europeu para Portugal são “excelente resultado”

Só que, com a chegada da pandemia e o impacto brutal que teve nas economias dos estados-membros, os líderes europeus avançaram (a muito custo) para um Plano de Recuperação Europeu que dará a Portugal mais 15,3 mil milhões de euros a fundo perdido, até 2023. E é esta verba que vai permitir arrecadar bastante mais dinheiro do que no anterior período de verbas comunitárias.

Se o pacote de fundos europeus for visto em conjunto, como fizeram o Conselho e a Comissão Europeia, os 45,1 mil milhões de euros representam uma subida de 38% face aos 32,7 mil milhões de euros de 2014-2020.

Para que se compreenda se Portugal recebe mais ou menos do que no anterior período de apoios comunitários, há, no entanto, uma nota técnica — que não é de somenos — que merece ser referida. É que todos estes valores indicados pelo Governo, tal como as verbas globais apontadas pelas instituições europeias, são a preços constantes, de 2018 — é o valor real, que permite uma comparação mais adequada com o período anterior, sem a interferência da inflação.

Na prática, Portugal receberá um pouco mais do que esses valores em termos nominais, porque o Conselho Europeu previu “ajustamentos técnicos automáticos” para a evolução dos preços: os 29 mil milhões de euros previstos no próximo orçamento europeu terão, na verdade, um acréscimo de 4,5 mil milhões de euros até 2027; e os 15,3 mil milhões de euros do Fundo de Recuperação terão um aumento de 600 milhões até 2023. Isto porque o chamado deflator do PIB — que mede a evolução média de preços numa economia — foi fixado pelo Conselho Europeu em 2% por ano, de acordo com o texto final do acordo assinado em Bruxelas.

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