VENCEDORES
LUÍS MONTENEGRO
É, inevitavelmente, o grande vencedor da noite. A festa era dele e Luís Montenegro esteve à altura das circunstâncias. Se há um mês alguém apostasse que Luís Montenegro aguentaria a liderança do PSD e estaria na iminência de se tornar primeiro-ministro (ou, pelo menos, de disputar eleições legislativas em condições reais de as vencer) estaria a arriscar. Mas a queda súbita e surpreendente de António Costa mudou tudo. Chegado a Almada, Montenegro conseguiu a proeza e reunir notáveis do partido, de várias sensibilidades políticas, convencer Manuela Ferreira Leite e (sobretudo) Aníbal Cavaco Silva a emprestarem-lhe credibilidade, animou as bases do partido, que se iam queixando de alguma apatia, com um discurso inflamado anti-Pedro Nuno Santos, e falar para o país, com um discurso mais programático, com algumas linhas orientadoras do que será o programa eleitoral do PSD. Acabou a assumir que sabe que “as pessoas esperam mais” dele do que aquilo que foi “capaz de mostrar até agora”, o que lhe valeu um sentido aplauso. Despediu-se dos congressistas sabendo, melhor do que ninguém, que está mesmo obrigado a ganhar as próximas eleições legislativas e que não existem mais vidas para gastar.
CARLOS MOEDAS
A forma como foi aplaudido do início ao fim por todos os presentes no Congresso do PSD demonstra bem o peso político que Carlos Moedas ganhou, por mérito próprio, depois da conquista da Câmara Municipal de Lisboa. É, sem espaço para discussões, o maior ativo político do partido neste momento e fez valer essas credenciais com um discurso muito ideológico e em nome de todos aqueles que não se conformam. Moedas tem um valor facial ainda mais elevado porque virou uma espécie de talismã para Montenegro: também ele era maltratado pelas sondagens e também dele se dizia que nunca chegaria lá. De cada vez que Luís Montenegro e demais dirigentes sociais-democratas são confrontados com as fracas sondagens e de como estas se enganaram redondamente, lá vem a referência a Moedas. De cada vez que Luís Montenegro e demais dirigentes sociais-democratas são confrontados com as dificuldades em vencer sem uma grande coligação à direita, lá vem a referência a Moedas e a como a Iniciativa Liberal também descartou o PSD em Lisboa. Num momento de alguma desesperança que se instalou no partido, o exemplo acabado de que o partido deve acreditar até ao fim. Resta saber se será possível repetir Moedas.
NUNO MORAIS SARMENTO
O regresso do antigo ministro Nuno Morais Sarmento — depois de anos afastado da vida pública por doença — prometia ser um momento emotivo do Congresso. E as expectativas não saíram defraudadas. Não só demonstrou estar em “grande forma”, como sintetizaria Montenegro, como foi incisivo naquilo que era estratégia do partido: o ataque ao PS, em particular aos socialistas pró-geringonça. A cereja no topo do bolo teve a forma de uma pequena peça metálica, quando Morais Sarmento deu ao presidente do PSD o pin que Sá Carneiro utilizou na campanha com que venceu as eleições em 1979 com a AD. E ainda deixou um conselho para que o espaço não-socialista até ao início da campanha. Ainda há tempo, acredita. Foi ouvido, aplaudido, acarinhado e mostrou que é bastante útil para o partido.
PEDRO NUNO SANTOS
Se o Congresso correu bem a Luís Montenegro, era lógico que Pedro Nuno Santos fosse um dos derrotados. O candidato à liderança do PS acaba, no entanto, por ser um vencedor acidental: no PSD todos lhe dão uma espécie de vitória antecipada contra José Luís Carneiro. É como se o outro candidato não contasse. Isso é uma vitória para o antigo ministro das Infraestrururas: até os adversários dão como certo que irá vencer a primeira batalha, as internas do PS. Outro ganho de Pedro Nuno Santos é que Luís Montenegro garante que não governa se ficar em segundo lugar nas eleições. Ora, isto significa que o candidato do PS só precisa de ter mais uma décima que o PSD para conseguir governar. É vencedor acidental, mas, ainda assim, vencedor.
VENCIDOS
PEDRO PASSOS COELHO
Num congresso carregado de notáveis, foi o grande ausente da festa de Luís Montenegro. Não é segredo para ninguém que existiu um afastamento progressivo entre a atual direção do PSD, que é composta por muitas figuras que se afirmaram politicamente no passismo, e Pedro Passos Coelho — o que explica que as referências ao antigo primeiro-ministro, antes frequentes, tenham sido raras e vagas nesta reunião magna. A própria relação entre Montenegro e Passos — que chegou a aparecer na Festa do Pontal para a apadrinhar o novo líder do partido — esfriou bastante, para dizer o mínimo. Passos não entende e não compreende algumas decisões tomadas pelo atual líder social-democrata — o posicionamento em relação à despenalização da eutanásia ou cordão sanitário face ao Chega — e Montenegro sentiu necessidade de se emancipar politicamente do criador, sem ignorar que muitos no partido esperavam que caísse no pós-europeias para voltar para os braços de Pedro Passos Coelho. O facto de as eleições terem sido antecipadas mudou todos os cálculos que se iam fazendo e acabaram com qualquer especulação nesse sentido. Ainda assim, a prova dos nove será a 10 de março: só uma vitória permitirá a Montenegro dizer que tinha razão em trilhar um caminho diferente do que aquele que Passos tinha imaginado para o seu herdeiro.
RUI ROCHA
A “arrogância” de Rui Rocha na forma como afastou coligações pré-eleitorais foi notada por Miguel Pinto Luz e secundada por outros vice-presidentes. Luís Montenegro até poupou os liberais no discurso, mas os vice-presidentes saíram em defesa do PSD em modo rottweiler, apontando o dedo à IL. Três vice-presidentes e o secretário-geral disseram aos microfones da Rádio Observador que a Iniciativa Liberal é que se pôs de fora. E foram mais longe: lembraram o fracasso da IL em Lisboa, quando podiam neste momento ter vereadores na coligação Novos Tempos, e também que contribuíram para o chumbo do orçamento nos Açores (que retira a direita do poder). Rui Rocha, se estava a ouvir, ficou com as orelhas quentes. Ainda assim, nem tudo está perdido: o PSD continua a contar com a IL para o day after das eleições.
RIOÍSMO
O riosímo nasceu, em grande medida, para cortar com o legado de Pedro Passos Coelho e afastar o partido daquilo que se dizia ser uma deriva do partido para direita. Apesar de não ter sido validado pelas eleições nacionais — perdeu umas europeias e duas legislativas —, a verdade é que Rui Rio foi legitimado em eleições internas por três vezes, uma delas contra o próprio Luís Montenegro. Parte deste movimento esperava agora que o atual presidente do PSD se estatelasse nas europeias para reagrupar em torno de outro candidato — até de Passos, se fosse preciso. Não aconteceu e agora é tempo de recolher. Com uma agravante: ganhe ou não as eleições legislativas, as próximas listas de deputados serão desenhadas pela presente direção e é provável que o que ainda resta do rioísmo seja varrido do mapa. Salvador Malheiro, kingmaker e vice-presidente de Rio, personificou esse encolher de ombros com um apelo à unidade do partido e um discurso que passou largamente despercebido à maioria dos congressistas. “Não vale a pena olhar para trás, para as pequenas divergências, porque aquilo que temos pela frente obriga a que todos nós sejamos convocados”, despediu-se.
A SURPRESA
CAVACO SILVA
É muito raro um Congresso de um partido gritar um nome que não seja o do líder, mas todos os delegados, de pé, gritaram a plenos pulmões: “Cavaco, Cavaco, Cavaco”. O antigo primeiro-ministro apareceu de surpresa na reunião magna do PSD e foi aplaudido de forma apoteótica. Subiu ao palco e depois sentou-se para ouvir Luís Montenegro dizer que é ele o exemplo de governação que quer seguir. Cavaco Silva tem um partido que respeita o legado dele. Além disso, precisou de menos de uma hora para conseguir marcar o dia e todo o Congresso. Era talvez a única figura do PSD que o conseguiria fazer. Saiu depois a dizer que tinha “a mulher à espera para jantar”, o que pode fazer com o sentimento de missão cumprida. Já tinha ajudado Montenegro e provado que tem uma popularidade inabalável no partido.