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Pedro Moreira transitou do Museu do Tesouro Real para a presidência do conselho de administração da EGEAC em agosto de 2022.
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Pedro Moreira transitou do Museu do Tesouro Real para a presidência do conselho de administração da EGEAC em agosto de 2022.

FRANCISCO ROMÃO PEREIRA/OBSERVADOR

Pedro Moreira transitou do Museu do Tesouro Real para a presidência do conselho de administração da EGEAC em agosto de 2022.

FRANCISCO ROMÃO PEREIRA/OBSERVADOR

Pedro Moreira, presidente da EGEAC: “Não sei até que ponto poderíamos viver sem turistas"

O presidente do conselho de administração da EGEAC fala da importância do mecenato, das novidades no Capitólio e dos "riscos" no investimento do espaço que vai acolher a biblioteca de Manguel.

“Lisboa, apesar de tudo, ainda não vive isso [excesso de turistas] com grande abundância”, considera Pedro Moreira. O gestor cultural, que em tempos afirmou que os “os turistas são o nosso petróleo e nunca serão de mais”, reforça hoje a importância deste setor: “Não sei até que ponto poderíamos viver sem turistas”.

Moreira, 53 anos, é desde agosto presidente da empresa municipal responsável pela gestão dos 18 equipamentos e animação cultural que compõem a EGEAC. Até então era diretor-executivo do Museu do Tesouro Real, dedicado às joias da coroa portuguesa. Passou também pelo Turismo de Lisboa, onde foi responsável pelo marketing e atrações turísticas, e, antes disso, esteve cerca de treze anos na EGEAC enquanto Diretor de Desenvolvimento e Gestão Cultural. Trabalhou também na Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses. No perfil do Linkedin descreve-se como “orientado a resultados”.

Na sua primeira entrevista desde que assumiu funções enquanto presidente do conselho de administração da EGEAC, o gestor cultural, uma escolha do vereador da Cultura, Diogo Moura (CDS-PP), fala de uma política de rentabilização de recursos na empresa; avança novidades quanto à gestão do Capitólio; e admite “riscos” no investimento no Espaço Atlântida, que vai receber a biblioteca de Alberto Manguel e cujo valor da coleção a própria EGEAC desconhece.

Está desde agosto em funções. Que balanço faz destes 10 meses?
Penso que ainda é curto para fazermos um balanço. Decorre um princípio positivo de valorização do capital humano da empresa. Foi isso que procurámos num primeiro momento e nessa sequência procurámos também criar dinâmicas. O teletrabalho ajuda, mas no início de um exercício dificulta porque há a necessidade de um contacto diário para relembrar o que ao longo de 14 anos, o tempo que estive na EGEAC, concretizámos em conjunto. Conseguimos retomar relações mais próximas entre a sede e todos os seus equipamentos culturais.

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Por outro lado, começámos logo a ver o que era a realidade em termos orçamentais, dado que a empresa nestes últimos seis anos cresceu muito, não só em recursos físicos, através de equipamentos, mas também em recursos humanos. Tivemos de fazer essa análise para verificar onde é que poderíamos melhorar e acrescentar algo de diferente.

A EGEAC firmou recentemente um acordo com a Super Bock até 2025. Além do regresso como patrocinador principal das Festas de Lisboa, o comunicado menciona também o Cinema São Jorge e o São Luiz Teatro Municipal, mas não ficou explícito em que consiste o mecenato da marca a estas duas salas de espetáculos. Quais são as contrapartidas?
São situações de relacionamento novas. Sabemos que nem sempre as empresas nacionais encaram muito bem uma relação mecenática e aquilo que procurámos com a administração da Super Bock Group foi fortalecer este relacionamento que não só estivesse vocacionado para a componente patrocínio. Tentamos lançar esse desafio para que alargassem esse relação à componente mecenática. Conseguimos. É uma espécie de um estudo.

Decorrente disso mesmo não existem contrapartidas propriamente ditas. Existe é um estreitar de relação e de associação aos espaços em que eles nos vão ajudar a construir programação. Vão estar connosco em determinados momentos. Correndo bem já temos outros parceiros que sabendo já nos questionaram. Quando temos um grupo empresarial tão importante como mecenas também permite que ele não só conheça melhor o próprio espaço como ajude a revitalizá-lo. Temos constrangimentos orçamentais que não nos permitem muitas vezes realizar determinadas intervenções.

A marca de cerveja deu nome a uma sala de espetáculos emblemática da cidade do Porto, o Super Bock Arena, antigo Pavilhão Rosa Mota. Está em risco uma sala municipal lisboeta com um naming comercial?
Não, isso não haverá, obviamente. Os nossos parceiros conhecem e sabem que a nossa realidade é totalmente distinta. Pelo menos até ao mandato que me foi conferido. Dar naming não está em causa nem estará. Até porque a própria marca de que dispomos dos nossos equipamentos é demasiado forte e é de todos os munícipes, nunca iremos concretizar nada assim. Aqui o que queremos é que o tecido empresarial português se possa associar com uma perspetiva mais de mecenas e não só de patrocinador puro e duro. Sei que lhes interessa a questão da imagem, e de naming, mas aqui estamos a tentar fazer uma experiência distinta.

Falou em recuperar espaços, realizar intervenções. Há alguma que possa avançar?
Já temos algumas que estão a avançar, mas ainda não gostaria de avançar muito.

É uma tentativa de colmatar constrangimentos financeiros sentidos na EGEAC?
Sim, porque o que sentimos cada vez mais é que as empresas que ficam muito presas aos orçamentos públicos têm uma maior dificuldade de reagir a determinadas necessidades, muitas delas imprevistas. Podemos pensar que um equipamento até está em condições e de repente toda a canalização rebentar, ou cadeiras que necessitam de ser substituídas, ou equipamentos que dado o seu período de vigência ficam avariados. [A ideia é] associar o público ao privado para construir algo que seja para todos. O privado por vezes tem uma flexibilidade maior que o público não tem.

Da esquerda para a direita: o vereador da Cultura da CML, Diogo Moura, o presidente da CML, Carlos Moedas, e Pedro Moreira, na apresentação das Festas de Lisboa.

FRANCISCO ROMÃO PEREIRA/OBSERVADOR

Em 2016, numa entrevista ao Diário de Notícias, então diretor de marketing e visitor attractions na Associação de Turismo de Lisboa, disse: “os turistas são o nosso petróleo e nunca serão de mais”. Ainda acha que Lisboa não tem turistas a mais?
Penso muitas vezes que essa afirmação que fiz tem uma interpretação não tão correta como a que deveria ter. Obviamente que as coisas são datadas do seu tempo. Como se costuma dizer, o passado já passou, o futuro ainda não se vê.

O que pensa no presente?
Um facto é concreto: o crescimento em Portugal nos últimos tempos e até mesmo após a pandemia decorre muito do crescimento do turismo. Obviamente que sabemos que um excesso de alguns visitantes, quer nacionais quer internacionais, a determinadas zonas do mundo, começa a provocar alguns problemas e constrangimentos. Lisboa, apesar de tudo, ainda não vive isso com grande abundância. Acho que, apesar de tudo, são bem-vindos os turistas. Não só por aquilo que geram. Não sei até que ponto poderíamos viver sem turistas.

Não sei se as pessoas se recordam aqui há uns anos, mas a partir das oito da noite, quando fechavam todas as lojas, isto [baixa lisboeta] pura e simplesmente não tinha vida. Hoje podemos sair à noite. Seguramente que há outros detalhes que poderão não ser tão positivos, isso é como tudo, mas o turismo ainda tem um papel de relevo e que é muito importante para a sociedade em Lisboa. Se há questões a melhorar? Seguramente, como tudo. Também sabemos que tudo em excesso não ajuda. Apesar de tudo, ainda não atingimos esse excesso. Estamos em condições de aprender com os erros dos outros e melhorar.

Em abril, Miguel Loureiro foi nomeado diretor artístico do São Luiz, com a saída de Aida Tavares. O que motivou a que o novo diretor artístico deste teatro municipal fosse encontrado por nomeação direta e não através de um concurso público?
Não existe uma obrigatoriedade em termos de concursos ou não concursos, de nomeações ou não nomeações. Ter sido uma nomeação não quer dizer que não tenha existido uma seleção ou que não tenha sido avaliado um conjunto alargado de perfis para selecionarmos a pessoa certa, que consideramos que se encaixa no perfil que foi desenhado, quer pelo conselho de administração, quer pelo nosso acionista, a Câmara Municipal.

Nada tenho contra os concursos, como o nosso acionista também não tem, mas nada contra as nomeações e elas decorrem exatamente de muitas vezes dos momentos ideais para os quais devemos fazer. Até porque os concursos nem sempre resultam. Tivemos concursos muito penosos para a equipa do Teatro São Luiz. Muitas vezes pensamos que existe uma maior transparência. Não, não existe. A transparência decorre da confiança que estamos a depositar em determinado perfil e em determinada estratégia que é definida. Depois cá estaremos para fazer o tal balanço e verificarmos se foi positivo, se foi negativo, tentar melhorar, isso sim.

em 2015 a nomeação de Aida Tavares para o São Luiz foi contestada precisamente por não se ter submetido a concurso público. Não o preocupou contestação semelhante?
Sabemos que qualquer decisão é contestada. Mesmo quando fazemos concursos muitos dos resultados foram contestados. O mais importante é sentirmo-nos bem pela decisão que tomámos. Mais vale uma má decisão do que uma não-decisão. Pensamos que a decisão que tomámos foi a correta.

"Lisboa, apesar de tudo, ainda não vive isso [excesso de turistas] com grande abundância. São bem-vindos os turistas. Não só por aquilo que geram. Não sei até que ponto poderíamos viver sem turistas"

O ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, anunciou em setembro que os diretores artísticos dos teatros nacionais e da Companhia Nacional de Bailado passarão a ser escolhidos através de concursos públicos para separar as “opções artísticas” e as “opções políticas do Governo”. Pode-se com os exemplos recentes depreender que a política da EGEAC é a oposta, a da nomeação?
Não. Decorre das necessidades que se nos coloquem. O senhor ministro tomou essa mesma decisão e nós tomámos uma outra decisão. Não quer dizer que em situações futuras não venham a acontecer concursos ou processos de seleção e recrutamento. Isso muitas vezes acontece. A EGEAC tem feito muitos concursos e processos de recrutamento interno ou externo.

No caso de direções artísticas?
Não no caso das direções artísticas porque felizmente ao longo destes meses foi nos permitido manter um conjunto de pessoas porque apresentaram resultados muito positivos. Quero frisar também que a saída da Aida Tavares foi a pedido da própria Aida Tavares, nem sequer se coloca, como muitas vezes se tem avançado, até em termos políticos, que são por imposições políticas ou não. São situações do momento que são criadas e sobre as quais temos de reagir e decidir.

Não considera uma interpretação justa quando é a empresa municipal a nomear a direção?
Nós não somos políticos, somos técnicos. Falo por mim, não sou político, sou técnico e tenho de fazer uma avaliação daquilo que se pretende. Não só em termos de definição de perfil como depois da estratégia que queremos desenvolver para os equipamentos culturais. Decorrente disso temos de fazer uma avaliação do que será melhor para a empresa e obviamente para o equipamento cultural. Fizemos essa avaliação mais técnica do que política. Deixamos para o nosso acionista, a Câmara Municipal de Lisboa, responder à questão política.

Desde a sua entrada que a EGEAC tem optado por manter cargos de direção. Aconteceu no Teatro do Bairro Alto e no Museu do Aljube, em que Francisco Frazão e Rita Rato, respetivamente, foram reconduzidos. Já no caso de Tobi Maier, que estava à frente das Galerias Municipais, disse ao Público em novembro que era uma situação distinta “não sendo quadro da empresa”. Isto é outra forma de dizer que a EGEAC está em contenção de custos e que prevê reduzir o pessoal possível?
Uma coisa é rentabilizar os recursos que temos, financeiros e materiais, outra coisa é fazer cortes. O que procuramos foi fazer uma análise dos resultados que estavam a ser obtidos até ali e o que sentimos é que não correspondia, não era o perfil, no caso do Tobi. Não quer dizer que ele não seja um bom programador. Obviamente que a partir do momento em que a pessoa que ia terminar a sua comissão de serviço não correspondia a esse perfil e, mais do que isso, não pertencia aos quadros, verificámos se não tínhamos nos quadros técnicos especializados da empresa quem pudesse corresponder a estratégia e ao perfil que procuramos. Não há qualquer intenção de fazer cortes, o que há é por e simplesmente [o princípio] de aproveitar os recursos de que dispomos.

A Câmara de Lisboa aumentou o orçamento municipal para a área da cultura em 2023, passando de 45 milhões de euros em 2022 para 55 milhões. No entanto, o subsídio dado pela Câmara à EGEAC tem diminuído. Em 2020 foram 23 milhões de euros, em 2023 são 11,3.
Temos de ver o período temporal que está em causa. O crescimento do envolvimento financeiro da CML no orçamento global da empresa decorre de um período que sabíamos ser bastante penalizador para a atividade. Estávamos a vir de uma pandemia em que a maior parte dos equipamentos, até aqueles que têm maior capacidade de gerar receita, tinham graves restrições de visitantes. Como tal, o orçamento tinha de ser mais elevado.

Temos agora de olhar para a realidade. Apesar de ter sido feita a redução em termos do subsídio à exploração atribuído pela CML, conseguimos manter o orçamento global. Como? Através do desafio junto de todos os equipamentos para contribuírem de forma decisiva para esse mesmo orçamento global, que neste momento é de 36 milhões, mais coisa menos coisa. O desafio é lançarmos atividade que promova esses mesmos equipamentos, que leve mais turistas, nacionais, lisboetas, estrangeiros a visitá-los. Termos um aumento de receitas uma gestão mais equilibrada dos custos também nos permite de alguma forma libertar grande parte das verbas que nos eram atribuídas pela CML à EGEAC.

Pedro Moreira tem histórico na empresa municipal de cultura. Foi diretor de desenvolvimento e gestão cultural da EGEAC entre 2005 e 2016.

FRANCISCO ROMÃO PEREIRA/OBSERVADOR

O Passe Cultura [medida que determina que os residentes em Lisboa com menos de 23 anos e mais de 65 tenham acesso gratuito a todos os monumentos, museus, teatros e cinemas geridos pela EGEAC], implementado em dezembro e que termina no final de junho, teve impacto nas receitas da empresa?
Felizmente o impacto que teve foi uma maior participação e visita dos públicos que auferem dessa vantagem. Em termos de receita felizmente não. O crescimento acentuado de visitantes que temos, tanto nacionais como internacionais, permitiu equilibrar. Foi uma medida com bons resultados e ficará agora na decisão da CML decidir se vai continuar ou não. Para nós foi benéfica porque permitiu trazer públicos que muitas vezes nem sempre estão despertos para irem aos museus e aos teatros. Não estamos só nos teatros para a questão da receita. Muitas vezes a melhor receita que podemos ter é ter um aumento de visitantes. O aumento de público é a forma de partilhar a atividade que desenvolvemos.

Numa entrevista ao Jornal de Negócios em 2021, a sua antecessora, Joana Gomes Cardoso, dizia: “A EGEAC gere 17 espaços e todos geram receita, mas apenas dois são rentáveis, o Castelo de S. Jorge e o Padrão dos Descobrimentos”. Hoje a situação mantém-se?
Não escondo que sim. O Castelo de São Jorge e o Padrão dos Descobrimentos continuam a ser os equipamentos de referência em termos de receitas. O que estamos a procurar é que alguns equipamentos possam pelo menos chegar quase perto do breakeven, em que a despesa se equipare à própria receita.

Já os identificaram? 
Já identificamos aqueles que poderão atingir a breve trecho.

Quais são?
O Museu do Fado tem características para o fazer. O Museu do Aljube também poderá atingir isso. São estruturas que não têm grande número de recursos e cujo crescimento em número de visitantes tem sido muito significativo. O Museu da Marioneta pela sua especificidade penso que também poderá a breve trecho pelo menos tentar equilibrar. Tudo isso é possível também com um relacionamento mais estreito e integrado com a parte dos mecenas. Essa ligação estreita com o privado poderá permitir esse equilíbrio e daí já não se notar tanto o desfasamento que existe com o Castelo ou o Padrão.

Sendo certo que o Castelo de São Jorge é um recordista em termos de número de visitantes, temos de ter uma espécie de regime de solidariedade na empresa em que aquele equipamento que tem capacidade de produzir mais receita possa ajudar outro equipamento que também é muito importante e relevante pelo serviço público, mesmo sendo mais difícil de gerar um conjunto tão significativo de proveitos.

O Teatro Variedades está entregue à EGEAC. Qual é a previsão de abertura?
O Teatro Variedades ainda não está entregue à EGEAC. Está no processo final de concretização da empreitada. Há coisa de um mês foi avançada a última empreitada que é do equipamento cenográfico do próprio teatro. Só após a conclusão do mesmo é que a intenção que já foi expressa pelo senhor vereador da Cultura, Diogo Moura, de que depois possa transitar para a EGEAC em termos de gestão, se concretiza. É nesse sentido que vamos definir o que pretendemos, em conjunto obviamente com o senhor vereador e com o senhor presidente.

O MUDE [Museu do Design e da Moda], que deve abrir no final do ano, é o único museu municipal que não está sob gestão da empresa municipal de cultura. Já foram reportadas conversações com a CML para essa possibilidade. Em que ponto estão?
A Câmara através do senhor presidente e do senhor vereador seguramente irão tomar uma decisão sobre a questão do MUDE. Depois nós procuraremos ajudar na decisão que venha a ser tomada, caso seja essa, a de transferência.

Qual seria o seu parecer?
Neste momento é-me difícil pronunciar sobre o tema porque preciso de obter mais elementos. É uma discussão que já vem de há muitos anos, não é só de agora. Em termos do seu modelo de gestão e da sua transição ou não, acho que nos próximos tempos talvez possa existir uma novidade, mas não posso exatamente dizer algo mais porque não me cabe a mim.

Falando de um espaço que já foi gerido pela EGEAC, o Cineteatro Capitólio, atualmente cedido à Sons em Trânsito, cujo contrato termina daqui a poucos meses. Voltar à mão da EGEAC está em cima da mesa?
Já houve uma indicação superior do senhor vereador da Cultura decorrente de um desafio, uma estratégia que foi articulada connosco. Consideramos que ele deverá regressar ao universo EGEAC e à gestão da própria EGEAC. É isso que estamos a preparar mal termine o contrato de concessão do Capitólio, que ele regresse à esfera da empresa e que tenha então esse modelo gerido pela EGEAC.

Como será a programação? Seguirá a linha do que tem sido feito nos últimos anos, com uma vocação clara para a música?
Queremos que seja um modelo de gestão em que possamos ter um equilíbrio. O Capitólio pelas suas características tem sido de alguma forma direcionado para a componente musical e também para a componente dos chamados venues, ou seja, eventos corporativos. O que estamos a fazer é essa análise no sentido de verificar se deverá ser mantido essa matriz ou se podemos acrescentar algo mais. Eu acho que podemos acrescentar algo mais, até pela características da própria empresa. A EGEAC  tem dentro da estrutura capacidade para fazer programação. É isso que estamos a equacionar: termos um modelo em que a gestão parte de todo o seu universo.

Existirá a figura de um diretor artístico ou programador?
Poderá não existir. Podemos talvez ter um grupo de abordagem, um bocadinho como fazemos para as festas de Lisboa, em que a programação é centralizada e feita em conjunto e articulação com promotores culturais e artísticos. Pode ser um dos passos que venhamos a desenvolver para o Capitólio, nunca esquecendo as características do espaço e, por outro lado, tendo em consideração que já temos equipamentos nossos na proximidade.

Do outro lado da rua está o Variedades. 
Sim, e o Cinema São Jorge… Temos de pensar não só de forma individualizada, mas num diálogo que tem de existir com outras estruturas e infraestruturas de que a empresa dispõe.

Há quase três anos que foi assinado o protocolo sobre o futuro Centro de Estudos da História da Leitura (CEHL), entretanto rebatizado como Espaço Atlântida, o projeto ancorado na doação da biblioteca de Alberto Manguel à Câmara de Lisboa. Segundo foi noticiado é a EGEAC que vai assumir a gestão deste novo equipamento. Quanto vai custar e quando vai abrir?
Uma questão é ser a EGEAC a gerir o espaço: isso é público e foi validado na CML. Sim, é verdade, está inerente o processo de gestão futura daquele espaço por parte da empresa. Relativamente aos prazos, datas e questões orçamentais, o que posso dizer é que quando se avança para projetos destes temos sempre riscos inerentes. O que está aqui em causa não é a construção de um edifício novo, será a requalificação de um edifício, ainda por cima um edifício que de alguma forma tem uma componente patrimonial muito significativa. Qualquer data que possa ser avançada nos primeiros momentos pode correr o risco de não ser aquela mais acertada porque não tem em conta todos esses processos que estão inerentes à requalificação de um espaço como é o do Palacete dos Marqueses de Pombal.

Estamos a trabalhar de forma metódica em fazer todos os levantamentos de todas as necessidades que iremos ter para que a breve trecho possamos lançar a empreitada de requalificação. Terá sempre duas vertentes: uma que será a requalificação do edificado e outra que será a requalificação do próprio património enquanto obra de arte. Aquilo tem um conjunto muito significativo de elementos que são relevantes e que temos agora de preservar e que levam o seu tempo de análise e depois de preparação.

Sobre o custo do Centro de Estudos da História da Leitura: "É difícil estarmos a fazer uma análise financeira pura e dura da mesma. É difícil estar a quantificar"

Refere-se à coleção ou ao edifício?
Ao edifício, que é desde já determinante. Na coleção está a ser feito todo o processo de análise da obra, sobretudo a catalogação e inventariação. A questão do edifício é sempre aquela que levanta mais questões de prazo, não só pelos imprevistos que surgem. Sabemos muitas vezes que intervir num espaço que tem já um conjunto grande de anos de edificado levanta muitas vezes surpresas. Só depois podemos fechar todo o projeto de arquitetura e de especialidade que está iminente de estar concluído e que vai permitir lançar a empreitada. Aí sim podemos ter uma ideia mais concreta do prazo da sua conclusão. Neste momento seria prematuro estar a avançar com alguma data específica.

Fala do edifício que vai albergar as obras, mas a EGEAC ou a CML tem noção do valor da coleção de Alberto Manguel para perceber se justifica o investimento da recuperação deste espaço?
Independentemente disso temos aqui a questão da coleção e do valor da mesma, que tem sido abordado e altamente discutido, mas muitas vezes também nos esquecemos que a mesma coleção produz algo em termos de reconhecimento internacional, em termos de atividade que ela mesma irá gerar e que poderá permitir catapultar a própria cidade de Lisboa em vertentes que muitas vezes não têm tido essa relevância ou essa projeção. É difícil estarmos a fazer uma análise financeira pura e dura da mesma. É difícil estar a quantificar.

Não têm um valor estimado para a coleção?
Foi uma decisão que foi tomada pelo anterior executivo da Câmara e acompanhada obviamente por indicação do anterior conselho de administração. Também tem sido apanágio do senhor presidente da Câmara atual e do senhor vereador em dar seguimento ao projeto, até por respeito aos compromissos já assumidos. É isso que estamos a concretizar. É-me difícil neste momento estar a quantificar “aquela coleção vale X e justifica-se a requalificação”.

A requalificação do edifício só por si já é tudo e vale a pena porque é um património de que a própria cidade irá beneficiar, já que agora está fechado e não é usufruído. A requalificação patrimonial que está aqui inerente é importante independentemente do valor da coleção e do valor da estratégia que venha a ser desenvolvida. Vale a pena, seja ele qual for o valor, porque corremos o risco de perder património. Devemos ver talvez de forma separada essa situação para que não se pense que não vale a pena gastar x milhões pela requalificação do edifício para albergar a coleção. Não, pensa-se primeiro na requalificação do próprio edifício que está fechado e que se pode perder. Isso vai ser feito, vai beneficiar a cidade de Lisboa e os próprios munícipes. Depois, o acolhimento ou não da coleção virá a seguir, a atividade que será desenvolvida em torno da mesma e a projeção que poderá trazer para a cidade de Lisboa e para Portugal.

Analisando o portal Base e os contratos públicos que foram feitos alocados a este equipamento já se gastou mais de 200 mil euros, não apenas na requalificação do edifício, mas também em recursos humanos.
Isso é usual, tem de ser feito para se preparem todos os processos. Apesar de tudo tem havido alguma atividade já em torno do futuro, que é importante também alimentar quando temos janelas temporais tão alargadas para a requalificação do espaço e para a preparação do mesmo para a sua atividade seja ela qual for. Obviamente temos de ter uma equipa preparada, se não também corríamos o risco de ter os espaços prontos e ficarem fechados na mesma por não estarem preparados para abrir ao público. Queremos rentabilizar todos os recursos que podemos dispor, quer no presente quer no futuro, e para isso é preciso um investimento. É isso que tem sido feito.

Parece-lhe lógico um investimento financeiro na catalogação de uma coleção de que se desconhece o valor? Não se corre o risco de estar a gastar dinheiro público numa coleção que não foi avaliada e que, por isso, não há garantias que dê essa tal “projeção internacional”?
Tem riscos, obviamente. Mas a partir do momento em que há uma decisão temos é que valorizar essa mesma decisão, ou pelo menos tentar concretizá-la. É mais difícil tendo sido uma decisão do anterior executivo, não sou a pessoa mais certa para abordar e tendo sido acompanhada pelo anterior conselho de administração…. A única preocupação que temos é verificar a possibilidade de concretização desses compromissos e depois seguir as linhas estratégicas que nos são transmitidas pela CML e pela vereação da cultura. Essa é a preocupação e é a isso que nos estamos a cingir e a tentar cumprir. Existem danos irreparáveis fruto muitas vezes de não se cumprir com determinados compromissos independentemente de decisões que tenham sido tomadas.

Refere-se ao ordenado vitalício que a CML terá de pagar a Alberto Manguel, noticiado pela revista Sábado?
Não me refiro a nada nem gosto de me pronunciar por decisões que tenham sido tomadas nesse sentido. Decorrem muitas vezes do momento em que se vive, foram tomadas, têm de ser equacionadas. Aqui a questão que se coloca é sobretudo concretizar-se um projeto que foi definido e que é isso que nós pretendemos. A partir do momento em que ele possa estar já mais evoluído é pensar de que forma é que o poderemos rentabilizar nas várias vertentes. Isso é que é fundamental. Não gosto muito de me deter sobre o passado, gostaria de mais de me deter no presente e no futuro.

Pedro Moreira fez parte da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses/Presidência do Conselho de Ministros entre 1994 e 2003.

FRANCISCO ROMÃO PEREIRA/OBSERVADOR

Ainda sobre o Espaço Atlântida, no Relatório e Contas de 2022 da EGEAC lê-se sobre o mesmo: “Foi desenvolvida uma extensa programação fora de portas, entre exposições, encontros, leituras encenadas e conversas”. “Extensa” não será uma expressão ambiciosa para 2 exposições, 9 conversas e 1 noite marroquina?
Penso que são aquelas que detalhámos mais.

No site do Espaço Atlântida estes são os únicos eventos que constam na agenda de todo o ano de 2022.
Muitas vezes quando fazemos referência à atividade em si em determinados equipamentos detemo-nos naquelas que têm mais impacto ou maior visibilidade. Essas foram possivelmente aquelas que foram selecionadas pela equipa para serem mais promovidas ou publicitadas, mas houve um conjunto de iniciativas que foram realizadas, e que não foram mencionadas.

O Relatório e Contas, em teoria, não deveria contemplar todas as iniciativas?
Normalmente destacamos as que têm maior impacto, no relatório de contas isso pode ocorrer. A expressão utilizada, “extenso” ou “vasto”, decorre muitas vezes da forma como é escrito. Apesar de tudo foi feita uma programação, um conjunto de atividades relevantes perante a realidade que existe, de um equipamento que está em construção e que de facto tem a necessidade de ser alimentando com alguma atividade.

O Padrão dos Descobrimentos é um dos monumentos sob a alçada da EGEAC. Como observa a discussão sobre a sua potencial demolição?
Como tudo, há sempre interpretações subjetivas. Hoje em dia, com as questões das redes sociais, estamos a falar em debates ao minuto em que há uma globalização desse mesmo debate. Talvez o erro que aqui possamos estar a cometer é estar a ver as questões ou os processos com os olhos do presente. É isso que não podemos fazer. Uma coisa é corrigir, outra coisa é tentar apagar o passado. O passado não se deve apagar. Poderá é ser corrigido. Não minha opinião não o devemos fazer [destruir]. Independentemente das razões que levou à sua construção ele existe.

Temos de valorizar o património, até porque não somos um país que tenha um património assim tão extenso, não podemos estar a destruir um património só porque simplesmente as tendências atuais são muito distintas daquelas que foram no passado. Se não corremos o risco de apagarmos o nosso próprio passado. Nem todos os nossos familiares se portaram bem e não vamos estar agora por e simplesmente a apagá-los porque fizeram erros no passado. A questão é essa.

"Uma coisa é corrigir, outra coisa é tentar apagar o passado. O passado não se deve apagar. Poderá é ser corrigido. Não minha opinião não o devemos fazer [destruir o Padrão dos Descobrimentos]. Independentemente das razões que levou à sua construção ele existe"

Reconhece as leituras de que existe uma romantização do período historicamente designado como “Descobrimentos”?
Como sabe, acho que é público, fiz parte da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses. Sabemos da relevância que essa comissão teve naquele momento. Obviamente que se começarmos a extrapolar para o presente se calhar muitas das coisas que foram feitas seriam também realizadas, mas com uma outra visão. O importante é ter a possibilidade de ter algo, e ao ter esse algo saber avaliar como é que ele foi construído e porquê. A partir daí, ao construir o futuro e baseando-nos nesse passado, podemos melhorá-lo caso seja necessário fazê-lo. Se não o tivéssemos o que seria de nós? Falamos muitas vezes e criticamos porque temos de criticar, se não tivéssemos então não tínhamos que criticar e defender. É preciso bom senso de olhar para as coisas e fazer uma análise de forma construtiva. Não podemos só vê-las do presente, mas também do passado e sobretudo sempre com os olhos do futuro.

Se fosse hoje, a Comissão atuaria de forma diferente?
Podia ter análises e leituras distintas, seguramente teria. O importante da Comissão Nacional dos Descobrimentos foi ter sido uma escola de um conjunto notável de técnicos que hoje em dia estão em boas posições porque de facto foram formados. Num período em que havia pouco, foi possível de alguma forma conseguir desenvolver um leque de iniciativas muito grande e promissor. Foi positivo, mas marcado naquele momento. Devemos ter o prazer e a honra de ter existido. Se aos olhos de hoje, com o conhecimento que temos, faríamos de igual forma? Obviamente que não, mas não quer dizer que não possamos nos orgulhar na mesma.

Surpreendeu-o o desfecho do Museu das Descobertas que, envolto em polémica, acabou por não avançar?
Tenho poucos dados sobre esse processo e daí ser mais difícil comentar. Precisava de saber o conteúdo programático que estava inerente. A questão da designação… É como tudo. Hoje em dia sabemos que muitas designações são marcas, muitas delas vingam, outras não. Se era Fundação das Descobertas, dos Descobrimentos, o que quer que seja, isso é redutor face àquilo que pretendemos em termos de conteúdo programático para esse museu. Isso é que era difícil. Só gostaria de me pronunciar se tivesse um conhecimento mais alargado do que se pretendia para aquele museu. Embora eu não tenha esse problema com as designações. Prendemo-nos demasiado com isso e esquecemos o essencial, que é o conteúdo.

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