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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Pedro Nuno em sprint. O esforço para contrariar a imagem de arrogância e a pressão para apresentar medidas

Há menos de dois meses tinha longo deserto para percorrer, agora está onde quer, mas com tudo por definir. Pedro Nuno Santos prepara medidas para anunciar no congresso e aproveita aparição de Passos.

Anos e anos depois de ter começado a sonhar com este momento, ele chegou: Pedro Nuno Santos é candidato a primeiro-ministro — mas os motores dessa candidatura ainda estão a aquecer. Com apoiantes dos dois lados da disputa interna a pedir que o congresso seja de paz para que o PS possa pensar sem distrações na campanha para as eleições legislativas, Pedro Nuno tem várias preocupações na cabeça: primeiro, retirar da pele o rótulo de “arrogante” e apresentar-se com humildade ao país; depois, preparar medidas concretas — e fazer gestão de expectativas — para o que aí virá. Uma coisa é certa: ninguém no PS lhe exige, para já, uma vitória confortável no dia 10 de março — e há quem antecipe “um ciclo Ferro Rodrigues”.

Em política, a gestão de expectativas pode ajudar a construir uma vitória ou a destruir um resultado. E, no caso de Pedro Nuno Santos, as expectativas eram muitas. Com uma candidatura que vinha sendo idealizada há anos, entre os apoiantes do agora candidato a primeiro-ministro chegou a sonhar-se com percentagens estrondosas, a superar os 70%. O resultado final (62%, contra os 36% de José Luís Carneiro), assim como diferenças mais curtas do que se esperava em distritos importantes, ajudou a moderar as expectativas e a “não permitir excessos de confiança”, como descreve um apoiante envolvido na campanha. E essa gestão de expectativas já se faz quando o assunto é o país, e não só o partido.

A análise dos resultados traz uma certeza para o futuro: a vitória foi clara, mas não esmagadora. José Luís Carneiro apressou-se a vir reclamar a vitória mais alta de qualquer um dos derrotados dos últimos anos (José Sócrates teve 79,7% dos votos contra 16% Manuel Alegre e 4% de João Soares; António José Seguro conquistou 67,9% contra os 32% de Francisco Assis; António Costa chegou aos 67,7% contra Seguro, que nessa votação teve 31,5%). No Porto, um dos distritos mais disputados, a diferença foi de cerca de 1300 votos. Para os apoiantes de Pedro Nuno, os números até podem trazer uma vantagem: segurar o candidato e evitar “deslumbramentos” ou “ajustes de contas”. “Um resultado esmagador não seria bom conselheiro na gestão dos equilíbrios internos”, aponta outro pedronunista.

O tal “deslumbramento” também não é aconselhável fora de portas: os socialistas têm consciência de que, por um lado, falta fechar a etapa interna no congresso, onde vários apoiantes dos dois principais candidatos confessam ao Observador o desejo de que a solução final — que não está fechada — passe por uma apresentação de listas únicas, num sinal de unidade. “O PS tem interesse em que haja listas conjuntas no Congresso para dissipar quaisquer dúvidas sobre a unidade do Partido quando se prepara para enfrentar umas eleições difíceis”, indica um ‘carneirista’.

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"Admito que neste momento esperava que as coisas estivessem a mexer mais", diz um apoiante. "Tem de melhorar. Agora é candidato a primeiro-ministro", aponta outro.

E é também no congresso, marcado para 6 e 7 de janeiro, que surgirão as primeiras pistas para a próxima etapa da maratona de Pedro Nuno, e as primeiras medidas concretas que terá para apresentar ao país (e que deverão, segundo o Observador apurou, incluir medidas para a Habitação, havendo pressão no núcleo duro de Pedro Nuno para que dê rapidamente um sinal de alento à classe média). Os pedronunistas sabem que têm de acelerar: as reações ao primeiro discurso que o novo líder fez, em tom eufórico, a partir do Largo do Rato, ainda a notícia da vitória estava fresca, foram menos do que simpáticas — e muitas, até dentro do partido, apontaram para a ausência de novidade em relação aos discursos de campanha.

Esta semana, o próprio Pedro Nuno Santos fez o seu mea culpa: numa visita ao programa de Júlia Pinheiro, na SIC, assumiu que o discurso, feito de improviso, “não foi espetacular”. Se entre os apoiantes do novo líder o Observador registou reações compreensivas, recordando que aquele momento servia para saborear a vitória — “o momento para falar ao país é no congresso” —, também há quem se vá mostrando ansioso por mais. “Admito que neste momento esperava que as coisas estivessem a mexer mais”, diz um apoiante. “Tem de melhorar. Agora é candidato a primeiro-ministro”, aponta outro.

Pedro Nuno só será responsabilizado em caso de “calamidade”

O que não significa que mesmo os pedronunistas mais indefetíveis estejam convencidos de que Pedro Nuno terá uma vitória de arromba no dia 10 de março — nem que precise de ter. António Costa deu uma ajuda à gestão de expectativas logo no domingo, dia de passagem de testemunho no Largo do Rato, ao frisar que o sucessor não estará obrigado a ganhar as eleições nem a “fazer em meses” o que outros têm “anos” para fazer.

Entre os pedronunistas, há quem interprete a simpatia de baixar a fasquia com algum ceticismo — afinal, quando Costa baixa a fasquia para Pedro Nuno pode estar também a gerir as expectativas com que o seu próprio legado, que também irá a votos no dia 10 de março, será julgado, numa crise política que não tem a ver com o novo líder. Mas a ideia geral é a mesma: Pedro Nuno pode precisar de mais tempo.

"Ninguém vai sacrificar o Pedro Nuno se ele não vencer. Desde que o resultado não seja calamitoso, não é responsabilidade dele. Ninguém deve questionar a autoridade dele"

“Ninguém vai sacrificar o Pedro Nuno se ele não vencer”, nota um apoiante, explicando depois as nuances na leitura dos resultados: “Uma coisa será perder por um ponto ou dois, outra será uma hecatombe face às sondagens. Se ficar em linha com o que as sondagens dizem agora está tudo bem”.

Outro pedronunista de sempre concorda e vê o ciclo que se avizinha como “um ciclo tipo Ferro [Rodrigues]”, recordando os tempos do socialista à frente do partido (herdou-o das mãos de António Guterres, na sequência do “pântano”, em 2001 e teve de ir a votos logo a seguir, perdendo com um resultado muito alto — 38% — contra Durão Barroso — 40% — e conseguindo uma vitória clara nas eleições europeias seguintes).

“Desde que o resultado não seja calamitoso, não é responsabilidade dele. Ninguém deve questionar a autoridade dele”, aponta o mesmo apoiante, lembrando que Pedro Nuno terá por diante um ciclo mais do que exigente: a primeira prova será já nas regionais dos Açores, onde o governo de “geringonça” da direita caiu aos pedaços, em fevereiro; a seguir, legislativas em março; europeias em junho; e autárquicas em 2025 (com eleições para as federações e concelhias do PS pelo meio, ainda por marcar).

O novo candidato tem agora, além da máquina de campanha que se viu obrigado a montar em modo contrarrelógio, mais algumas ajudas preciosas. Por um lado, a máquina do partido, que depois da luta interna tem do seu lado, como secretário-geral. E, com ela, ferramentas como os estudos de opinião da GfK, que continuam a ser feitos para perceber o eleitorado (sendo que o núcleo de Pedro Nuno tem dados que apontam para uma ideia de “arrogância” do candidato, que importa dissipar, como tentou fazer na ida ao “Júlia”). “Se o Pedro fosse todos os dias assim à Júlia tinha maioria absoluta”, graceja um apoiante, que reconhece a tendência do novo líder para entrar facilmente em “modo combate” em entrevistas e debates.

A convicção que reina nas hostes pedronunistas até passa pela ideia de que, governe quem governar, e provavelmente sem a tal maioria, o espetro político pode ficar tão dividido nestas eleições que o próximo ciclo governativo será sempre curto — o que permitiria a Pedro Nuno fazer um ciclo curto como líder da oposição e voltar a candidatar-se a primeiro-ministro com mais tempo. Mas essa futurologia envolve ainda mais incertezas — incluindo perceber se, nesse caso, os carneiristas começariam a fazer valer as ideias que defenderam na campanha (incluindo sobre a falta de competência do novo líder como ministro, ou até o seu caráter e personalidade) e a colocar-se como oposição a Pedro Nuno.

Um Natal (e uma campanha) a malhar na direita. E o presente de Passos

Para já, os sinais são de união, incluindo no discurso que o PS levará à campanha. Apesar de “o Natal se meter pelo meio”, como lembra um pedronunista, e por isso quase tudo estar em stand-by — incluindo as listas para o congresso ou as ainda mais longínquas listas para deputados —, foi precisamente o jantar natalício dos socialistas que serviu, esta semana, para lançar o tom da campanha que o PS intensificará até março.

"Quanto mais o Passos aparecer, melhor para o PS"; "sempre que ele aparece sai-nos a lotaria". As razões são simples: os socialistas continuam a confiar no que o fantasma da troika e do Governo PSD/CDS representa para o eleitorado e para faixas específicas, como os pensionistas ou os funcionários públicos

A estratégia já passava por recuperar a tática das eleições passadas — agarrar o fantasma do Chega, agora com o bónus da geringonça açoriana desfeita, para provar que a direita trará instabilidade, mesmo que Luís Montenegro jure a pés juntos que não se juntará a André Ventura. Mas o PS recebeu um presente antecipado: a aparição de Pedro Passos Coelho, com fortes críticas a António Costa, que acusou de fazer cair o Governo por “indecente e má figura”.

As reações dos socialistas ouvem-se quase em uníssono: “Quanto mais o Passos aparecer, melhor para o PS”; “sempre que ele aparece sai-nos a lotaria“. As razões são simples: os socialistas continuam a confiar no que o fantasma da troika e do Governo PSD/CDS representa para o eleitorado e para faixas específicas, como os pensionistas ou os funcionários públicos. E se Luís Montenegro, que tenta virar o discurso do PSD para a recuperação de rendimentos, era um dos rostos da PàF (coligação Portugal à Frente), Passos Coelho ainda ajudará mais a reavivar essa memória.

Além disso, o PS sente-se satisfeito por ver Montenegro “ofuscado” pelas aparições do antigo líder, e ocupa-se assim a discutir, sobretudo, o passado, num regresso aos tempos do resgate e das dificuldades para os portugueses. O discurso é sobre 2015, mas os pedronunistas também estão conscientes de que o ano é 2023 e que as dificuldades, sendo outras, continuam e se agudizam. Por isso, importa acelerar e começar a apresentar medidas concretas. É hora de Pedro Nuno, que se define como “um fazedor”, explicar o que quer, afinal, fazer.

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