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Portugueses criam ventilador "low cost". Custa mil euros e é feito com materiais de distribuição de gás

Uma equipa de engenheiros e médicos portugueses criou um ventilador mais simples que pode ser usado em pacientes com Covid-19. É 25 vezes mais barato que os normais. Manuel Heitor apoiou o projeto.

Uns são físicos e já trabalharam em projetos do Laboratório Europeu de Física de Partículas (CERN), outros são engenheiros de uma equipa italiana de Fórmula 1, alguns são médicos na linha da frente contra a pandemia provocada pelo novo coronavírus. Todos são portugueses. E, em cima de uma mesa no Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas (LIP) em Coimbra, criaram um ventilador mais simples, barato e rápido de fabricar, que pode ser usado em caso de emergência em pacientes com COVID-19.

O ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, “mostrou interesse e ofereceu apoio” ao conceito quando foi informado dele através do projeto Open Air.

Ao Observador, Manuel Heitor considerou que a iniciativa “é um claro resultado da capacidade acumulada em Portugal em sistemas de engenharia de elevada complexidade”: “O movimento de mobilização nacional em torno deste tema é impressionante e tem sido realizado em estreita colaboração com instituições médicas e a indústria”, comentou o ministro. E acrescentou: “A gama de situações e de produtos em desenvolvimento em Portugal é muito alargada e diversificada”.

A ideia partiu de Paulo Fonte, físico instrumentalista, professor no Instituto Superior de Engenharia de Coimbra e investigador no LIP. Foi ele um dos criadores do Hades, na Alemanha, um detetor de partículas elementares que estuda os núcleos dos átomos para responder a algumas das perguntas mais inquietantes da física quântica. E também foi ele um dos investigadores que montou o SHIP no CERN, na Suíça, um projeto em busca de partículas que ainda não são conhecidas pelos cientistas.

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A ideia partiu de Paulo Fonte, físico instrumentalista, professor no Instituto Superior de Engenharia de Coimbra e investigador no LIP. Foi ele quem criou o Hades, na Alemanha, um detetor de partículas elementares que estuda os núcleos dos átomos para responder a algumas das perguntas mais inquietantes da física quântica.

Um projeto português a várias mãos

Naquela segunda-feira, há duas semanas, Paulo estava em casa, sentado no sofá. Tem outros dois projetos em mãos — um dedicado à tomografia de muões, uma espécie de radiografia feita com raios cósmicos; e outro a um exame que utiliza antipartículas para obter imagens de alta resolução do cérebro. Mas ambos têm avançado “devagarinho” porque a pandemia arrefeceu a indústria, essencial para a produção de eletrónica. E também ele teve de esperar.

Mas não conseguiu. Nesse dia, enquanto via televisão, soube das 2.158 mortes registadas até aquele momento em Itália e viu o número de casos de infeção pelo novo coronavírus a crescer para perto de 10 mil em Espanha. “Não conseguia estar sentado no sofá a ver a catástrofe”, contou o investigador ao Observador. E quis solucionar um dos maiores problemas dos hospitais dedicados ao combate à doença: adquirir ventiladores para os cuidados intensivos o mais rapidamente possível.

Paulo Fonte queria conceber um conceito que permitisse criar mil ventiladores em quatro semanas: “Não sei explicar como é que ela surgiu, o processo criativo é um mistério”, garante ao Observador.

O ventilador numa bancada de testes do LIP. Créditos: Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas

Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas

Mas sabia por onde tinha de começar: pelo projeto Open Air, arrancado pelo neurocientista e filósofo português João Nascimento, sobre o qual o investigador do LIP tinha lido num artigo do Observador. A 11 de março, João tinha sugerido ao mundo através do Twitter que os especialistas se juntassem para criar um novo modelo de ventilador médico com método de código aberto. O apelo foi bem recebido e junta agora dezenas de milhares de investigadores num só projeto. Um deles é Paulo Fonte.

Português reúne centenas de especialistas para criar novos ventiladores — que faltam em muitos locais para tratar o coronavírus

Foi através desse projeto que Paulo se juntou também a médicos — Pedro Póvoa, diretor da Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital São Francisco Xavier; António Bugalho, pneumologista nos hospitais da CUF Lisboa e professor na NOVA Medical School; e cirurgião no Exército Português. E a engenheiros — Américo Pereira, Luís Lopes, Orlando Cunha (LIP), Telmo G. Santos, Alberto Martinho, António Gabriel-Santos, José Paulo Santos, Luís Gil, Tiago Rodrigues, Valdemar Duarte, António Grilo, João Goês, João Martins, João Pedro Oliveira (Universidade Nova de Lisboa), Gonçalo Pimenta (engenheiro estrutural) e Pedro Pinheiro de Sousa (Haas F1 Team).

Debaixo da alçada do projeto Open Air, a equipa criou um ventilador muito mais simples que os usados habitualmente nos hospitais, feito com materiais comuns na distribuição de gás ou de água nas nossas casas — objetos que existem em qualquer armazém e que não estão a escassear. É um sistema tão simples, com materiais tão comuns, que não só podem ser fabricados em tempo recorde em Portugal (até agora, tínhamos mesmo de os importar), como são muito mais baratos. Um ventilador tradicional, feito com materiais certificados pelas autoridades de saúde, custa 25 mil euros. Este precisa apenas de mil para ser produzido.

A equipa criou um ventilador muitos mais simples feito com materiais usados na distribuição de gás ou de água nas nossas casas — objetos que existem em qualquer armazém e que não estão a escassear. Um ventilador tradicional, feito com materiais certificados pelas autoridades de saúde, custa 25 mil euros. Este precisa apenas de mil para ser produzido.

Vários aspetos justificam esta poupança: o ventilador de Paulo Fonte é feito com materiais corriqueiros que não estão certificados, não pode ser usado como um instrumento médico de alta qualidade e tem apenas um modo de funcionamento, enquanto os outros são mais complexos.

Mas “é útil em último recurso, quando os ventiladores médicos normais não estão disponíveis”: “Temos de pensar nele como um medicamento experimental”, comparou o investigador. Com a Covid-19 a chegar ao seu pico e a esgotar a capacidade dos hospitais, cá e no estrangeiro, “não há tempo nem indústria” para esperar por certificados. É que, de resto, “isto não é para comercialização”: “Estamos a fazer isto em prol da humanidade”. Por isso é que foi precisamente em nome da “Humanidade” que a patente deste sistema foi registado.

Útil em emergências, em Portugal ou no resto do mundo

Paulo Fonte explica que os novos ventiladores funcionam “como se enche um pneu”: primeiro, monta-se o ventilador ao sistema de distribuição de oxigénio puro do hospital. Quando uma das válvulas abre, o ventilador insufla os pulmões do paciente com uma pressão fixa. Passado um segundo, essa válvula fecha e abre-se outra para que permite ao paciente expirar por si próprio. “Mas só até certo ponto”, avisa Paulo Fonte, “para manter os alvéolos abertos e aumentar a capacidade pulmonar”.

Neste momento, após ter tido sucesso no primeiro teste que fez ao ventilador em laboratório, a equipa está a trabalhar no projeto para construir um protótipo que possa ser fabricado em massa e experimentado diretamente em pacientes internados com a Covid-19.

Neste momento, após ter tido sucesso no primeiro teste que fez ao ventilador em laboratório, a equipa está a trabalhar no projeto para construir um protótipo que possa ser fabricado em massa e experimentado diretamente em pacientes internados com a COVID-19.

Um dos responsáveis por essa fase do projeto é Gonçalo Pimenta. O engenheiro estrutural da Redbull na Fórmula 1 em Inglaterra entrou no projeto há duas semanas, quando este conceito de “ventiladores low cost“, como lhes chamou, estava a passar da mente dos investigadores para uma bancada de testes no Departamento de Física da Universidade de Coimbra. Com o teste de conceito já feito, Gonçalo Pimenta vai encarregar-se do próximo passo: “Fazer com que o projeto saia das universidades e se transforme em algo real que possa ser fabricado e aplicado em hospitais”.

Quando Gonçalo fala de hospitais, não se refere apenas aos portugueses. Daqui para a frente, os engenheiros do grupo vão engendrar uma maneira de estes ventiladores poderem ser construídos em qualquer lugar do mundo — desde um país na vanguarda da tecnologia a qualquer território do terceiro mundo. “Aqui, podemos usar um cilindro feito num plástico certificado e de boa qualidade. Se houver um país da América do Sul que não o possa fazer, pode pegar neste sistema e substituir o cilindro por garrafas. E o ventilador funcionará na mesma”, explica o engenheiro.

Da chamada telefónica com o Observador, Gonçalo Pimenta ia juntar-se a uma reunião onde se iriam discutir os materiais que podem ser usados para que os ventiladores possam ser usados em hospitais. Não arrisca adiantar uma data para quando o protótipo estará pronto a ser experimentado em contexto real: “O mínimo possível. Se dependesse de nós, dizia-lhe que segunda-feira estava feito. Mas posso garantir-lhe que estamos a trabalhar o mais rapidamente possível”, prometeu.

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