A região de Lisboa e Vale do Tejo continua a ser a que causa maior preocupação ao Governo e autoridades de saúde. Há semanas que é ali que se regista a grande maioria dos novos casos de infeção por Covid-19, que aumentam diariamente na ordem dos 200 ou 300. Apesar de esta segunda-feira a percentagem de novos casos em Lisboa, face ao resto do país, ter sido a mais baixa desde há um mês (63%), foi precisamente esta segunda-feira que o Governo reuniu de emergência com os autarcas dos concelhos mais afetados, de onde saiu ordem para legislar. Ou seja, ordem para apertar o cerco, restringir convívios, evitar botellon, vigiar, vigiar, vigiar. E multar, multar, multar.
António Costa já tinha dado conta, em conferência de imprensa, que havia 15 freguesias mais preocupantes espalhadas pelos concelhos de Amadora, Odivelas, Sintra, Lisboa e Loures, mas não disse quais. A resolução do Conselho de Ministros que estipula as novas regras para a região de Lisboa foi conhecida segunda-feira noite, mas a lista das freguesias continuou sem ser revelada. Só na manhã desta quarta-feira o ministro da Administração Interna levantou o véu em relação às que vão ser alvo de regras mais apertadas na grande Lisboa: “Amadora e Odivelas totalmente”, a pedido dos presidentes de câmara, “seis freguesias do município de Sintra” (na zona da linha de Sintra e do IC19), duas freguesias em Loures, “Camarate e Sacavém e uma freguesia de Lisboa (Santa Clara)”, disse Eduardo Cabrita, à margem de uma visita à Direção Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
Entre as grandes novidades confirmadas, toda a Grande Lisboa, na prática, vai fechar a partir das oito da noite, à exceção dos restaurantes.
Governo evita cerca sanitária, mas dá passo atrás na região de Lisboa. O que muda?
Não haverá cercas sanitárias em nenhuma freguesia de Lisboa, como defendia por exemplo o autarca de Ovar, Salvador Malheiro, mas, em contrapartida, haverá malha apertada aos comportamentos de risco: ajuntamentos, que podiam ser de 20 pessoas, passam a ser limitados a 10, haverá policiamento reforçado, será proibido beber álcool na via pública a qualquer hora do dia e até em esplanadas, depois das 20h, e os estabelecimentos comerciais que não sirvam refeições, como os cafés e as lojas de qualquer tipo (comércio ou prestação de serviços), mesmo as que estão inseridas em centros comerciais, terão de fechar às 20h. Os restaurantes ficam também impedidos de vender bebidas alcoólicas em regime de take away depois das 20h.
O Observador dá-lhe as respostas sobre o que mudou na região de Lisboa a partir da meia-noite desta terça-feira (23 de junho).
Posso ir a um café com um amigo depois do jantar?
Pode ir a um café, sim, mas só até às 20h. Todos os estabelecimentos comerciais da área metropolitana de Lisboa que não sirvam refeições vão passar a fechar às 20h. A partir dessa hora, e até às 23h, os restaurantes podem continuar a funcionar, mas apenas para prestar serviço de jantar. Se quiser deslocar-se a um estabelecimento apenas para beber um copo, depois do jantar, isso não pode. A ideia é evitar ao máximo os convívios para uma bebida, que depois facilmente continuam noutro lugar, mesmo que o restaurante encerre portas às 23h.
Posso ir jantar fora depois das 20h00?
Sim. Os restaurantes continuam a funcionar até às 23h, mas apenas para serviço de refeição. Os restaurantes são a única exceção que vem no decreto do Conselho de Ministros, conhecido esta noite. “Excetuam-se os estabelecimentos de restauração exclusivamente para efeitos de serviço de refeições no próprio estabelecimento”, lê-se. Tudo o resto — “todos os estabelecimentos de comércio a retalho e de prestação de serviços, bem como os que se encontrem em conjuntos comerciais” — encerram às 20h.
Posso pedir uma cerveja junto ao meu pedido de jantar na Glovo ou na Uber Eats depois das 20h00?
O decreto é claro. Quer “diretamente” quer “através de intermediário” os restaurantes não podem vender bebidas em regime de take away a partir das 20h00. O objetivo é evitar o tradicional botellon que tem reunido muitos jovens em ajuntamentos mais ou menos espontâneos.
Se estiver no restaurante a partir dessa hora já não posso pedir mais uma garrafa de vinho?
Nesse caso, pode. Continua tudo como antes. Se o consumo for feito dentro do estabelecimento durante a refeição não há qualquer restrição ao consumo de álcool.
Mas posso sempre ir à bomba de gasolina mais próxima comprar uma cerveja?
Neste caso nem antes nem depois das 20h00. Segundo o decreto, em toda a área metropolitana de Lisboa está proibida a venda de álcool “nas áreas de serviço ou nos postos de abastecimento de combustíveis”.
Então e se for num quiosque com esplanada num dos jardins de Lisboa?
Também não vai ser possível. De acordo com o decreto “é proibido o consumo de bebidas alcoólicas em espaços ao ar livre de acesso ao público”. A qualquer hora do dia. A exceção são mesmo os espaços de restauração e bebidas que podem vender até às 20h00, desde que tenham o espaço devidamente licenciado para o efeito.
Posso ir ao centro comercial e tenho entrada garantida?
Os centros comerciais, que abriram portas a 1 de junho em todo o país mas só abriram a 15 de junho na região de Lisboa e Vale do Tejo, vão ter um reforço ao nível do controlo na entrada e circulação de pessoas. Não quer dizer que não possa ir a um centro comercial de Lisboa. Poder pode, mas haverá uma maior limitação no número de pessoas. E as lojas (à exceção dos restaurantes) só vão estar abertas até às 20h, mesmo que o centro comercial feche mais tarde.
Se a Zara e a Tiger fecharem na Baixa de Lisboa às 20h00, posso ir às lojas do Colombo ou ao Dolce Vita Tejo depois dessa hora?
Não será possível. Seja fora, seja dentro dos centros comerciais da Área Metropolitana de Lisboa, as lojas vão fechar a partir das 20h00. Mas se é assim para comprar roupa, também é assim se quiser pôr um fato a lavar ou fazer uma chave suplente da sua garagem. Além das lojas de roupa, também as lojas de prestação de serviços (como por exemplo as lavandarias, casas de chave ou serviços de costura) têm de fechar às 20h00, mesmo que estejam dentro dos centros comerciais. “Todos os estabelecimentos de comércio a retalho e de prestação de serviços, bem como os que se encontrem em conjuntos comerciais, encerram às 20h”, lê-se.
Moro em Sacavém e trabalho em Lisboa. Corro o risco de haver uma cerca sanitária e não poder ir trabalhar?
Não há esse risco. O governo decidiu não aplicar qualquer cerca sanitária.
Ia fazer um pic-nic de aniversário com 18 amigos na Alameda. Posso manter os planos?
Não. No concelho de Lisboa, bem como nos restantes 17 municípios da Área Metropolitana de Lisboa, os ajuntamentos passam a estar limitados a 10 pessoas. É um passo atrás, já que nas últimas semanas já era possível juntar 20 amigos nas mesmas circunstâncias. O melhor mesmo é guardar o gaspacho para quando a situação melhorar na região de Lisboa e Vale do Tejo.
Se decidir fazer o evento na mesma, o que me acontece?
Não é boa ideia. A polícia passa a ter a possibilidade de aplicar contra-ordenações a grupos de mais de 10 elementos, em vez de simplesmente dispersar. O valor das multas vai ser definido num diploma que o governo ainda irá publicar. Quanto aos valores, apesar de ainda não confirmados oficialmente, a edição desta terça-feira do jornal Público avança que os ajuntamentos com mais de dez pessoas vão dar direito a multas entre 120 e 350 euros.
Na segunda-feira, António Costa explicou que as contra-ordenações só não são de valores maiores porque há um limite a partir do qual essas contra-ordenações teriam de passar pela Assembleia da República o que retiraria a celeridade que a situação sanitária exige. Para já, o que se sabe é que vai haver reforço do policiamento, já que, segundo o decreto, “a atividade operacional das forças e serviços de segurança e dos serviços de socorro a operar na Área Metropolitana de Lisboa pode ser reforçada por efetivos de outras áreas geográficas” em caso de necessidade.
Cometo um crime ao fazê-lo?
Sim. O decreto deixa claro que o desrespeito pelas regras específicas para a Área Metropolitana de Lisboa pode constituir um crime de desobediência e que o mesmo decreto tem força suficiente para fundamentar a prática de crime.
O Código Penal prevê que quem “faltar à obediência devida a ordem ou a mandado legítimos, regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias”. A lei estabelece ainda que “quem não obedecer a ordem legítima de se retirar de ajuntamento ou reunião pública, dada por autoridade competente, com advertência de que a desobediência constitui crime, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias” e que “se o desobediente for promotor da reunião ou ajuntamento, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias”.
Estou infetado. Vou ser vigiado 24 horas por dia para não sair de casa?
Não haverá um Big Brother nem nada parecido — até porque seria inconstitucional — mas a malha vai apertar. Até agora, além de visitas das autoridades (não assim tão regulares) não havia um controlo regular aos doentes em isolamento profilático. Algumas autarquias, em sintonia com as autoridades de saúde, já faziam uma georreferenciação, com moradas, mas sem nomes, para tentarem identificar focos de contágio. A partir de agora equipas das autarquias vão fazer um “acompanhamento” de “proximidade”, com equipas que vão integrar funcionários das autarquias que podem ir desde equipas de proteção civil a assistentes sociais. É o projeto “Bairros Saudáveis”, uma iniciativa que ainda não foi explicada na totalidade. A polícia, incluindo a municipal, também continuará a fazer visitas às habitações.
Testei positivo ao Covid-19 e moro num T2 pequeno com seis familiares num dos concelhos com restrições. A autarquia tem um alojamento para mim? Que alojamento é esse?
As autarquias e as autoridades de saúde vão fazer um esforço para garantir alojamento a infetados que não tenham condições de proteger os familiares ou colegas de casa. Na zona da Grande Lisboa há dois locais preparados para receber doentes: a pousada da juventude de Lisboa e a Base Naval do Alfeite, em Almada.