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Mesmo que a corrida ao armamento nuclear não seja o cenário mais plausível, sem ferramentas como o New Start o controlo de armas fica fragilizado

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Mesmo que a corrida ao armamento nuclear não seja o cenário mais plausível, sem ferramentas como o New Start o controlo de armas fica fragilizado

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Putin põe tratado nuclear em banho-maria. É o início de uma nova corrida nuclear ou bluff da Rússia?

Putin suspendeu a participação da Rússia no último tratado de armas nucleares que tinha com os EUA. Prometeu modernizar a sua tríade nuclear e quer que um novo acordo inclua França e Reino Unido.

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A frase britânica é icónica e foi usada até à exaustão nos tempos da troika, durante a crise económica de 2008. Apesar disso, é a que melhor resume o sentimento entre a comunidade nuclear depois de Vladimir Putin anunciar que a Rússia vai suspender o último tratado sobre armas nucleares que mantém com os EUA. “Keep calm and carry on.” Mantenham a calma e continuem, como se dizia no Reino Unido durante a Segunda Guerra Mundial. Desde que ordenou a invasão da Ucrânia, a 24 de fevereiro de 2022, o Presidente russo tem feito diversas ameaças sobre o uso de armas nucleares, tem feito outras tantas demonstrações de força — como quando o submarino Belgorod, com capacidade nuclear, foi avistado no mar de Barents — e tem estreitado relações com países, como a China, que têm uma visão semelhante à sua do Ocidente (além de possuir um arsenal nuclear).

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Apesar disso, a suspensão do New Start não é motivo para criar pânico ou para acreditar que o mundo vai retomar uma corrida ao armamento nuclear, embora traga consigo alguns riscos sobre o controlo de armas. As 13 mil ogivas nucleares que existem no mundo, distribuídas por nove países, são suficientes para a Destruição Mútua Assegurada, uma doutrina da estratégia militar que considera que se um país iniciar uma guerra nuclear nem atacante nem defensor sobrevivem. A decisão de Putin é antes vista como um ato simbólico, de cariz político, que pouco muda no que aos arsenais russos e norte-americanos diz respeito.

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“É difícil ignorar o quão pouco as ameaças nucleares de Putin conseguiram”, defende Todd Sechser, professor da Universidade da Virgínia. “Depois de um ano de ameaças sobre a possibilidade de a Rússia usar ‘todos os meios disponíveis’ contra os seus inimigos, os ucranianos não se mexeram e o Ocidente está a aumentar o compromisso com a Ucrânia, sem recuar”, defende o co-autor do livro “Nuclear Weapons and Coercive Diplomacy” (2017), citado pela norte-americana CNN.

Na verdade, defende o especialista em segurança nuclear, “a belicosidade nuclear de Putin apenas alimentou a reação internacional contra a Rússia”, mostrando que “as armas nucleares não são uma varinha de condão”.

A decisão de Putin tem consequências, claro. Mas terá impacto real no equilíbrio de poder? Fred Kaplan, autor de vários livros sobre nuclear, dá a resposta na sua coluna de opinião semanal na Slate. “Se a Rússia continuasse a carregar os seus mísseis com o máximo de ogivas que pudessem carregar, isso importaria? Na verdade, cada lado tem bombas e ogivas mais do que suficientes para destruir todos os alvos que possam precisar destruir no caso de uma guerra nuclear”, argumenta o autor de “The Bomb: Presidents, Generals, and the Secret History of Nuclear War”, um livro que explica a política americana sobre guerra nuclear. “Dito de outra forma, cada lado tem mais do que o suficiente para impedir o outro lado de começar uma guerra nuclear.”

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O analista militar britânico Michael Clarke faz a mesma leitura. “Simbolicamente é uma decisão muito importante, em termos práticos não fará diferença nos arsenais nucleares”, argumenta o antigo diretor-geral do Royal United Services Institute (RUSI), think tank britânico de defesa e segurança, no seu comentário habitual na SkyNews.

Ao Observador, Vikram Mittal, professor da Academia Militar dos EUA, em West Point, defende que a decisão de Putin parece mais um movimento político. “As forças armadas russas têm parecido fracas na Ucrânia e estão a tentar lembrar ao mundo que a Rússia é uma potência nuclear com armas fortes à sua disposição.”

O que é o New Start, o tratado das 1.550 ogivas?

“O New Start é o único acordo militar que, neste momento, existe em vigor entre EUA e Rússia”, explica ao Observador o major-general Arnaut Moreira. O acordo existe desde 2010, altura em que foi assinado, em Praga, pelo então Presidente norte-americano Barack Obama e por Dmitri Medvedev, o seu homólogo russo.

Para que servia o tratado? “Procurava colocar um limite naquilo que era o número de ogivas nucleares que cada uma destas duas superpotências podiam ter”, explica o major-general. O número acordado no tratado, que entrou em vigor em 2011, foi de 1.550 ogivas para cada lado. Em 1996, havia 70.300 no total.

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“Era uma evolução positiva, no sentido em que havia uma redução em relação às existências”, recorda Arnaut Moreira. Além disso, as obrigações dos dois países não se limitavam ao número de ogivas. “Ia mais longe. Limitava o número de lançadores e de bombardeiros. Não apenas as armas, mas também os vetores necessários para projetar as armas”, esclarece o major-general.

Os números podem ser consultados no site do Departamento de Estado norte-americano e preveem o que cada país pode ter na tríade nuclear, a estrutura de guerra que permite realizar um ataque nuclear por terra, água e ar — a mesma tríade que Putin disse a 23 de fevereiro, véspera de se assinalar um ano desde o início da invasão de larga escala da Ucrânia, que vai reforçar.

Assim, Obama e Medvedev concordaram não ultrapassar o valor de 700 quando se somam os mísseis balísticos intercontinentais (ICBM) disponíveis, ​​os mísseis balísticos lançados de submarino (SLBM) e os que são implantados em aviões bombardeiros. Cada um destes mísseis pode ser carregado com ogivas nucleares (ou outras cargas convencionais), aquelas que não podem ultrapassar 1.550 em cada país. Ao acordo, acrescenta-se ainda um limite para lançadores: 800, no máximo (posicionados ou não posicionados), de ICBM, SLBM e bombardeiros pesados.

O tratado prevê ainda 18 inspeções no local por ano: os russos podem inspecionar as infraestruturas norte-americanas in loco e vice-versa. Além disso, há um compromisso para trocar comunicações regulares sobre os arsenais nucleares.

Inspeções foram as primeiras a falhar e isso pôs em causa a confiança mútua

Escrever e assinar um documento de papel com números e limites não basta e, por isso, as inspeções eram fundamentais para manter o New Start vivo. “Toda esta nova arquitetura de segurança nuclear precisa de medidas de confiança e essas são representadas pelas inspeções mútuas”, sublinha o major-general Arnaut Moreira, já que serviam para verificar se estavam a ser cumpridos os limites acordados.

“Sem medidas de verificação, os tratados não servem para nada. Ninguém sabe o número de armas que estão em depósito, ninguém pode prever o número de lançadores que estão em submarinos ou noutro lado qualquer. O que tornava o tratado um instrumento de confiança era a existência das inspeções”, sublinha o major-general.

No entanto, Vikram Mittal, professor de West Point, acrescenta que seria muito difícil para qualquer um dos países produzir ou testar secretamente armas nucleares.

Ainda antes de a Rússia suspender a sua participação no tratado — que não é sinónimo de abandoná-lo — as inspeções não se realizavam há muito tempo. Primeiro, por causa da pandemia de Covid-19. Depois, por decisão unilateral da Federação Russa.

“No decorrer da guerra na Ucrânia, em agosto de 2022, Moscovo suspendeu as inspeções dos EUA. O argumento era de que não estavam criadas, do ponto de vista da segurança, condições suficientes para que equipas dos EUA entrassem em território russo para ver se o tratado estava a ser cumprido”, recorda Arnaut Moreira.

Um dos argumentos foi o apoio dos Estados Unidos à Ucrânia desde o início da invasão russa. Agora, depois da decisão de Putin de suspender o tratado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo voltou a recordar um dos motivos porque não considera boa ideia ter inspetores americanos dentro de sua casa.

“Os Estados Unidos empreenderam tentativas claramente provocadoras e extremamente perigosas de investigar a proteção de várias instalações russas incluídas no tratado. Os ataques armados contra eles, lançados pelo regime fantoche de Kiev, foram organizados com a óbvia assistência militar-técnica e de inteligência de Washington”, afirma o ministério de Sergei Lavrov em comunicado. Nas entrelinhas? A administração Biden quer ver o que se passa nas instalações russas para facilitar ataques ucranianos.

“É um argumento”, diz o major-general Arnaut Moreira, mas que não o convence. As instalações nucleares estão extremamente bem defendidas e não é um ataque de drone que faz mossa. “É um argumento que não colhe do ponto de vista militar, mas que pode colher como instrumento de comunicação para justificar outras decisões.”

Por seu lado, Vikram Mittal cola a decisão de Vladimir Putin, anunciada um dia depois de Joe Biden ter visitado de surpresa Kiev, à situação que se vive na Ucrânia. Depois de os tanques Abrams terem seguido viagem, o Presidente russo está preocupado, na opinião do veterano norte-americano, com a possibilidade de os países da NATO enviarem aviões de combate modernos a Zelensky.

“Os caças são armas estratégicas que podem ser usadas pelos ucranianos para atacar no interior da Rússia. Eles estão a usar o arsenal nuclear para tentar impedir a NATO de fornecer aviões de combate à Ucrânia. Até agora, nenhum dos lados tem supremacia aérea. Com caças modernos, a Ucrânia pode ganhar vantagem nas batalhas aéreas”, defende o militar.

Suspensão ou saída do tratado? Faz diferença?

Poucas horas tinham passado do discurso de Vladimir Putin de 21 de fevereiro e o Ministério dos Negócios Estrangeiros emitia um comunicado para clarificar a situação: a Rússia suspendia mas não abandonava o tratado, e continuaria a respeitar os limites das armas nucleares.

“O discurso de Putin tinha um tom muito assertivo. O esclarecimento, não”, defende Arnaut Moreira, recordando que a diplomacia russa frisa que a suspensão do tratado é sempre reversível. “Não se trata de fechar uma porta, trata-se de ameaçar que a porta pode fechar. E isto faz uma certa diferença”, acredita o major-general. “O discurso foi de maior assertividade sobre a falta de confiança mútua. Os analistas internacionais não esperam que recomece uma corrida ao armamento nuclear.”

A nota do ministério de Sergei Lavrov é clara: “A fim de manter o nível necessário de previsibilidade e estabilidade na área de mísseis nucleares, a Rússia adotará uma abordagem responsável e continuará a cumprir rigorosamente as restrições quantitativas estipuladas no tratado para armas ofensivas estratégicas”, lia-se na nota. A Rússia também continuará a trocar notificações de lançamentos de ICBM e SLBM com os Estados Unidos, acrescentava.

É por isso que, do ponto de vista prático, a decisão do Presidente russo parece não ter qualquer efeito. “Tem como discurso de natureza política. Agora é preciso verificar se esta suspensão é apenas de natureza política ou se se concretiza num conjunto de medidas que indiciem que a Federação Russa está disposta a abandonar o tratado e a não cumprir os limites que ele impõe”, conclui Arnaut Moreira.

Dois dias depois do primeiro anúncio, a 23 de fevereiro, véspera do aniversário da guerra, Putin anunciou que vai fortalecer a tríade nuclear russa com os primeiros lançadores do sistema de mísseis Sarmat a ser colocados em combate já este ano. Os sistemas hipersónicos Kinzhal vão continuar a ser produzidos e os mísseis hipersónicos Tsirkon serão implementados em massa.

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O desenvolvimento de novos sistemas não é diretamente uma violação do tratado, desde que os limites impostos se mantenham.

Além dos arsenais em uso, a Rússia tem 1.760 ogivas e os Estados Unidos 1.800 que, apesar de não estarem nos arsenais, permanecem intactas à espera de serem desmanteladas. Há ainda as que estão designadas para potencial uso militar (4.497 na Rússia e 3.750 nos Estados Unidos). O limite das 1.550 são as ogivas que estão posicionadas em mísseis balísticos e em bases militares — ou seja, aquilo que cada país tem apontado ao outro, pronto a disparar.

A declaração de Putin apanhou os Estados Unidos de surpresa? A fazer fé no que se lê na nota de Lavrov, a partilha de informações entre os dois países é para continuar e os EUA terão hipótese de brevemente, a 1 de março, perceber quanto do que foi dito é verdade. Nesse dia, é esperado que russos e norte-americanos troquem dados sobre as forças nucleares, segundo Hans Kristensen, diretor do projeto de informações nucleares da Federação de Cientistas Americanos, citado pela Associated Press.

Nos mais de dez anos do New Start, foram realizadas 328 inspeções in loco e trocadas 25.311 notificações sobre os programas nucleares, segundo o Departamento de Estado dos EUA.

A reação do Ocidente. EUA vão continuar a “agir com responsabilidade”

Se a Rússia suspendeu o tratado, isso não quer dizer que os Estados Unidos sigam os passos de Moscovo, refere o major general Arnaut Moreira. E as primeiras declarações dos políticos norte-americanos vão nesse sentido.

"Acho importante continuarmos a agir com responsabilidade nesta área. Também é algo que o resto do mundo espera de nós.”
Antony Blinken, secretário de Estado norte-americano

No próprio dia em que Putin falou, Antony Blinken respondeu. O anúncio da Rússia “é profundamente lamentável e irresponsável”, disse o secretário de Estado norte-americano, durante uma visita à Grécia. “Acho importante continuarmos a agir com responsabilidade nesta área. Também é algo que o resto do mundo espera de nós”, acrescentou aos jornalistas, sublinhando que os Estados Unidos estarão atentos aos passos da Rússia. Para já, irão manter “uma postura adequada para a segurança” dos EUA e dos seus aliados. 

Blinken disse também que o seu país está disposto a falar “sobre limitações de armas estratégicas a qualquer momento com a Rússia”, independentemente do que esteja a acontecer no resto do mundo ou no relacionamento dos dois países.

NATO teme que controle de armas esteja em causa

Ainda antes do responsável norte-americano, o secretário-geral da NATO lamentou a decisão russa. “Nos últimos anos, a Rússia violou e afastou-se de acordos chave para o controlo de armas. Com a decisão do New Start, toda a arquitetura do controlo de armas foi desmantelada. Encorajo fortemente a Rússia a reconsiderar”, disse Jens Stoltenberg, em Bruxelas.

A análise de Michael Clarke vai nesse sentido. O New Start impunha um limite aos dois países, mas tinha outra importância simbólica. “Todo o processo de estratégia de armas, este acordo entre EUA e Rússia, sobre os mísseis balísticos intercontinentais apontados um ao outro, são o topo de uma pirâmide. E debaixo dessa pirâmide estão acordos sobre armas nucleares táticas, forças intermédias, forças não convencionais, armas químicas, armas biológicas. Há toda uma pirâmide construída, baseada no facto de no topo estar este acordo entre as duas superpotências.”

Um ano de guerra de conquista russa: fim incerto, impacto certo

Se o New Start cai, há um efeito de castelo de cartas. “Na realidade, muito do que estava nessa pirâmide desapareceu ao longo dos anos. Deixou uma ponta, no topo de quase nada. Perdê-la significa que será muito mais difícil construir essa pirâmide de novo algures no futuro”, concluiu o analista militar britânico.

Apesar de suspenso, o New Start pode ser restabelecido, defende, por seu lado, Vikram Mittal. “Esse é o resultado provável. No entanto, isso dificilmente acontecerá até que a guerra na Ucrânia termine”, disse ao Observador. O major-general Arnaut Moreira acredita que o plano da Rússia é outro: transformar a Ucrânia numa alínea de um tratado de segurança global, negociando só e apenas com uma superpotência nuclear como ela.

No dia seguinte ao discurso de Putin, na Polónia e já depois de ter visitado Kiev na companhia do Presidente ucraniano, Joe Biden pronunciou-se sobre as palavras do Presidente russo. “É um grande erro fazer isso. Não é muito responsável”, disse Biden à ABC News. Apesar disso, deitou água na fervura: “Mas não vi nisso a ideia de que Putin está a pensar usar armas nucleares ou algo desse tipo.”

A China, a Coreia do Norte, a França, o Reino Unido e os outros

Mesmo que a corrida ao armamento nuclear não seja o cenário mais plausível, sem ferramentas como o New Start o controlo de armas fica fragilizado. E as movimentações de outros países — que ganharam maior preponderância desde a invasão da Ucrânia —, como a China ou a Coreia do Norte, não podem ser ignoradas.

“Com a Rússia a quebrar tratados, a China a aumentar a produção, a Coreia do Norte a testar mísseis e o Irão perto de ter urânio para construir armas nucleares, este é um mau período para a contenção e estabilidade nuclear”, defende Jon Wolfsthal, conselheiro da Global Zero, movimento internacional pela abolição de armas nucleares.

O perigo, disse ao New York Times, é outro. A decisão de Putin vai, provavelmente,  “alimentar os apelos crescentes para que os EUA aumentem o seu arsenal nuclear para competir com a Rússia e mostrar à China que não nos consegue apanhar”, defende Wolfsthal, que trabalhou com Joe Biden quando este era vice-presidente.

Fred Kaplan também acredita que é “um palpite justo” esperar que alguns oficiais pressionem os Estados Unidos no sentido de violar os limites do tratado, já que sempre existiu a ideia de que o número de ogivas devia estar igualado ao da Rússia.

“Com a Rússia a quebrar tratados, a China a aumentar a produção, a Coreia do Norte a testar mísseis e o Irão perto de ter urânio para construir armas nucleares, este é um mau período para a contenção e estabilidade nuclear.”
Jon Wolfsthal, conselheiro da Global Zero, movimento internacional pela abolição de armas nucleares

As estimativas internacionais apontam para que a China tenha atualmente 350 ogivas nucleares. No entanto, a 29 de novembro do ano passado, um relatório do Pentágono previa que esse valor subisse para 1.500 ogivas em 2035, igualando a capacidade dos EUA e da Rússia, se continuasse com o atual ritmo de desenvolvimento.

Pondo Pequim de lado, e os 90% que estão nas mãos das duas superpotências nucleares, a divisão das ogivas existentes no mundo é a seguinte: França tem 290, Reino Unido tem 225, o Paquistão tem 165, a Índia 156, Israel tem 90 ogivas e a Coreia do Norte terá entre 40 e 50.

Nos últimos dias, e depois do anúncio de Putin e de o principal diplomata da China, Wang Yi, ter visitado Moscovo, a Duma russa aprovou a suspensão do New Start. E Sergei Ryabkov, vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, veio clarificar algumas imposições russas para que o tratado volte a ser tema de conversa. França e Reino Unido, potências nucleares da NATO, têm de entrar nas negociações sobre controlo de armas nucleares — ideia que seria repetida por Dmitry Medvedev.

E a China? Nem uma palavra russa sobre a sua participação numa mesa redonda nuclear, apesar do compromisso chinês de aumentar o seu arsenal nuclear.

Provocação de Putin pode sair cara se corrida ao armamento se tornar real

“É espantoso que Putin tenha desencadeado esta provocação. Ele deve saber que a economia da Rússia e o seu complexo militar-industrial — mal capaz de sustentar uma guerra convencional na sua fronteira — não estão em condições de começar uma nova corrida de armamento nuclear”, defende Kaplan no texto da Slate. E Putin, argumenta, deve saber que os Estados Unidos acompanhariam quaisquer passos que ele desse nessa corrida, recordando que o Congresso aprovou recentemente um enorme aumento no orçamento de Defesa por maioria bipartidária. “O orçamento inclui fundos para desenvolver novas armas para os três ramos da tríade nuclear” e isso foi antes de a Rússia pôr em causa o New Start.

“Putin não pode esperar correr à frente dos EUA”, continua Kaplan. E recorda as conclusões de uma análise da Federação de Cientistas Americanos: se ambos os lados violassem os limites do tratado, carregando totalmente os seus mísseis e bombardeiros, “os Estados Unidos poderiam aumentar o seu arsenal de ogivas e bombas nucleares de longo alcance de 1.670 para 3.570, enquanto a Rússia poderia aumentar o seu arsenal de 1.674 para 2.629.”

Alexander Savelyev, pesquisador-chefe do Instituto Primakov de Economia Mundial e Relações Internacionais, com sede em Moscovo, defende, citado pelo Asia News, que mesmo que Putin queira, não pode investir muito mais em armamento. 

Conselheiro das negociações START-1, antecessor do tratado atual, entre os Estados Unidos e a União Soviética de 1989 a 1991, Savelyev defende que reforçar “um arsenal nuclear estratégico é um programa muito caro e muito longo, que pode levar anos, não meses”. Além disso, argumenta, a Rússia “tem armas nucleares mais do que suficientes”, não vendo qualquer sentido em seguir esse caminho. Sobre o uso de armas nucleares na guerra com a Ucrânia, Savelyev disse esperar “que os líderes e autoridades russas responsáveis ​​​​por essa decisão não sejam do tipo suicida”.

“A realidade subjacente que mais me preocupa”, diz, por seu lado, Jon Wolfsthal, “é que Putin cometeu erros de julgamento atrás de erros de julgamento. E, no entanto, toda a nossa segurança nuclear baseia-se [na ideia de] que aqueles que têm armas nucleares acertam sempre” nas decisões que tomam.

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