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As medidas pretendem recuperar a assistência aos doentes não-Covid, garantindo a segurança e reduzindo o risco de transmissão do SARS-CoV-2
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As medidas pretendem recuperar a assistência aos doentes não-Covid, garantindo a segurança e reduzindo o risco de transmissão do SARS-CoV-2

MARTIN DIVISEK/EPA

As medidas pretendem recuperar a assistência aos doentes não-Covid, garantindo a segurança e reduzindo o risco de transmissão do SARS-CoV-2

MARTIN DIVISEK/EPA

Tribunal de Contas alerta para estratégia irrealista de tratamento de doentes não-Covid e para falta de transparência na linha SNS24

A ministra da Saúde definiu as medidas a tomar para recuperar consultas e cirurgias adiadas. O Tribunal de Contas diz que as medidas não resolvem o problema a curto prazo e fala em reestruturar o SNS.

Alterações que podem “não ser atingíveis no curto prazo”, medidas cuja implementação atual “pode encontrar as mesmas dificuldades que terão impedido a sua implementação no passado” e atividades que não se coadunam com o atendimento não presencial. São estas as limitações que o Tribunal de Contas encontrou na estratégia de recuperação das atividades de saúde para os doentes não-Covid apresentada pelo Ministério da Saúde. Os relatores receiam que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) não tenha capacidade para dar resposta às medidas de realização da atividade assistencial previstas no Despacho n.º 5314/2020, de 2 de maio, visto que algumas delas implicam uma “mudança de paradigma no funcionamento do SNS”.

Os autores do relatório também apontam, no entanto, as potenciais vantagens das soluções propostas, como o recurso à telemedicina ou o aumento dos serviços disponíveis nos cuidados primários. Em teoria, haveria, por um lado, um aumento da eficiência na alocação do tempo dos profissionais de saúde e uma poupança de tempo (e, por vezes, de deslocação) dos utentes, e, por outro, um aumento do papel dos cuidados de proximidade, deixando para os hospitais o tratamento das doenças agudas mais diferenciadas. Os meses analisados, porém, não mostraram uma recuperação significativa das atividades suspensas ou canceladas, em relação a igual período do ano anterior.

“Verificou-se uma recuperação parcial dos níveis de produção de consultas e cirurgias programadas em algumas unidades hospitalares mas, na generalidade das unidades, a produção manteve-se inferior à realizada em 2019.”
"Covid-19. Impacto na atividade e no acesso ao SNS", Tribunal de Contas

Para “minimizar os constrangimentos operacionais” nas várias entidades, o TdC baseou a análise e conclusões apresentadas no relatório em auditorias anteriores e em dados publicamente disponíveis, destacando a importância da área da Transparência — uma plataforma online que disponibiliza informação do SNS de forma aberta. Mas não poupam críticas à falta de dados atualizados por parte da linha de atendimento SNS24: “É de salientar que a desatualização que se verifica na informação relativa à atividade do SNS24 não tem justificação face às orientações da DGS [Direção-Geral da Saúde], que determinaram o acesso da assistência das pessoas com sintomas Covid através do contacto com a Linha SNS24 e bem assim face aos objetivos subjacentes ao Portal da Transparência, no qual os dados são habitualmente disponibilizados”.

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O risco de a capacidade do SNS não ser suficiente

Em março de 2020, o país parou devido à pandemia e, por arrasto, quase toda a atividade de assistência em saúde também. O próprio Tribunal de Contas teve de redefinir as prioridades do Plano de Ação para 2020 por causa da pandemia e passou a incluir a avaliação do impacto da doença Covid-19, nomeadamente, pela “realização de uma ação de controlo relativa à gestão da pandemia pelo Ministério da Saúde”.

No início da pandemia em Portugal, a ministra da Saúde, Marta Temido, determinou a suspensão da atividade programada não urgente a partir de meados do mês de março e o resultado, segundo o Tribunal de Contas, foi que entre março e maio (em relação a 2019) se fizeram menos 93.300 cirurgias (quebra de 58%), menos 683 mil atendimentos nos serviços de urgência hospitalares (menos 44%) e menos 364,5 mil primeiras consultas externas nos hospitais (redução de 40%).

Posteriormente, através de despacho assinado no início de maio, a ministra previu não só a recuperação das atividades suspensas ou canceladas como também que toda a assistência feita pelos profissionais de saúde cumprisse as orientações de segurança para prevenção da transmissão do SARS-CoV-2. Os autores do relatório do Tribunal de Contas receiam que o SNS não consiga dar a resposta necessária a este nível de exigência. “A recuperação da atividade não realizada por força da pandemia Covid-19 terá que ocorrer num contexto de cuidados adicionais na prática clínica, com o risco de a capacidade instalada no SNS não ser suficiente para fazer face a este acréscimo de procura sem o aumento acentuado dos tempos de espera.”

A assistência ao domicílio é uma das medidas previstas, mas, excluindo a realização dos testes de diagnóstico de SARS-CoV-2, continua a ser residual

JOSÉ COELHO/LUSA

Ter os centros de saúde a funcionar ao fim de semana ou aumentar o número de consultas no domicílio são duas das medidas que o Tribunal de Contas não vê ser possível implementar de forma sistemática num curto prazo. O mesmo considera para as soluções que implicam a alteração da filosofia de funcionamento do SNS, como ter as consultas externas hospitalares ou os exames complementares de diagnóstico a serem realizados nos cuidados de saúde primários em vez de continuarem a realizar-se em contexto hospitalar.

Outras duas medidas do despacho da ministra da Saúde preveem que as consultas e outros cuidados de saúde sejam feitos com hora marcada ou que os doentes não urgentes sejam encaminhados para os cuidados de saúde primários e não para os hospitais. Ora, como refere o relatório, este tipo de medidas “já estava disponível para a generalidade dos prestadores de cuidados de saúde do SNS” e, como tal, a sua implementação agora pode encontrar as mesmas dificuldades que terão condicionado a sua implementação no passado.

Marta Temido, exercendo o direito de resposta ao relatório elaborado, explicou que “o Ministério da Saúde deu orientações concretas aos estabelecimentos públicos de saúde para que a [retoma da atividade assistencial programada] ocorresse, desde logo, com recurso a mecanismos já existentes” — os tais referidos no despacho — e destaca o “significativo aumento dos meios de atendimento não presenciais”.

Atendimento remoto não é solução para todos os problemas

Apesar de todo o esforço no atendimento não presencial, é difícil pensar que isso possa resolver as dificuldades em contexto hospitalar, onde são feitas consultas de especialidade e se recorre a meios complementares de diagnóstico e terapêutica. Os números falam por si: o número de consultas em telemedicina aumentou ligeiramente em relação a anos anteriores, mas nunca ultrapassou as 4.000 consultas diárias, mesmo durante o pico da pandemia. Até porque, as primeiras consultas, aquelas que tiveram uma quebra maior, “envolvem um processo mais complexo de diagnóstico e, eventualmente, serão menos substituíveis por contactos não presenciais”.

Entre março e maio de 2020, foram realizadas menos 882.333 consultas médicas externas em unidades hospitalares do SNS (de doentes não internados) — menos 28% do que em igual período no ano anterior —, grande parte das quais (364.535) eram primeiras consultas. A redução destas primeiras consultas podem resultar de dois fatores, lembram os autores: primeiro, a própria redução da atividade nos hospitais, depois, a redução da atividade nos cuidados de saúde primários que são quem normalmente encaminha os doentes para a consulta externa.

Nos cuidados de saúde primários houve mais consultas médicas adiadas ou canceladas (1.156.689 consultas) do que nas consultas externas dos hospitais, mas representou uma quebra menor em relação ao ano anterior (menos 15% que entre março e maio de 2019). Analisando os dados em pormenor verifica-se, no entanto, que a atividade presencial reduziu quase 60% (de 5,3 milhões de consultas, em 2019, para 2,3 milhões), mas que isso foi compensado, ainda que parcialmente, pelas consultas não presenciais (4,2 milhões de consultas, em 2020, contra 2,3 milhões, em 2019). As consultas remotas aumentaram 83% e “passaram a representar, em 2020, 65% do total das consultas médicas realizadas entre março e maio”.

Mas nem toda a atividade nos centros de saúde pode ser assegurada pelos contactos remotos e a quebra na administração de vacinas é um bom exemplo disso: menos 77.330 vacinas dadas, que representa uma quebra de 13% naqueles três meses. Ainda assim, a redução de 36% dos contactos presenciais em enfermagem conseguiram ser parcialmente compensados por um aumento de 73% nos contactos não presenciais. Mas ao contrário das consultas médicas, só 15,6% das consultas de enfermagem foram realizadas de forma não presencial.

Tribunal de Contas sugere reestruturação do financiamento do SNS

Como podem então os estabelecimentos públicos recuperar a assistência aos utentes, em plena pandemia, com todos os desafios que têm de enfrentar? Os autores do relatório deixam um aviso: “Tal recuperação pode justificar a criação extraordinária de incentivos específicos no sistema de financiamento do SNS, para além do uso que o Ministério confira a todos os mecanismos já existentes e sem prejuízo do seu reforço, como já ocorrido pela majoração dos incentivos à produção adicional no Serviço Nacional de Saúde”.

Estes incentivos, porém, foram criados, garantiu Márcia Roque, presidente do Conselho Diretivo da Administração Central o Sistema de Saúde, exercendo o direito de resposta no âmbito deste relatório. “Importa destacar que atualmente já existem diversos incentivos financeiros para a realização de atividade adicional dentro dos hospitais públicos, nomeadamente a majoração do pagamento das primeiras consultas, das teleconsultas, das consultas descentralizadas, das respostas domiciliárias (…). Para além disso, existe também a possibilidade de pagamento aos profissionais do SNS da atividade adicional que estes realizem nos seus hospitais.”

O Tribunal de Contas conclui, ainda assim, que as medidas determinadas pelo despacho do Ministério da Saúde — apesar de “potencialmente promotoras de uma mais eficaz e eficiente alocação dos recursos no SNS” —  não descartam os riscos associados, nomeadamente caso não seja feita uma reestruturação do funcionamento e financiamento do SNS. E isso pode não ser conseguido apenas com incentivos financeiros extraordinários, explicam os autores do relatório.

“Tendo em conta o caráter estruturante de várias medidas preconizadas, poderá justificar-se o seu enquadramento no sistema de financiamento do SNS, nomeadamente autonomizando a produção contratada a realizar nas condições referidas e o respetivo financiamento, por forma a criar incentivos à sua concretização.”
"Covid-19. Impacto na atividade e no acesso ao SNS", Tribunal de Contas

Os mecanismos de incentivo, lembra Marta Temido, servem não só para a recuperação das primeiras consultas, mas também para as intervenções cirúrgicas. Considerando apenas as cirurgias urgentes houve uma quebra de 17%, menos 4.359 em relação a igual período do ano anterior. E não foram só as cirurgias programadas que sofreram uma quebra acentuada (menos 93.300 do que no ano anterior): os autores do relatório estimam que “cerca de 109 mil novas inscrições para cirurgia terão ficado por realizar naquele período”, em parte porque menos pessoas foram referenciadas para este tipo de intervenções.

Com menos novas inscrições para cirurgia entre março e maio, acabou por diminuir o número de doentes a aguardar cirurgia, mas a verdade é que mais de 40% das pessoas a aguardar cirurgia já tinham ultrapassado os Tempos Máximos de Respostas Garantidas (TMRG). Estes tempos de espera aumentaram, genericamente, nas cirurgias realizadas em maio, com exceção das “cirurgias mais urgentes (prioridades 3 e 4, doença oncológica e não oncológica), [onde] o cumprimento dos TMRG melhorou, reflexo do foco da atividade nestes doentes, face aos menos urgentes”.

A ministra da Saúde reconhece “que ocorreu uma inflexão dos resultados positivos obtidos nos últimos anos” durante os primeiros meses da pandemia. A estratégia para os próximos meses passa pelo Plano de Saúde para o Outono-Inverno, com a “formalização de uma task-force de resposta não-Covid-19 e indicando exemplos de ações concretas que podem e devem ser adotadas pelos estabelecimentos e serviços para assegurar níveis assistenciais adequados em todos os níveis de prestação de cuidados”.

O Tribunal de Contas termina o relatório acautelando que é preciso preparar o futuro e não esquecer o impacto da segunda onda da pandemia. “O desafio sobre a alocação adequada dos recursos e a regulação dos níveis de serviço disponibilizados, na medida do necessário, mantém-se no presente e no futuro próximo, tendo em conta a necessidade de recuperação da atividade programada não realizada e a resposta do Serviço Nacional de Saúde a uma eventual segunda fase de maior incidência da pandemia.”

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