Além de todas as conferências adiadas, voos cancelados e vendas reduzidas, há muitas oportunidades de negócio a perderem-se devido ao Covid-19: parcerias e contactos que agora já não se farão porque eventos como a maior feira de vinhos do mundo (em Dusseldorf) ou a BTL — Bolsa de Turismo de Lisboa foram adiados. A imprevisibilidade da evolução do surto torna ainda mais difícil antecipar a dimensão dos estragos provocados na economia portuguesa e mundial.
Que impactos do vírus é que as empresas portuguesas já estão a sentir?
Há empresas que começam a mostrar preocupação; e outras que já notam alguns constrangimentos, sobretudo no abastecimento e nas encomendas. Segundo um estudo da Associação Empresarial de Portugal (AEP), feito junto de 200 empresas com atividade em Portugal, um quinto dos entrevistados garantia que já se deparava com consequências a um nível “significativo ou muito significativo”.
https://observador.pt/2020/03/06/coreia-do-sul-regista-518-novos-casos-de-coronavirus-em-24-horas-surto-ja-fez-3383-mortos/
As perspetivas para o futuro não são melhores, “com os empresários a mostrarem-se muito apreensivos” — praticamente metade considera “que vai sofrer um impacto negativo, de forma significativa ou muito significativa, na sua atividade”. Apenas 5% não esperam repercussões negativas.
Mas que problemas estão estas empresas a enfrentar? Por um lado, dificuldades de abastecimento no exterior, em particular de matérias-primas (sobretudo provenientes da China e de Itália) e de produtos. Por outro lado, a redução de encomendas, o cancelamento ou adiamento de eventos internacionais (já foram vários, sobretudo feiras), fecho de fábricas de tecnologia e, “de um modo mais transversal, a situação de abrandamento económico”.
Há ainda a registar “dificuldades na chegada aos aeroportos nacionais, nomeadamente no regresso de colaboradores que participam em eventos no exterior, que se traduzem na falta de acompanhamento em termos de medidas de precaução/contenção e falta de informação sobre que medidas adotar”. A “esmagadora maioria das empresas não regista e também não espera vir a registar um impacto positivo na sua atividade”, conclui o mesmo estudo.
O Coronavírus ajuda a exportação de carne de porco, como disse a ministra?
No início de fevereiro, a ministra da Agricultura, Maria do Céu Albuquerque, fez uma declaração polémica (que depois retificou). Segundo a ministra, o novo coronavírus pode ter “consequências bastante positivas” na agricultura portuguesa e nas exportações para o mercado asiático. Maria do Céu Albuquerque acrescentava que a confiança na carne de porco portuguesa estava a aumentar no mercado chinês. Estará o novo coronavírus a ser benéfico para as exportações de carne de porco?
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João Bastos, presidente da Federação Portuguesa de Associações de Suinicultores, não tem ainda números sobre o impacto do surto nas exportações de carne de porco. Confirma ao Observador que “houve um aumento das encomendas” da China, mercado que confia nos produtos portugueses (nomeadamente por questão de segurança dos alimentos), mas é cauteloso a associar este crescimento apenas ao coronavírus. Até porque os dados de fevereiro só serão conhecidos em abril.
Embora o surto possa ser “um dos fatores”, há ainda a registar a peste suína africana, que já prejudicou muitos produtores na China e levou o país a procurar mercados alternativos, e o facto de Portugal ter começado a exportar carne de porco para a China há cerca de um ano — com as exportações a aumentarem todos os meses desde então. Em janeiro, fixaram-se em cerca de 4 milhões de euros.
Com o novo coronavírus, “os padrões de consumo alteraram-se: os chineses compram mais online e sentem muita confiança nos produtos importados”, diz João Bastos. O responsável estima que as exportações para a China — o primeiro mercado da carne de porco portuguesa — mais do que dupliquem em 2020. Mesmo apesar do coronavírus.
Já Marco Henriques, diretor comercial da Maporal, um matadouro em Reguengos de Monsaraz que exporta, em média e por mês, 50 contentores de carne de porco para a China, tem outra visão. O responsável diz que os problemas que a empresa já enfrentou devido ao Covid-19 tiveram sobretudo a ver com “problemas operacionais” nos portos chineses. O problema agravou-se há três semanas, quando os portos chineses deixaram de permitir as descargas.
A situação já está, entretanto, “estável”, embora só deva estar totalmente normalizada “daqui a duas a três semanas”, mas Marco Henriques nota uma diminuição nas exportações. Uma parte é normal dado que há sempre um pico de exportações no final do ano devido ao Ano Novo chinês — daí que, no início do ano, se verifique uma diminuição do consumo. Este efeito foi, porém, “agudizado” pelo surto do novo coronavírus — e os consequentes problemas de operação nos portos. Ainda assim, a Maporal “não foi muito afetada”. “Já tínhamos feito os contratos no final do ano.”
Que impactos pode o surto ter nas companhias aéreas?
Para perceber o impacto que este vírus está a ter nas transportadoras aéreas podemos ficar já pela TAP. A companhia portuguesa reduziu a oferta em 4% entre março e o início de abril, o que representa menos 1.000 voos, devido ao “forte abrandamento da procura” em resposta ao surto de coronavírus.
O volume de reservas para março e abril mostra desde as últimas duas semanas quebras significativas relativamente ao ano passado, indicou a TAP, acrescentando que os cancelamentos incidem em especial nos voos para cidades em países mais afetados como a Itália, mas refletem também a redução da oferta em outros mercados europeus que registam maiores quebras como Espanha e França.
“A quebra na procura implica naturalmente um decréscimo da receita, pelo que, para proteger a integridade da sua tesouraria, a TAP tomou já algumas decisões fundamentais, como a suspensão de todos os investimentos não críticos, a revisão e corte de despesas não essenciais para o negócio ou a suspensão de contratações e novas admissões, para além da adequação da oferta à procura”.
A Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) estima que o surto do novo coronavírus leve a uma redução de 13% na procura das companhias aéreas, na região da Ásia-Pacífico — as previsões, em dezembro de 2019, eram de um crescimento no setor de 4,8% naquela região.
Na mesma análise preliminar, divulgada a 20 de fevereiro, a IATA perspetiva que as receitas das transportadoras aéreas com passageiros em todo o mundo caiam 2,9 mil milhões de dólares (mais de 2,6 mil milhões de euros), o equivalente a uma redução de 4,7%. Só na Ásia Pacífico, o impacto pode chegar aos 27,8 mil milhões de dólares (12,8 mil milhões dos quais em voos domésticos na China).
As previsões de dezembro da IATA revelavam que o setor deveria crescer 4,1% em 2020, em todo o mundo, pelo que os novos dados mostram que o surto mais do que elimina o crescimento inicialmente previsto. “É o primeiro declínio geral na procura desde a crise financeira global de 2008-09”, diz Alexandre de Juniac, presidente executivo da IATA. A análise da associação internacional pressupõe que o novo coronavírus terá uma trajetória semelhante à da SARS (que, em 2003, foi responsável por uma queda de 5,1% nas receitas com passageiros).
A queda na procura terá um impacto financeiro “severo” para as companhias aéreas particularmente expostas ao mercado chinês. Apesar de as poupanças em combustível ajudarem a compensar parte da receita perdida, o presidente da IATA prevê “um ano muito difícil para as companhias aéreas”.
Têxtil e calçado exportam mais de 70% da produção. Como está o setor a reagir?
Os setores do têxtil, vestuário e calçado já disseram que estão “preocupados” com os impactos do coronavírus, ora na obtenção de matérias-primas, ora na produção e exportação dos produtos. Ao Observador, Paulo Gonçalves, diretor de comunicação da Associação Portuguesa dos Industriais do Calçado, Componentes, Artigos de Pele e Seus Sucedâneos (APICCAPS), diz que o setor vive “uma certa instabilidade, que não pode ser positiva”. As empresas enfrentam “uma série de incertezas sobre se as mercadorias chegam, ou se chegam a horas”, exemplifica. “Há um mês que estamos no limbo.”
Ainda que Portugal seja auto-suficiente nalguns componentes, Itália é um dos principais fornecedores dos associados da APICCAPS, o que provoca “uma indefinição”. “Ainda não temos problemas na produção, mas as empresas começam a mostrar sinais de preocupação devido a este clima de incerteza, em que há negócios adiados e compradores a retardar as encomendas”.
Um possível abrandamento do crescimento da economia para este ano devido aos impactos do coronavírus — como prevê o FMI — “vai ser prejudicial para o setor”. Paulo Gonçalves não é ainda capaz de explicar de que forma — até porque o período entre o final de fevereiro e as duas primeiras semanas de março costuma ser de transição entre duas coleções, com as empresas a abrandar a produção por ainda estarem a preparar a coleção de Inverno.
É impossível fazer uma previsão, seria uma especulação. Tal como é especulação dizer que Portugal pode ser beneficiado [com o surto]. Em primeiro lugar, porque não concorremos com a China; em segundo lugar, porque quando há deslocalização da produção da China, não é para Portugal.”
Esta “incerteza” está a obrigar as empresas do sector a procurar alternativas no abastecimento da cadeia de produção — e em muitos casos, isso passa por recorrer a empresas portuguesas.
As empresas representadas pela APICCAPS exportam mais de 85% do que produzem. Para a China e Hong Kong, as exportações chegaram a cerca de 30 milhões de euros em 2019, mais 25% do que no ano anterior (em termos de comparação, as exportações para Itália representam 40 milhões de euros e para França 400 milhões anuais). O surto, admite o responsável, “pode abrandar a estratégia de penetração em mercados fora da Europa, como a China”.
Mário Jorge Machado, presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP), nota também que os principais impactos que as empresas do setor já sentem “estão relacionados com a disrupção na cadeia de fornecimento”. O setor é “altamente globalizado” e as regiões mais afetadas pelo surto, em particular a China e Itália, são dos principais fornecedoras de alguns produtos, pelo que, “neste momento, as empresas poderão começar ou já estar a sentir falta/racionamento de algumas matérias-primas, acessórios, materiais auxiliares”. Nalguns casos, “dificilmente poderão ser encontrados substitutos”.
A falta de alguns produtos, e de substitutos, vai “originar atrasos nas encomendas” e pode mesmo, dependendo do tempo que dure o surto, impedir que se concretizarem algumas encomendas, com impacto ao nível do volume de negócios e exportação (o setor exporta cerca de 70% do que produz).
É “difícil” fazer previsões sobre os próximos meses, adianta o responsável, mas se, “numa primeira fase, a principal preocupação está a ser com falta/racionamento”, designadamente de matérias-primas, “nos próximos meses, as questões relacionadas com contágio de trabalhadores (com possíveis implicações ao nível da suspensão parcial ou total da atividade) deverão ter maior impacto nas empresas do setor”.
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César Araújo, presidente da Associação Nacional das Indústrias de Vestuário e Confeção (ANIVEC), concorda que se o surto se prolongar no tempo, o efeito pode ser “dramático” para as empresas de vestuário, embora as empresas associadas tenham stocks de matérias-primas para quatro semanas, segundo disse à Lusa.
Mais de 85% de toda a roupa consumida na Europa provém da Ásia, o que torna o continente europeu “refém” desse continente, defende o responsável. A ANIVEC diz-se ainda preocupada com o facto de o prolongamento do surto poder prejudicar as encomendas feitas às empresas nacionais, em especial no mercado de luxo.
Como é que o cancelamento de feiras está a afetar o setor mobiliário?
Esta quinta-feira foi cancelada a segunda edição do Portugal Home Week, uma feira de mobiliário que estava marcada para os dias 17, 18 e 19 de junho. O cancelamento acontece devido ao adiamento do Salone Del Mobile, em Milão, uma das maiores feiras do setor, para datas que coincidiam com o evento em Portugal.
“A informação que temos é que, se a feira de Milão não se puder realizar entre 16 e 21 de junho, será mesmo cancelada. Sendo o principal certame internacional, iria afetar-nos, temos muita exposição nestas feiras”, explica ao Observador Gualter Morgado, diretor-executivo da Associação Portuguesa das Indústrias do Mobiliário e Afins (APIMA). Uma outra feira, em Xangai, na China, também já teve de ser adiada.
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Além da coincidência de datas, a APIMA, organizadora da feira agora cancelada, viu-se “obrigada” a cancelar o evento também por falta de confirmação de presenças. “Ninguém estava a aceitar o convite devido à incerteza da evolução do vírus. Mas no próximo ano, vamos duplicar o investimento e o número de convidados e, assim, potenciar o retorno”.
Gualter Morgado adianta que, para já, “não há efeitos duradouros relativamente à produção e ao negócio em si”. “Pode é notar-se a médio prazo. Vai afetar a atividade quando começar a haver restrições de transporte dos produtos. Se a situação se alargar no tempo, mais dois ou três meses, teremos um impacto significativo”. Este impacto será maior se for necessário fechar fábricas. Ou mesmo escolas, com os pais a terem de ficar em casa com os filhos. “Tudo depende da evolução das medidas que tiverem de ser tomadas.”
A nível de matérias-primas, o setor, que não depende da Ásia, tem stocks não para meses, mas para anos. A APIMA fala numa “ruptura de stock” apenas no caso das ferragens de baixo custo. Mas, também nestes casos, a alternativa pode ser recorrer a empresas portuguesas, diz o diretor-executivo. “Embora o custo seja mais elevado, a qualidade também o é.”
As empresas da APIMA exportam 90% da produção — 70% para a Europa, e apenas 5% para a Ásia.
E na agricultura, que exporta cada vez mais?
O presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) manifestou nesta segunda-feira “alguma apreensão” devido ao novo coronavírus, que pode ter impactos na agricultura ao nível da “contenção de exportações” de produtos agrícolas.
“Os impactos poderão refletir-se na exportação”, afirmou Eduardo Oliveira e Sousa. Isto, “se houver, como há nos outros setores, contenção de exportações e de consumos porque os mercados se vão ou se estão a fechar durante este período, enquanto a população não se habituar a viver com esta nova situação de saúde pública, como aconteceu com a gripe das aves há uns anos ou com outras epidemias”, acrescentou.
“Não estamos em crer que os governos não encontrem solução para conviver com essa matéria”, afirmou Eduardo Oliveira e Sousa, reiterando que, “pontualmente, poderão começar a surgir reflexos” da situação económica provocada pelo Covid-19 “principalmente na exportação de produtos” agrícolas, mas não a nível nacional.
Ao Observador, Luís Mira, secretário-geral da mesma CAP, diz que “o que mais preocupa as empresas é que não se vislumbra o fim desta situação. Temos de ver quanto tempo isto vai durar. Se durar um mês é uma coisa, se durar mais…”
As exportações agrícolas de Portugal para a China, que têm vindo a crescer nos últimos anos, “estão paradas”, diz Luís Mira. “Estávamos a aumentar as quantidades exportadas de vinho e carne de porco. Uma contenção da economia chinesa com esta dimensão vai ter consequências”.
Que riscos enfrenta a AutoEuropa, que valerá cerca de 1,6% do PIB português?
A AutoEuropa garante ao Observador, através de fonte oficial, que a produção da fábrica está a decorrer “de forma normalizada” – sem quaisquer casos suspeitos validados entre os trabalhadores – e com um abastecimento de componentes que “está a ser feito de forma regular”.
Como é normal neste tipo de empresas, que recebem uma parte das peças vindas da China – embora a maioria venha da Alemanha e de outros países da Europa Central – os carregamentos de componentes habitualmente são de grande dimensão, o que permite ter uma “folga” de várias semanas.
A 20 de fevereiro, a AutoEuropa – que vale 1,6% do PIB e 5% das exportações de bens – tinha dito ao Jornal de Negócios que não estava a sentir impacto do coronavírus e que as peças que vêm de fornecedores chineses chegavam para, pelo menos, quatro semanas de produção. Uma margem confortável, disseram os responsáveis da empresa.
Cerca de duas semanas volvidas, o Observador perguntou à AutoEuropa se, nesta fase, já estão a sentir quaisquer perturbações no fornecimento de peças, ou seja, se têm indicações de que os próximos carregamentos vão ser satisfeitos como previstos. Resposta: “Estamos a controlar a cadeia logística”.
E os vinhos? De que forma é que este setor está a sofrer com o surto?
Caiu como uma bomba no setor vitivinícola, embora não tenha sido totalmente inesperado, o adiamento da maior feira do mundo neste mercado – a ProWein, de Dusseldorf, Alemanha. Já tinham sido adiadas ou canceladas outras feiras, como as Vinexpo de Hong Kong e Xangai, mas nesta fase aguarda-se que seja marcada uma nova data para a ProWein: o que não será fácil porque o calendário de feiras é muito apertado, ao longo do ano.
Ana Isabel Alves, secretária-geral da ACIBEV (Associação de Vinhos e Espirituosas de Portugal), diz ao Observador que não existem números concretos, para já, mas do contacto que a associação tem com as empresas percebe-se que “a curto prazo já está a ter impacto ao nível do enoturismo, essencialmente empresas que reportaram cancelamentos de turistas vindos da Ásia”.
Neste momento, “está toda a gente a aguardar que esta crise não demore muito a passar”, diz Ana Isabel Alves. “O mercado chinês estagnou desde o final do ano passado, o primeiro trimestre foi muito difícil”, diz a secretária-geral da ACIBEV, explicando que os EUA são o principal mercado das exportadoras vinícolas nacionais, mas a China também é relativamente importante”. “Uma empresa portuguesa ia destacar uma pessoa para ir para lá, um ‘export manager’, um delegado, mas há um mês que está à espera de ir para lá”, conta.
As exportações dos Vinhos do Alentejo para a China “já mostram algum abrandamento”, disse o presidente da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA). A China é um dos principais mercados externos da região. Francisco Mateus teme que o novo coronavírus possa significar, para o setor do vinho mundial, “uma baixa generalizada de vendas”.
Embora descarte a hipótese de o Covid-19 significar “alguma hecatombe para o setor do vinho”, Francisco Mateus afirma que “esta crise de saúde que começou na China e se tem vindo a alargar a mais países” possa “ser uma coisa de nível mundial” e “o Alentejo não vai ter certamente a sorte de passar ao lado disso”. De acordo com dados de 2019 da CVRA, a China é o 5.º país para onde os vinhos da região são mais exportados (o ‘ranking’ é liderado pelo Brasil, seguindo-se Estados Unidos, Angola e Polónia).
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“Vamos ver depois do verão ou até ao verão. Aparentemente o vírus não se dá bem com temperaturas mais elevadas” e, na China, “parece haver alguma menor intensidade do vírus”, pelo que é preciso “esperar” e “observar”, defendeu o presidente da CVRA.
É expectável que os impactos do Covid-19 na economia abrandem durante o verão?
Não é certo (até porque ainda se conhece pouco sobre o Covid-19) que a aproximação da primavera e do verão — e, consequentemente, das temperaturas mais elevadas — possa atenuar a propagação do novo coronavírus. Segundo explicaram especialistas em infecciologia ao Observador, o calor pode diminuir a capacidade de o Covid-19 sobreviver e, assim, alastrar-se.
O novo coronavírus é “uma incógnita”, e não se sabe como vai reagir com a entrada da primavera, disse ao Observador Ricardo Parreira, professor do Instituto de Higiene e Medicina Tropical. Já segundo a infecciologista Ana Horta o Covid-19 tem uma espécie de capa que o torna sensível a alterações de temperatura e a ambientes mais secos. Mas, apesar de parecer mais resistente que outros vírus, é “pouco estável” e sensível a temperaturas mais altas e atmosferas menos húmidas. Por isso, pode reagir mal às temperaturas de verão. Jaime Nina, médico no Hospital Egas Moniz e professor no Instituto de Higiene e Medicina Tropical, sublinha, no entanto, que “ainda não se sabe se o novo coronavírus é sazonal”.
Chegada da primavera pode (mas sem certezas) atenuar surto de coronavírus
Já esta sexta-feira, Mike Ryan, médico da Organização Mundial de Saúde disse, em conferência de imprensa, que “é uma falsa esperança” que o novo coronavírus desapareça no verão à semelhança da gripe.
O que dizem os responsáveis sobre o impacto atual e futuro?
Na economia portuguesa, o impacto do Covid-19 está a ser “moderado”, segundo o ministro da Economia, Pedro Siza Vieira. Numa entrevista ao Público e à Rádio Renascença, Siza Vieira assegurou, porém, que o Governo tem uma “artilharia preparada” para apoiar as empresas em caso de necessidade. Os setores mais afetados são os transportes, viagens e hotelaria, referiu Siza Vieira, com um “ritmo muito acelerado de cancelamento de reservas” e o “ritmo das novas reservas” a cair “bastante”.
No debate quinzenal de quarta-feira, o primeiro-ministro, António Costa, já tinha anunciado medidas para minimizar o impacto do novo coronavírus: uma linha de crédito de 100 milhões de euros para as empresas afetadas e baixas pagas a 100% para os trabalhadores, do público e do privado, que tenham de se manter em isolamento.
O ministro Siza Vieira mostra preocupação com os impactos, sobretudo no setor do turismo durante a Páscoa. “É uma época muito importante na atividade turística, tem impacto significativo no crescimento da nossa economia e esta é uma grande incerteza”. As perspetivas do setor para este ano eram “muito fortes”.
Olhando para a frente, Mário Centeno, ministro das Finanças, considerou na quarta-feira que “ainda é cedo para fazer contas” ao impacto na economia portuguesa relacionado do Covid-19. O também presidente do Eurogrupo garante que Portugal não hesitará em definir políticas se tal for necessário. E está o excedente orçamental de 0,2% previsto para este ano em causa? “Não é uma preocupação neste momento do ministro das Finanças nem do Governo, nós estamos certos que temos os meios para responder”.
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Mário Centeno sublinhou que a economia portuguesa “teve um comportamento muito superior ao da área do euro no final de 2019” e que esse ritmo “manteve-se ao longo dos primeiros dois meses do ano”, com a receita fiscal e da Segurança Social a manterem “taxas de crescimento robustas”.
Há risco de nova recessão mundial?
O Fundo Monetário Internacional (FMI) não fala em recessão. Numa conferência de imprensa na quarta-feira, a instituição liderada por Kristalina Georgieva previu que o crescimento económico em 2020 fique “abaixo dos níveis de anos anteriores”, mas não arriscou números. “Em quanto [esse crescimento] vai desacelerar, ou durante quanto tempo, será difícil de prever. Vai depender da epidemia e da eficácia das nossas ações”, disse Kristalina Georgieva.
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Nas contas do FMI, a economia chinesa, a segunda maior no planeta, representa 19% do PIB mundial, comparado com os 8% na altura da SARS em 2002 e 2003, recordou a diretora-geral do FMI, a 13 de fevereiro, numa outra conferência de imprensa (têm sido várias ao longo das últimas semanas). E agora está muito mais integrada com a Ásia e o resto do mundo, o que aumenta a probabilidade de qualquer tipo de disrupção “ter um impacto em cascata noutros países”, alertou.
Três dias depois destas declarações, o FMI admitiu e quantificou pela primeira vez o impacto do coronavírus na economia mundial. “Por enquanto, a nossa previsão é de 3,3% e pode haver uma redução de 0,1 ou 0,2 pontos percentuais”, disse Kristalina Georgieva durante uma intervenção no Fórum Global das Mulheres, no Dubai. “Este é um caso especial e peço a todos que não tirem conclusões precipitadas”, acrescentou a responsável. “Há muita incerteza e estes são cenários, não são projeções” do FMI, sublinhou.
As declarações de Kristalina Georgieva já levaram, aliás, os mercados a reagir violentamente. A 22 de fevereiro, a diretora-geral do FMI avançou que o surto com origem na China põe em risco a recuperação económica mundial – posição que coincidiu com o agravamento da situação em Itália.
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Nesta fase, “com o vírus a afetar a China e a Ásia, primeiro, e agora a Europa e os EUA, algumas economias – mas não todas – podem entrar em recessão”, comentou a casa de investimento Fidelity numa nota de análise difundida esta quinta-feira. Começa a falar-se numa recuperação gradual mas total da economia chinesa, embora “as economias na Europa, como a italiana”, estejam “mais vulneráveis”.
Vários países europeus já estavam a registar taxas de crescimento pouco animadoras e os modestos sinais de recuperação que se registaram no início do ano poderão, com esta crise do coronavírus, ter-se esfumado. Poderá ser o caso, diz a Fidelity, da maior economia europeia – a alemã.
Por outro lado, “embora se antecipe que o Banco Central Europeu responda a quaisquer alterações nas perspetivas de inflação, é uma evidência que [Christine Lagarde] tem menos munições monetárias [do que a Reserva Federal dos EUA, por exemplo] para mitigar uma quebra económica”. Além disso, esta crise poderá demonstrar como as “diferenças políticas que existem entre os países” podem atrasar o combate à crise, designadamente através de programas de estímulo e de autorizações para excluir estes gastos nas metas de endividamento público.
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