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3.º Encontro Nacional de Autarcas Social Democratas (ASD): com o tema “Autarquias. Que futuro?”, a cargo do presidente do PSD, Luís Montenegro, e de Hélder Sousa Silva, presidente desta estrutura autónoma do PSD. Carlos Moedas, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, com Luís Montenegro. 20 de Maio de 2023 Epic Sana Hotel, Lisboa TOMÁS SILVA/OBSERVADOR
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TOMAS SILVA/OBSERVADOR

TOMAS SILVA/OBSERVADOR

Ultrapassada a “prova” da JMJ, Moedas mantém tabu sobre futuro político

Em entrevista ao Observador, Moedas assume que JMJ foram desafio pessoal, deixa resposta a críticos e mantém tabu sobre eventual recandidatura à autarquia. Liderança do PSD dependerá de muitos fatores

“Durmo todos os dias como um bebé: acordo de hora a hora e choro.” Um dia antes do arranque da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), o maior evento alguma vez recebido em Portugal, era desta forma que Carlos Moedas resumia o seu estado de espírito. O humor mascarava a óbvia apreensão, mas poucos, mesmo entre os mais próximos do autarca, tinham dúvidas: se corresse mal, e havia muito por onde correr mal, o mandato de Moedas, longe de estar imaculado, ficaria irremediavelmente manchado. Uma semana depois, e apesar de todos os balanços que falta fazer – a relação custo-benefício do evento ou a prometida requalificação da cidade, por exemplo –, é difícil dizer que Lisboa tenha falhado na organização da JMJ. Por arrasto, é difícil dizer que Moedas não tenha estado à altura do desafio. Pelo contrário.

O que fazer com o capital político que ganhou depois desta semana é a pergunta que se vai fazendo – no PSD e na Câmara Municipal de Lisboa. No PSD/Lisboa, a convicção que existe é a de que, se Moedas quiser, tem a reeleição garantida depois desta JMJ. Mesmo que a candidata do outro lado seja Marta Temido, que os sociais-democratas não subestimam ou desprezam, a expectativa que existe é a de que, superada uma prova que muito diziam ser impossível de superar, a afirmação política de Moedas em Lisba está mais do que garantida. Mas podem surgir outros desafios no horizonte.

Carlos Moedas é há muito apontado como a grande reserva do partido caso Luís Montenegro falhe a sua missão — e caso Pedro Passos Coelho continue a querer manter-se afastado destas contendas. Aliás, muito antes da disputa entre o atual líder social-democrata e Jorge Moreira da Silva houve quem tentasse convencer o presidente da Câmara Municipal de Lisboa a entrar na corrida. Ângelo Pereira, líder da muito influente distrital do PSD/Lisboa e vereador de Moedas, por exemplo, não deixou espaço para dúvidas: “O PSD precisa de novos tempos”.

O autarca resistiu ao canto da sereia e não entrou na corrida à liderança do partido, mantendo-se equidistante nessa disputa. Terminada a JMJ, as conversas sobre o futuro de Moedas voltaram a ganhar força. Em entrevista ao Observador, no programa “Explicador”, o presidente da Câmara de Lisboa manteve o tabu sobre uma eventual recandidatura à autarquia. “Não quero ser o tipo de político que a meio do mandato já está está a pensar o que é que vai fazer no futuro, se se vai recandidatar… Não estamos na altura, não vou falar nada sobre isso”, começou por dizer.

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Perante a insistência, Moedas voltou a atirar para canto. “Estou apaixonado por ser presidente da Câmara de Lisboa. Adoro ser presidente da Câmara, adoro resolver os problemas às pessoas no imediato, tratar com as pessoas na rua… É isso que quero ser e quero fazer o mandato”, insistiu o autarca, sem nunca se comprometer com qualquer cenário e, ao mesmo tempo, sem deixar de puxar (também) para si os louros da organização. “Houve uma prova que era: a Câmara consegue ou não, Carlos Moedas consegue ou não, em ano e meio pôr isto de pé. Foi um desafio pessoal que, mais uma vez, mostra aquilo que gosto de ter na vida: resultados, fazer coisas, falar menos e fazer mais”.

"Não vou divagar sobre o que é que é o futuro. Luís Montenegro está a fazer um grande trabalho e tem toda a minha ajuda e colaboração para continuar o caminho que está a fazer, que é um caminho de liderança, um caminho bom"
Carlos Moedas ao Observador

Um calendário (quase) impossível

Ora, só existe, realisticamente, um cenário em que Carlos Moedas poderia fazer frente a Luís Montenegro: o de uma derrota nas próximas eleições europeias, agendadas para junho de 2024. Mas isso colocaria sempre um desafio enorme ao presidente da Câmara Municipal de Lisboa: decidir o que fazer em relação ao seu futuro autárquico. Qualquer candidatura à liderança do partido teria de ficar fechada no segundo semestre de 2024; as eleições autárquicas acontecem sensivelmente um ano depois, em 2025, sendo que as legislativas acontecem em 2026.

Politicamente, seria muito difícil — para não dizer impossível — gerir os três objetivos. Não seria razoável esperar que os eleitores de Lisboa revalidassem a confiança num candidato que, dali a um ano, estivesse a lutar pelo cargo de primeiro-ministro. A alternativa mais séria – deixar a Câmara de Lisboa no final do primeiro mandato para se dedicar ao PSD e às eleições legislativas – seria sempre uma aposta de alto risco, até porque se arriscava a perder ambas.

Não que fosse um passo excecional na política portuguesa. Em fevereiro de 2022, quando a corrida à liderança do PSD estava ainda indefinida, o Observador fazia eco dos argumentos daqueles que queriam empurrar Moedas para a liderança do partido, lembrando o precedente simpático de Jorge Sampaio, que era líder do PS quando decidiu ser candidato a Lisboa (um movimento arrojado, que surpreendeu o próprio partido) e que de lá saiu para a Presidência da República.

Depois dele, António Costa deixou a autarquia nas mãos de Medina para se candidatar a líder do PS e a primeiro-ministro, ainda que já estivesse em fim de ciclo na capital por limitação de mandatos. Em Madrid, Isabel Ayuso, presidente da Comunidade de Madrid, estrela da direita espanhola e uma figura muito admirada por Moedas, ainda ensaiou esse movimento, mas o PP, por entre muitas disputas internas, virou noutra direção – agora que Alberto Feijóo teve uma vitória agridoce, Ayuso voltou a ser apontada com insistência à liderança do PP.

Na altura, estes argumentos não convenceram Moedas e, a menos que algo de muito radical aconteça, não é de esperar que o autarca venha a mudar de posição. Mesmo que a pressão interna venha a ser muito maior. Em boa verdade, muito dependerá do resultado de Montenegro nas europeias e do que pode acontecer a partir daí. Uma vitória do PSD nessas eleições arrumará a questão, o líder do PSD torna-se dono e senhor do seu destino e candidato mais do que legitimado a primeiro-ministro.

Uma derrota, por outro lado, pode deixar tudo em aberto. Sempre dependendo dos números, claro está. A partir daí, é ver quem entra na roda – e todos no partido sabem que se Pedro Passos Coelho decidir entrar a margem de manobra para todos os outros torna-se muito reduzida. Os dois – Moedas e Montenegro – não são indiferentes aos cálculos que se vão fazendo no PSD. Se Moedas vai mantendo o tabu sobre o seu futuro, o que permite um manancial de leituras políticas, Montenegro vai gerindo as sombras com uma certeza: se dobrar o cabo das europeias, não há ninguém em condições políticas de se colocar entre ele e as legislativas de 2026.

Ainda em maio de 2022, em plena campanha interna, Montenegro dizia isso mesmo ao Observador. “Isso [a oposição interna] não me preocupa nada. Sei que existe isso tudo, ando aqui há muitos anos, já vi isso sob as mais variadas formas. Mas há uma coisa que tenho a certeza: se fizer bem as coisas, daqui a dois anos esse problema não existe; se fizer mal as coisas, daqui a dois anos esse problema existe. Só depende de mim, da equipa que está comigo e dos nossos desempenhos”, despachava.

Curiosamente, mais de meio ano depois, em janeiro de 2023, e quando estava a tentar lidar com os primeiros estilhaços do caso Pinto Moreira, Montenegro aproveitava uma entrevista à SIC para tentar agarrar Moedas à Câmara de Lisboa. “Carlos Moedas? Temos uma relação muito boa. Quando acabar este mandato de dois anos, disputarei eleições com quiser avançar. Não tenho nenhum temor de disputar eleições. Já ganhei e perdi muitas vezes. Tenho a expectativa de que vai continuar a ser um excelente presidente da Câmara de Lisboa e que vai dar uma maioria absoluta ao PSD em 2025. Se houver alguma alteração, ela terá de ser gerida na altura”, sublinhou então o líder social-democrata.

Moedas, que estava (e está) com dificuldades para lidar com a sua própria oposição — não interna, mas a do PS –, ganhou margem para reclamar uma vitória política única e está agora, ainda na euforia desta JMJ, a recolher os louros do que conseguiu. No futuro, logo se vê o peso da fatura e que outros voos permitirão. “As pessoas na política estão sempre a pensar no futuro; eu estou a pensar no presente. Não vou divagar sobre o que é que é o futuro. Luís Montenegro está a fazer um grande trabalho e tem toda a minha ajuda e colaboração para continuar o caminho que está a fazer, que é um caminho de liderança, um caminho bom“, rematou em entrevista ao Observador. Moedas aguarda para ver.

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