895kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Vasco Cardoso: O Bloco "arrumou as pantufas" na discussão do Orçamento

Vasco Cardoso afasta a ideia de um secretário-geral adjunto e diz que Jerónimo será eleito para quatro anos: "Não será um SG a prazo". Em entrevista, acusa BE de ter fugido dos problemas.

Jerónimo de Sousa está “em perfeitas condições para continuar” e o Comité Central não vai eleger um secretário-geral “a prazo”. Ou seja, Jerónimo, se for eleito esta noite como tudo indica que será, não vai ser eleito a pensar numa substituição a meio do mandato. Quem o diz é Vasco Cardoso, membro da comissão política do Comité Central, que garante em entrevista à Rádio Observador, que criar a figura de secretário-geral adjunto “não é o que a direção do PCP está a pensar”. Tal só aconteceu com Álvaro Cunhal porque, “naturalmente, não era fácil encontrar-se uma solução” para o substituir. João Ferreira, de resto, já tinha garantido aos microfones do Observador que o cargo que muitos lhe apontam “não vai acontecer”.

Membro da direção do PCP e presença constante nas reuniões com o Governo sobre os vários orçamentos que o PCP já viabilizou, Vasco Cardoso não se retrai quando é altura de dizer que o Bloco de Esquerda optou por “arrumar as pantufas” logo na discussão na generalidade. O PCP, pelo contrário, “foi à luta até ao fim”. O facto de o PCP aparecer neste congresso com mais um orçamento do PS debaixo do braço não é, para a direção comunista, uma “contradição”. É ser oposição nos aspetos negativos, e ser força de influência para os avanços positivos.

Ainda assim, Vasco Cardoso admite que possa não ser fácil explicar esta “realidade complexa” aos militantes. Para as autárquicas, ambição máxima. E para o futuro, não descarta que o PCP continue o diálogo com a esquerda. Mas uma coisa é certa: não existe só uma alternativa de direita (com o Chega) e uma alternativa de esquerda (com um governo minoritário do PS). O PCP também se quer apresentar como alternativa. Com cada vez mais influência junto do PS.

“Jerónimo de Sousa não será um secretário-geral a prazo”

Esta tarde o Comité Central vai ser eleito e vai escolher o secretário-geral. Jerónimo de Sousa tem agora 73 anos e tudo indica que vai ser eleito para mais um mandato. Vão ser mesmo mais quatro anos?
O secretário-geral disse sempre que este não seria um problema que se iria colocar ao Congresso e não vai ter. Tem todas as condições para continuar a desempenhar estas funções, pela sua capacidade de mobilização, de envolvimento do partido, por aquilo que representa. Pela forma como tem desempenhado essas funções. Naturalmente tem 73 anos, mas encontra-se em perfeitas condições para continuar a assumir essas tarefas.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Faz sentido dividir o próximo mandato em dois ciclos? Um até às autárquicas, passando pelas presidenciais, e outro depois das autárquicas?
Não estamos a pensar eleger um secretário-geral a prazo. Jerónimo de Sousa tem neste momento condições perfeitas para continuar a desempenhar as funções que tem desempenhado. Quer dentro do partido quer em termos de projeção pública é alguém com quem muita gente se identifica, mesmo não sendo do PCP. Portanto, não vamos tomar essa decisão a prazo.

Pergunto isto porque na altura da saída de Álvaro Cunhal, também aqui em Loures, o Comité Central inovou na preparação da transição e criou a figura de secretário-geral adjunto. Justificou-se nessa altura porque Álvaro Cunhal era insubstituível e não se justifica agora? Ou pode vir a ser criada essa figura transitória?
Não creio que as coisas avancem nessa direção. A figura de secretário-geral adjunto foi criada num contexto muito concreto. Tratava-se de ir preparando quer o partido, quer o próprio quadro, para uma substituição que nunca seria fácil. Álvaro Cunhal é uma grande referência do Partido Comunista Português, do movimento comunista internacional, é talvez o principal construtor do partido, tinha feito todo um percurso quer na clandestinidade quer na revolução de abril e nos anos que se seguiram. Naturalmente não era fácil encontrar-se uma solução. Isso corresponde a uma época histórica e um contexto determinado, não estamos a pensar envolver uma dinâmica dessa natureza para o secretário-geral. Vamos eleger um secretário-geral para o presente e para o futuro, com perfeitas condições. Não será um secretário-geral a prazo.

Jerónimo de Sousa "naturalmente tem 73 anos, mas encontra-se em perfeitas condições para continuar a assumir essas tarefas" de secretário-geral

Excluindo a opção de criar a figura de secretário-geral adjunto neste congresso, fica totalmente excluída a hipótese ou pode vir a ser tomada a meio do mandato?
É evidente que se pode fazer todo o tipo de futurologia, mas posso-lhe assegurar que não é isso que está a ser pensado do ponto de vista da direção do PCP.

E o que é a direção do PCP pensa para o futuro, para lá dos próximos quatro anos?
Isso é uma discussão que nem sequer está colocada neste momento. Quando se pondera as soluções de direção, são sempre soluções de direção coletiva (à exceção do secretário-geral). Falo da eleição do comité central, da proposta que se vai discutir hoje a noite quanto à composição dos organismos executivos, e quando tomamos essas decisões estamos a pensar em soluções que possam assegurar as respostas necessárias para a intervenção do partido entre congressos — não estamos a fazer nenhuma antecipação de uma situação que neste momento não se coloca.

BE “arrumou as pantufas” na discussão do Orçamento do Estado

O PCP chega a este congresso depois de ter viabilizado o quinto orçamento ao PS. Está confortável nesta posição de quase parceiro único do Governo? Sem o voto do PCP o Governo não tinha conseguido aprovar orçamento nenhum.
Não se trata de uma situação de desconforto ou de conforto, não estamos a falar de estados de alma. Estamos perante uma realidade em que o governo do PS não dá uma resposta cabal às necessidades do país. Quando avançamos para a discussão deste orçamento as insuficiências eram muitas, muitas mesmo. O Governo toma a opção de, em vez de responder às necessidades do país, submeter essas mesmas necessidades a uma determinada trajetória de evolução do défice das contas públicas, e simultaneamente não rompe com interesses relacionados com os grupos económicos e financeiros. Essa constatação não nos impediu, contudo, de examinar o orçamento no concreto e procurar encontrar soluções para o país. Esse percurso foi feito desde o dia 12 de outubro e a quinta-feira passada, data da votação final do orçamento.

Foi um processo longo.
Longo e até ao fim. Em que, à medida que os dias foram avançando nós apresentamos mais de 300 propostas. A evolução da situação nacional, com os problemas que já tem e o impacto da epidemia, não permitia uma resposta limitada a três ou quatro ideias, três ou quatro propostas. Fizemos o exercício de cobrir praticamente todas as áreas da vida nacional e foi possível, num quadro de grande persistência e determinação do PCP, encontrar soluções que dão instrumentos ao governo, por via do orçamento que foi aprovado, para responder a problemas do país. Eu destacaria o aumento das pensões que, ao contrário do que o governo pretendia, vai ser a partir de 1 de janeiro (sendo que quer PS quer PSD chumbaram a possibilidade de esse aumento se estender para lá das pensões de 658 euros); destacaria o conjunto dos investimentos no SNS, onde o governo não tem desculpa para não executar esses investimentos travando o que tem sido um saque dos grupos económicos ao SNS; foi também possível encontrar respostas ao nível dos apoios e suplementos relativamente às profissões mais expostas ao vírus; a suspensão do pagamento por conta; respostas para o setor artístico e cultural; respostas para as micro, pequenas e médias empresas…

São muitas as medidas que o PCP conseguiu aprovar. Ficou satisfeito com este Orçamento?
Não diria satisfeito, porque apresentamos 300 propostas e devemos ter para aí umas 50 aprovadas, e se apresentamos 300 é porque achávamos que as outras também faziam falta. Mas valeu a pena o esforço, a intervenção e a determinação do PCP em ir até ao fim, não prescindindo dessa batalha. Podíamos ter arrumado as pantufas logo na votação na generalidade.

O Bloco de Esquerda arrumou as pantufas?
Sim, logo. Nós não tomamos essa opção, fomos à luta, como se costuma dizer. E o resultado é um resultado que, em alguns casos vai ter impacto imediato na vida das pessoas logo em janeiro, e noutros prevê disposições que permitem ao governo responder em áreas fundamentais: saúde, direitos dos trabalhadores, defender as micro, pequenas e médias empresas e, ao mesmo tempo, reafirmamos a nossa exigência porque há medidas que, fora do orçamento, precisam de ser adotadas.

"Valeu a pena o esforço, a intervenção e a determinação do PCP em ir até ao fim, não prescindindo dessa batalha [do Orçamento]. Podíamos ter arrumado as pantufas logo na votação na generalidade"

Isso não é querer o melhor dos dois mundos? Estar dentro mas dizer-se que se está fora. Ouvimos aqui ontem Jerónimo de Sousa dizer que o PCP é oposição, que nunca fez parte de maioria nenhuma, mas que quer continuar a influenciar o governo. Isto não é uma contradição?
Nós não vemos a vida a preto e branco. Ao contrário de muitas caricaturas que fazem do PCP, temos uma visão da realidade muito dialética e procuramos abordar essa realidade pelos vários ângulos. O Jerónimo de Sousa não disse apenas que era uma força de oposição, disse que era força de oposição a tudo o que é negativo e a tudo o que venha a ser contrário aos interesses nacionais (como situações do Novo Banco, alterações à legislação laboral em prejuízo dos trabalhadores) e combateremos todas essas medidas, mas simultaneamente o PCP é força determinante e insubstituível para os avanços.

Mas é um equilíbrio que tem de ser feito. É fácil explicar isso aos militantes?
Mas ninguém pergunta ao PSD se é uma força de apoio ao governo quando aprova com eles as alterações à legislação laboral ou que suporta decisões do Banif ou Novo Banco.

Não é o PSD que no fim do dia viabiliza o Orçamento.
A situação que se vive é uma situação complexa. O governo do PS não dá resposta aos problemas nacionais. A intervenção do PCP é decisiva para impedir tudo o que seja negativo e para fazer avançar aspetos positivos para os portugueses.

Mas perguntava-lhe se é fácil explicar isso aos militantes. Na intervenção que fez ontem chegou a falar de naturais interrogações. Há dúvidas sobre isto dentro do PCP?
Há aspetos que, precisamente por essa realidade ser complexa, levantam interrogações. O que se tem verificado ao longo dos últimos anos é que o que se avançou do ponto de vista de reposição de direitos, e até de algumas conquistas novas — os passes sociais, os manuais gratuitos —, são avanços novos. E todos eles têm a marca do PCP. Ao mesmo tempo, é uma situação em que se procura limitar e impedir aspetos que sejam negativos para o nosso povo e é aí que temos de intervir. Não há contradição, a situação é complexa, envolve uma avaliação que não é feita a preto e branco. O PCP não fez parte de uma maioria entre 2015 e 2019, como não faz parte agora. Decidimos em cada momento em função daquilo que é melhor para o nosso povo.

Nas últimas autárquicas o PCP foi, de certa forma, prejudicado nas urnas. A geringonça era muito recente a associou-se a ideia de que essa aliança prejudicou o PCP nas urnas. Isso não corre o risco de voltar a acontecer?
As eleições autárquicas têm muitas vezes elementos de natureza local. Tivemos vários municípios onde até reforçámos maiorias absolutas ou maiorias relativas passaram a absolutas.

PCP é oposição e, ao mesmo tempo, apoio do Governo? "Não há contradição, a situação é complexa, envolve uma avaliação que não é feita a preto e branco. O PCP não fez parte de uma maioria entre 2015 e 2019, como não faz parte agora. Decidimos em cada momento em função daquilo que é melhor para o nosso povo."

Mas perderam câmaras históricas do PCP.
Perdemos e isso foi negativo, desde logo para as populações. Estamos muito empenhados em poder recuperar algumas. Aquilo que sentimos das populações é que o que aconteceu em Setúbal, no Barreiro, em Évora, onde perdemos as maiorias, foi mau. Mas com o evoluir da vida e a identificação de que o projeto da CDU faz falta às populações, acabámos por recuperar algumas autarquias. E é nessa dimensão que estamos a trabalhar.

Há pouco ouvíamos Armindo Miranda fazer aqui uma espécie de guião do que o PCP deve fazer para as autárquicas e dizia que tem de se começar a trabalhar já em janeiro. Qual é a meta do PCP para as autárquicas?
É difícil estabelecer uma meta eleitoral. Há objetivos que já estabelecemos: vamos concorrer a todos os municípios do país e, provavelmente, ao maior número de freguesias possível. Temos a ideia de poder consolidar maiorias e recuperar outras que perdemos e, em alguns casos até, avançar por concelhos onde até hoje nunca tivemos responsabilidades. Não estamos limitados, à partida, na concretização de nenhum desses objetivos. Se há característica que também marca o PCP é essa presença no poder local, distintiva e em alguns casos decorrente de uma influência que do ponto de vista local é muito superior à que se regista do ponto de vista nacional. Estamos com confiança relativamente às eleições autárquicas.

O Chega “leva-nos para 24 de abril e não é para aí que queremos caminhar”

Voltando ao orçamento, com o BE a ficar de fora desta vez o PCP duplicou, digamos assim, o poder negocial…
Não sentimos isso.

Passou a ser o parceiro único do Governo, que ficou dependente se o PCP viabilizava ou não o Orçamento.
Nós nunca usamos a expressão negociação e não é por acaso. Não se trata de uma negociação e falo por experiência própria. O exame tem sido um pouco este: colocamos as nossas ideias, as nossas propostas, considerações. A negociação envolve a ideia que se dá e se recebe e há a troca de alguma coisa. Não temos esse registo e esse perfil do ponto de vista de posicionamento perante o Governo. O Governo conhece as posições do PCP, e as distâncias em relação a matérias estruturantes da vida nacional são muito diferentes, mas ao mesmo tempo também conhece a seriedade, a nossa capacidade de trabalho e a nossa determinação e é isso que tem produzido resultados.

Com o que se passou nos Açores, a criar-se uma maioria de direita com o apoio parlamentar do Chega, a esquerda está condenada a ficar junta para não se repetir uma solução deste género?
Não temos uma conceção quanto à estratégia do partido na vida nacional que se limite à eternização do PS com as suas políticas no poder. Se há elemento que queremos destacar a partir deste congresso é a política alternativa de rutura com o que se conhece, e essa rutura envolve múltiplas dimensões que nenhuma dessas soluções que falou responde. Nenhuma responde ao desenvolvimento nacional, a uma conceção que temos que a vida do país melhora quando melhoram os direitos e salários dos trabalhadores. O que lhe estou a colocar é um projeto alternativo que se demarca e confronta com soluções como essas, ou como a própria governação do Partido Socialista. Pensamos que aí é que está a alternativa.

"Estamos com confiança relativamente às eleições autárquicas"

Um partido como o Chega não devia ter sido legalizado no Tribunal Constitucional?
Essa questão não é uma questão. O Tribunal Constitucional decidiu como decidiu. O que creio que é marcante relativamente a essa força política é o caráter demagógico e reacionário. Demagógico porque finge ser o que não é e reacionário porque os valores e objetivos que transporta consigo levam-nos para 24 de abril. E não é para aí que queremos caminhar.

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.