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Simbolo da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) da sede em Lisboa, 7 de fevereiro de 2012. MIGUEL A. LOPES/LUSA
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ERC é chamada pela Autoridade da Concorrência quando há concentrações nos media. Mas operação da Global Media não chegou à Concorrência

MIGUEL A. LOPES/LUSA

ERC é chamada pela Autoridade da Concorrência quando há concentrações nos media. Mas operação da Global Media não chegou à Concorrência

MIGUEL A. LOPES/LUSA

Venda da Global Media a fundo das Bahamas foi desenhada para escapar a controlo prévio dos reguladores

Venda da Global a fundo foi ajustada para não ter de ser comunicada à Autoridade da Concorrência. Saída de revistas evitou ainda o escrutínio prévio e vinculativo do regulador da comunicação social.

A venda de uma participação maioritária da empresa que controla a Global Media escapou ao controlo prévio dos reguladores. A operação realizada entre Marco Galinha e o Word Opportunity Fund em setembro passado não foi notificada à Autoridade da Concorrência (AdC), o que permitiu evitar também o escrutínio da ERC (Entidade Reguladora da Comunicação).

A ERC é chamada a pronunciar-se sobre as operações de concentração no setor da comunicação social pela AdC e o seu parecer tem natureza vinculativa. Em resposta ao Observador, o regulador da comunicação diz que “sempre que emite um parecer sobre uma operação de concentração identifica todos os proprietários diretos e indiretos (percentagem de capital social e percentagem de direitos de voto) independentemente do peso da participação. Esta ação enquadra-se na responsabilidade confiada à ERC de assegurar a não concentração da titularidade dos meios de comunicação social”.

Na operação da Global Media, a ERC não teve essa oportunidade antes do negócio feito e só mais tarde abriu um procedimento para identificar quem está por trás do novo acionista da Global Media depois de várias diligências frustradas para conseguir informação sobre os beneficiários últimos do Fundo que tem sede nas Bahamas.

A finta às entidades reguladoras é uma consequência da forma como a operação foi desenhada para contornar a obrigação de notificar a Autoridade da Concorrência (AdC). Fonte oficial da AdC confirma aliás ao Observador ter sido informada pelo comprador de que houve uma alteração face ao perímetro inicial de ativos, o que fez com que a operação deixasse de ter ser notificada.

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Os dois protagonistas do negócio, Marco Galinha e o representante do fundo, José Paulo Fafe, confirmam o objetivo de evitar a Concorrência — sem referir o papel da ERC na avaliação da concentração — mas atiram na direção um do outro a responsabilidade.

As peças fundamentais para conseguir o resultado foram duas (ou três) revistas do grupo Global Media que, apesar de serem pouco relevantes em termos de receita, têm um peso relativo grande (ou mesmo de domínio) nos segmentos de mercado onde atuam. Um dos critérios previstos na lei para determinar que se trata de uma concentração é se “em consequência da sua realização se adquira, crie ou reforce uma quota igual ou superior a 50% no mercado nacional de determinado bem ou serviço, ou numa parte substancial deste”.

Protagonistas assumem que tiraram revistas para facilitar aprovação do negócio

Essa foi a razão que levou à retirada das revistas Volta ao Mundo e Evasões do universo da Global Media com a finalidade de facilitar e/ou acelerar o negócio. Mas enquanto o presidente da comissão executiva da Global Media, José Paulo Fafe, disse aos deputados da comissão de cultura e comunicação que foi a pedido de Marco Galinha que as publicações saltaram da operação, o presidente do grupo Bel tem versão oposta.

Em respostas por escrito ao Observador, Marco Galinha começa por assinalar que a notificação de uma operação de aquisição do controlo ou de parte de uma empresa é da “responsabilidade exclusiva do comprador” e sublinha que “eventuais limitações ou restrições impostas pela AdC afetam o comprador (WOF) e não os vendedores”. Logo, a “não inclusão na operação das revistas Evasões e Volta ao Mundo foi solicitada pelo comprador (WOF) para não atrasar a conclusão da aquisição da participação maioritária do comprador no capital da Global Media”.

Esta reação ao Observador surge em resposta às declarações do presidente executivo da Global Media. O único rosto conhecido do fundo em Portugal afirmou, no Parlamento, que as revistas Volta ao Mundo e Evasões “transitaram, a pedido de Marco Galinha, para a Páginas Civilizadas na altura em que teve de sujeitar a operação de compra da Páginas Civilizadas à Autoridade da Concorrência”.

O presidente da Comissão Executiva do Global Media Group (GMG), José Paulo Fafe, durante a sua audição na Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, sobre o GMG, na Assembleia da República, em Lisboa, 09 de janeiro de 2024. ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA
"Os advogados de Março Galinha ou quem aconselhava o Marco Galinha pediram-nos a anuência para facilitar a aprovação na Autoridade da Concorrência que aceitássemos a transferência da titularidade dessas duas revistas, embora a produção delas continuasse na órbita do Global Media Group".
José Paulo Fafe, presidente da comissão executiva da Global Media

Segundo José Paulo Fafe, essa transição aconteceu “por uma questão que se prendia com a percentagem de monopólio destes dois títulos no mercado das viagens. Os advogados de Marco Galinha ou quem aconselhava o Marco Galinha pediram-nos a anuência para facilitar a aprovação na Autoridade da Concorrência, que aceitássemos a transferência da titularidade dessas duas revistas, embora a produção delas continuasse na órbita da Global Media Group”.

José Paulo Fafe foi nomeado para a Global Media Group pelo(s) novo(s) acionista(s) mistério(s) — e que o próprio afirma desconhecer — e tem atacado publicamente a antiga gestão, liderada por Marco Galinha, pela situação financeira que se vive na empresa proprietária de títulos históricos dos media portugueses, como a TSF, o Jornal de Notícias e o DN.

O dono do grupo Bel, Marco Galinha, reforça que existia uma preocupação da urgência por trás desta operação. “Considerando o calendário apertado da operação e a necessária entrada do comprador (WOF) no capital da Global Media Group para a aportação dos fundos necessários (que, entretanto, não se verificou), foi proposto pelos assessores jurídicos do comprador (WOF) aos assessores jurídicos dos vendedores a retirada das revistas Evasões e Volta ao Mundo do perímetro da operação, de molde a que a operação não suscitasse quaisquer questões jus-concorrenciais.”

Mais. Marco Galinha diz que os seus assessores jurídicos foram informados por parte dos assessores jurídicos do fundo de que a Autoridade da Concorrência tinha sido “informalmente posta a par desta circunstância”. E garante que “os vendedores —, neste caso o dono do grupo Bel — “não têm, nem nunca tiveram, quaisquer pretensões de evitar a notificação ou avaliação da operação por parte da AdC, da ERC ou de qualquer outra entidade ou organismo”.

O ex-presidente da Comissão Executiva do Global Media Group, Marco Galinha, durante a audição na Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto esta manhã na Assembleia da República em LIsboa, 9 de janeiro de 2024. MIGUEL A. LOPES/LUSA
"Considerando o calendário apertado da operação e a necessária entrada do comprador (WOF) no capital da Global Media Group para a aportação dos fundos necessários (que, entretanto, não se verificou), foi proposto pelos assessores jurídicos do comprador (WOF) aos assessores jurídicos dos vendedores a retirada das revistas Evasões e Volta ao Mundo do perímetro da operação, de molde que a operação não suscitasse quaisquer questões jus-concorrenciais."
Marco Galinha em respostas ao Observador

Fonte oficial da AdC confirma ao Observador ter sido abordada pela empresa adquirente, a WOF, que “queria saber se a operação de aquisição da Global Media seria notificável, ao que a AdC respondeu que, de acordo com a sua prática, sim, porque se verificava o critério de notificação pela quota de mercado em alguns segmentos do mercado.”

Em momento posterior, a AdC foi informada de que tinha sido restringido o perímetro do negócio e que, nessa medida, deixaria de ser uma operação notificável. “A segunda transação, com o novo perímetro, não era notificável nem pelo critério do volume de negócios — que no passado recente tinha levado a Concorrência a pronunciar-se aquando da entrada de Marco Galinha — nem pelo da quota de mercado.”

Para chegar a esse novo perímetro, o negócio passou pelo carve out (destaque) dos títulos Volta ao Mundo e Evasões, uma revista de viagens e um encarte (vendido dentro jornais) sobre o mesmo tema, e da Men’s Health (bem estar e forma física). As duas primeiras publicações já estão registadas na ERC como propriedade da empresa Páginas de Prestígio, de Marco Galinha, mas a Men’s Health continua na chancela da Global Media. Pela informação recolhida pelo Observador, os trabalhadores destas publicações também tiveram salários em atraso como os restantes colaboradores do grupo na área da imprensa.

Marco Galinha explica que a transmissão da Men’s Health ainda não foi concluída por ser necessário cumprir todas as formalidades exigidas pela proprietária do marca, o grupo Hearst. Já no caso das duas revistas que passaram para a sua esfera também indica que nem todas as formalidades estão concluídas, “razão pela qual os trabalhadores afetos às referidas publicações ainda pertencem ao quadro dos trabalhadores da Global Media Group.”

Mudança de controlo para Marco Galinha foi validada pela Concorrência e pela ERC

A operação que estava em causa, nesta notificação, foi a que passou pela venda de 51% da sociedade Páginas Civilizadas por Marco Galinha ao Word Opportunity Fund. A Páginas Civilizadas detém diretamente 41,5% da Global Media Group. Há ainda uma percentagem de 8,7% que é detida por uma sociedade (Grandes Notícias) da qual José Paulo Fafe é gestor. Marco Galinha continua a ser acionista da Global via Páginas Civilizadas. José Pedro Soeiro e Kevin Ho são acionistas minoritários diretos na holding que controla os títulos de imprensa e a TSF.

Global Media. Assembleia para destituir administração e injetar 5 milhões convocada para 22 de fevereiro

Três anos antes, a tomada de controlo exclusivo da Global Media pela Páginas Civilizadas, uma empresa veículo criada pelo grupo Bel de Marcos Galinha, foi comunicada à Autoridade da Concorrência. A notificação foi feita porque o grupo adquirente e adquirido tinham um volume de negócios superior a 100 milhões de euros.

A operação foi aprovada pela AdC após concluir que da mesma não iria resultar um aumento de concentração nos mercados envolvidos que colocasse em causa a concorrência. Já a ERC, após “um aturado exame da documentação da operação de concentração projetada remetida pela AdC e de um levantamento tão exaustivo e detalhado quanto possível das questões, riscos e implicações por estas suscitadas”, não identificou na operação “componentes possíveis de algum modo contenderem com os valores do pluralismo e da diversidade de opiniões”. E uma das constatações que sustenta este parecer foi a de que a “Global Notícias (atual Global Media) e o grupo Bel, na sequência da aquisição na empresa, cumprem presentemente os requisitos legais no âmbito da lei da transparência da titularidade e financiamento dos órgãos de comunicação social”.

Lei da Rádio também obriga a controlar mudanças de propriedade

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Na resposta ao Observador, a ERC diz que “escrutina os limites de concentração previstos na Lei da Rádio e na Lei da Televisão, em situações de cessão e de alteração de domínio, o que pressupõe o conhecimento prévio dos detentores diretos e indiretos das empresas envolvidas”. A Global Media é detentora de uma licença de rádio, a TSF, e foi aberto outro processo administrativo ao abrigo da lei da transparência. Também está a ser avaliado o cumprimento das obrigações legais e alterações aos projetos aprovados, bem como as consequências da reestruturação anunciada para o exercício da atividade jornalística de uma rádio de informação e para a preservação da linha editorial.

Foi o incumprimento da obrigação de identificar os detentores de 5% ou mais da empresa compradora por parte do fundo que levou o regulador da comunicação a tomar a medida de abrir um procedimento ao abrigo da lei da transparência da propriedade. De acordo com informação prestada já esta semana, os vários acionistas da Global Media entregaram documentação sobre o tema que está a ser analisada pelo regulador. Se não for entregue a informação exigida pelo regulador relativa aos proprietários e beneficiários efetivos do WOF, a ERC pode avançar com o congelamento dos direitos de voto e patrimoniais deste acionista, o que seria inédito em Portugal.

Quem são os novos donos e quem manda na Global Media? As dúvidas que levam a ERC a abrir processo

Esta medida seria uma forma de afastar da Global Media a gestão nomeada pelo WOF e da qual só resta praticamente (como executivo) José Paulo Fafe. Mas se a ERC usar a “bomba atómica”, o congelamento dos direitos de voto pode condicionar a empresa Páginas Civilizadas que é a maior acionista da Global Media e que é detida por Marco Galinha e pelo fundo.

Esta semana, os acionistas minoritários da Global que têm uma participação direta convocaram uma assembleia geral para 19 de fevereiro para destituir os órgãos sociais e realizar um aumento de capital de cinco milhões de euros. Já esta quinta-feira, confirma-se o pagamento dos salários de dezembro dos colaboradores do JN e do DN que foi financiado com a antecipação das receitas da VASP, a distribuidora de jornais que é controlada por Marco Galinha.

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