Quando Lionel Messi fez o 3-2 para a Argentina ao minuto 109′ da final do Mundial 2022, já durante o prolongamento, meio-mundo saltou de alegria, principalmente os 45 milhões de argentinos. Entre os que saltaram de êxtase estavam os suplentes do plantel albiceleste, que invadiram o campo nos festejos do golo. Nos festejos… ou segundos antes. Nas imagens que têm sido publicadas em várias redes sociais, vê-se que pelo menos dois suplentes da Argentina entraram em campo para festejar ainda antes do remate de Messi fazer a bola entrar na baliza. A questão é que as publicações alegam que esse facto torna o golo ilegal. Devia o golo de Messi ter sido anulado?
Há regras que se aplicam a casos em que jogadores suplentes entram em campo durante uma partida; mas também é fundamental considerar o contexto em que essas situações ocorrem. O caso do golo de Messi é um daqueles que coloca nos pratos da balança as leis do jogo, de forma literal, mas também o bom senso e a interpretação.
Vamos primeiro ao lado objetivo e teórico: o que dizem as leis do jogo num caso como este? O ex-árbitro internacional e áudio-árbitro da Rádio Observador, Pedro Henriques, explica-nos que em causa está a Lei 3, referente aos “Jogadores”, e, mais propriamente, o ponto 9, que regulamenta as situações de um “golo obtido com uma pessoa a mais no terreno de jogo”. Diz a regra o seguinte, na página 50: “Se, após a obtenção de um golo e antes de o jogo recomeçar, o árbitro se apercebe de que uma pessoa a mais se encontrava dentro do terreno de jogo no momento em que o golo foi obtido, o árbitro deve invalidar o golo se a pessoa a mais era um jogador, suplente, jogador substituído, jogador expulso ou elemento oficial da equipa que marcou o golo.” Acrescenta ainda que “o jogo recomeça com um pontapé-livre direto no local onde se encontrava a pessoa a mais”.
Ou seja, explica Pedro Henriques, “se for uma pergunta de teste escrito, o árbitro tem de invalidar o golo e recomeçar o jogo com o livre-direto contra essa equipa. Isto é a teoria da lei”.
Mas vamos agora ao prisma do bom senso. “Isto vai parecer uma contradição, mas também temos de olhar aqui para o ‘espírito da lei’. Aqueles jogadores não entraram em campo para tirar partido de nada, para distrair ninguém, eles estavam a comemorar o primeiro remate, porque achavam que ia entrar, mas o guarda-redes defende, há ali uma precipitação de quem está a comemorar um golo”, refere o áudio-árbitro da Rádio Observador. No fundo, e resumindo: “O que o futebol espera é que, nestas circunstâncias, não haja uma atuação por parte da equipa de arbitragem, é o chamado espírito da lei.”
Este espírito está bem presente no manual das Leis do Jogo, na edição de 2022-2023, na tradução para português de Portugal. Na lei 5, “O Árbitro”, mais propriamente no ponto 5, onde podemos ler que as decisões devem ser “tomadas o melhor possível pelo árbitro de acordo com as Leis do Jogo e o ‘espírito do jogo'”. Também na introdução do documento se lê que se espera dos “árbitros que façam uso do senso comum e que apliquem o “espírito do jogo” ao aplicar as Leis do Jogo”.
Mesmo em termos de direito, o autor do podcast da Rádio Observador Sem Falta, Pedro Henriques, explica que “mesmo que a Federação Francesa de Futebol faça queixa por este lance, o jogo nunca será repetido porque na realidade a ‘letra da lei’ foi ferida, mas o ‘espírito da lei’ não”.
Conclusão
Pela “letra da lei”, o terceiro golo da Argentina, e segundo de Messi, na final do Mundial do Qatar devia ter sido anulado, tendo como base o ponto 9 da Lei 3 das Leis do Jogo, e o jogo devia ter recomeçado com um livre-direto na zona onde os suplentes da Argentina entraram no campo.
Pelo chamado “espírito da lei”, o futebol não deve esperar que um golo seja anulado por uma precipitação de um festejo, que acabou por não ter qualquer impacto na jogada do golo, ou seja, foi correto validar o golo.
A conclusão é, assim, a de que a alegação é “enganadora”, porque, apesar de ir contra a letra da lei, houve respeito pelo “espírito da lei” e pelo “espírito do jogo”.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ENGANADOR
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.