Uma publicação no Facebook afirma que a Ivermectina é eficaz na redução da carga viral da dengue. A partilha diz também que o tratamento diminui os sintomas em 72 horas. Contudo, é falso. O texto original, que serve de base para estes posts é atribuído a dois professores da Universidade de Buenos Aires, embora não esteja publicado em publicações científicas. A dengue é uma doença que se espalha amplamente pela América do Sul. O boato surge numa altura em que a Organização Mundial de Saúde (OMS) considerou um “desafio significativo” o aumento de casos de dengue no Brasil. No primeiro mês do ano, mais de 30 pessoas morreram vítimas da doença no país. Foi lá que publicações sobre o uso da ivermectina se tornaram virais nas redes sociais, o que levou o próprio governo a desmentir estas informações.
A dengue é uma doença infecciosa, causada pelo vírus DENV, que é transmitida através da picada de mosquitos Aedes. A presença destes insectos é mais abundante em regiões com clima tropical, embora também existam infeções em locais mais temperados, como é o caso de Portugal, ainda que em proporções muito menores do que no Brasil, por exemplo. Os doentes infetados podem ser assintomáticos. Contudo, o espectro clínico da dengue é amplo. Entre os principais sintomas pode verificar-se febre alta, dor de cabeça, fraqueza e indisposição. Muitos pacientes também chegam a apresentar manchas vermelhas na pele, na zona do rosto e tronco, mas que se alastram para o resto do corpo.
Já a ivermectina é um remédio antiparasitário, usado medicamente de forma mais comum contra sarna e piolhos. Mas os seus efeitos contra a dengue não são claros. Marcelo Urbano Ferreira, médico e investigador sénior do Instituto de Higiene e Medicina Tropical da (IHMT) da Universidade Nova de Lisboa, alerta que o texto que serve de base às publicações que encontramos nas redes sociais “não se trata de um artigo científico”. O especialista explica que o único ensaio em seres humanos, que estudava o tratamento com ivermectina, “concluiu não haver redução da carga viral nem melhora clínica entre os pacientes tratados”. Urbano Ferreira ainda sublinha: “Não há evidências a favor do uso profilático da ivermectina como uma estratégia para reduzir a população de vetores [os mosquitos] da dengue e, deste modo, deduzir o risco de transmissão da doença.”
O que acontece é que o efeito deste medicamento contra o vírus da dengue foi testado in vitro e produziu um efeito inibitório na replicação do vírus. Marcelo Urbano Ferreira assume que “não há surpresa nenhuma”, uma vez que a ivermectina também produziu o mesmo efeito em relação ao vírus que transmite a Covid-19. “A questão é saber se esses dados obtidos in vitro podem ser reproduzidos in vivo”, assume o médico. “Aquilo que se verifica em animais de experimentação e em seres humanos infetados, em que a dose dos fármacos a ser administrada é limitada pela ocorrência de efeitos colaterais”, detalha.
E que efeitos colaterais são esses? Existem evidências de que o consumo de ivermectina em doses superiores às indicadas (patra tratar problemas de saúde associados a piolhos, por exemplo) pode colocar o paciente em risco de hepatite medicamentosa.
Devido a informações falsas de que a ivermectina seria eficaz contra a Covid-19, alguns médicos passaram ao lado de indicações oficiais e testaram o seu uso em humanos, durante a pandemia, incluíndo em Portugal. Como resultado, verificaram-se casos de desenvolvimento de problemas hepáticos graves.
No que diz respeito à cura da dengue, Marcelo Urbano Ferreira diz que “não há medicamentos aprovados para uso clínico”. Contudo, existem vacinas. O que acontece nas unidades de saúde, quando prestam assistência médica a doentes de dengue, é prestar suporte, procurando prevenir complicações graves da doença.
A presença do mosquito transmissor da dengue foi registada pela primeira vez em Portugal em 2005, na ilha da Madeira. O primeiro registo da sua presença no continente foi em 2017. Contudo, os casos de dengue no país são raros.
Conclusão
Várias publicações nas redes sociais afirmam que a ivermectina é o medicamento que ajuda na redução da carga viral da dengue. A doença tem pouca expressão em Portugal, mas um recente surto na América do Sul voltou a incentivar o aparecimento de informações falsas sobre a sua cura. A partilha diz também que o tratamento diminui os sintomas em 72 horas. Contudo, é falso. Não existem medicamentos devidamente testados para curar a dengue. Para além disso, sabe-se que o uso de forma não recomendada de ivermectina pode causar problemas hepáticos graves.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.