Portugal está há quase um ano em estado de emergência. E já vai no 13º. Foi a 18 de março que o Presidente da República decretou pela primeira vez, no âmbito da pandemia da Covid-19, este estado de exceção. Doze meses volvidos, um utilizador de Facebook faz uma publicação a criticar as regras decretadas para travar os contágios e a forma como as autoridades de segurança “perseguem” e “importunam” os cidadãos. E vai mais longe: garante que as medidas do estado de emergência definidas em Conselho de Ministros “não têm força de lei”. Será verdade?

Podemos desde já responder: não. Mas vamos por partes. O utilizador em causa começa por dizer que a publicação, datada de 1 de março, é “um aviso a todas as forças de segurança”. Critica depois a atuação destas e afirma: “Lembro, ou informo, que essas medidas não têm força de lei, além de serem uma grave ilicitude contra a liberdade e dignidade humana.”

Eis a publicação em causa, que conta até ao momento com quase 100 partilhas:

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Esta afirmação é falsa e para o concluir bastaria consultar o decreto do estado de emergência em vigor, que está disponível online. A alínea 1 do artigo 41º é clara: “Compete às forças e serviços de segurança e às polícias municipais fiscalizar o cumprimento do disposto no presente decreto.” Assim sendo, e de acordo com a lei, num momento em que estão suspensos ou restritos alguns direitos e liberdades, as autoridades têm o poder de fazer a fiscalização das medidas em vigor.

Concretamente sobre a “força” das medidas definidas em conselho de ministros a propósito do estado de exceção, a explicação do constitucionalista e presidente da Associação das Sociedades de Advogados de Portugal, José Moreira da Silva, ao Observador é clara: “O decreto do Governo que executa o estado de emergência, não sendo uma lei, tem força até superior às leis, derivado do seu especial regime constitucional, enquanto decreto de exceção.”

“Na verdade”, acrescenta o constitucionalista ouvido pelo Observador, “o decreto do Governo de execução do estado de emergência não é, formalmente, uma lei, mas não precisa de o ser, pois tem suporte direto na Constituição e na lei, gozando de uma especial força constitucional, até superior às leis, sobrepondo-se a elas”. Concluímos, novamente, que a argumentação utilizada na publicação em causa está errada.

Olhemos mais uma vez para a lei: quem não cumprir com as medidas definidas pelo Governo ocorre num crime de desobediência e pode ser punido com uma pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias. A pena pode ser até superior: até dois anos anos de prisão ou de multa até 240 dias (no caso de um crime de desobediência qualificada).

José Moreira da Silva é novamente taxativo: “A aplicação de penas de prisão ou multa ou a aplicação de contraordenações e sanções acessórias por violação das medidas impostas pelo estado de emergência estão expressamente previstas em lei ou decreto-lei, ou seja, em atos com força de lei”.

Mas o utilizador de Facebook vai mais longe e escreve que o facto de a polícia fiscalizar ou multar cidadãos no âmbito do estado de emergência “é um crime de abuso de poder e é também um crime de prevaricação ou denegação de justiça”. Verdade? Não.

O constitucionalista ouvido pelo Observador afirma que também esta afirmação é falsa, porque as autoridades estão “devidamente autorizadas pela lei” a fiscalizar e a aplicar as medidas do estado de emergência (sejam coimas, contraordenações, sanções acessórias ou o encerramento de estabelecimentos). José Moreira da Silva ressalva que a atuação das autoridades apenas poderá ser posta em causa “se a sua atuação exceder os limites impostos por lei”.

Conclusão 

A frase desta publicação no Facebook, datada de 1 de março, está errada. As medidas do estado de emergência definidas em Conselho de Ministros têm, de facto, força de lei. Como explica ao Observador o presidente da Associação das Sociedades de Advogados de Portugal, José Moreira da Silva, apesar de não ser uma lei, o decreto do Governo que executa o estado de emergência “tem força até superior às leis”. Ou seja, sobrepõe-se às leis ordinárias. Sendo assim, a publicação é falsa.

É também falso que, ao multar ou fiscalizar os cidadãos neste âmbito, a polícia esteja a incorrer em qualquer crime, visto que a lei indica que “compete às forças e serviços de segurança e às polícias municipais fiscalizar o cumprimento” das medidas definidas.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

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