“Esse avião é um perigo. A Anac é uma nulidade completa: permite que aviões como o que caiu em Vinhedo (SP) operem à vontade em voos regionais no Brasil. Desde o lançamento, nos anos 1980, os ATR-72 já caíram 402 vezes, matando 470”. O texto surge em várias publicações no Facebook e refere-se ao caso do avião que se despenhou em São Paulo, no início do mês, e que levou à morte de 62 pessoas.

Como o Observador noticiou, a 9 de agosto, um avião de passageiros caiu no bairro Capela, em Vinhedo, no interior do estado brasileiro de São Paulo, no Brasil. Seguiam 62 pessoas a bordo, 58 passageiros (entre eles uma mulher portuguesa) e quatro tripulantes, de acordo com nota da companhia aérea brasileira Voepass. Todos morreram de forma instantânea por politraumatismo no momento em que o avião que se despenhou tocou no solo.

Bastaram 24horas para que o parágrafo acima citado se difundisse em redes sociais como o Threads, Facebook ou Instagram. Com ligeiras variações, a alegação é a mesma: o modelo daquele avião da companhia Voepass já havia caído “402 vezes, matando 470 [pessoas]” e as autoridades brasileiras nada fizeram para o impedir.

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Na base de dados da Aviation Safety Network (ASN) estão registadas 407 ocorrências envolvendo o modelo ATR-72 desde 1993. Mas nem todas essas ocorrências correspondem a quedas de aviões. A grande maioria dos mais de 400 casos registados na base de dados da ASN refere-se a incidentes de colisão com aves ou danos leves à aeronave.

Mais: nessas 407 ocorrências estão registadas 532 mortes, mas não foram sequer em acidentes com o modelo em causa — o ATR-72-500, usado em rotas regionais no Brasil, fabricado pela francesa ATR e cujas características foram amplamente descritas na imprensa brasileira.

Quando pesquisamos sobre este modelo em específico, verificamos que há, entre 1993 e 2024, 178 ocorrências registadas, e destas três registaram mortes. Uma foi em Taiwan, em 2014, em que morreram 48 pessoas, a segunda foi em 2023, quando um acidente perto do aeroporto internacional do Nepal fez 72 vítimas mortais. A terceira e última foi o trágico acidente de 9 de agosto deste ano, no Brasil, que fez 62 mortos. O que perfaz um total de 182 pessoas que morreram na sequência de acidentes com aviões ATR-72-500.

Além disso, a 14 de agosto, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) divulgou informações oficiais sobre o acidente com a aeronave da Voepass em Vinhedo e lembra que o Brasil está “entre os países mais bem avaliados em desempenho de segurança operacional pela Organização de Aviação Civil Internacional (Oaci), agência especializada da ONU sobre o tema”. “A Oaci realiza auditoria que avalia as mais diversas atividades desenvolvidas pela Anac, inclusive procedimentos de fiscalização das empresas aéreas que operam voos comerciais no transporte aéreo regular de passageiros”, acrescenta.

Conclusão

Nas redes sociais está a ser partilhado que as autoridades brasileiras permitem que “aviões como o que caiu em Vinhedo (SP) operem à vontade em voos regionais no Brasil”, apesar de “desde o lançamento, nos anos 1980, os ATR-72 já [terem caído] 402 vezes, matando 470”. É mesmo referido que aquele avião é “um perigo”. Trata-se, no entanto, de uma alegação imprecisa. Os números utilizados nas publicações nas redes sociais aproximam-se dos registos que existem relativos a todas as séries de aviões do tipo ATR-72 — que já estiveram envolvidos em acidentes que tiraram a vida a 532 pessoas em todo o mundo, já incluindo as 62 vítimas do voo operado pela Voepass. Fazendo as contas, até ao desastre de 9 de agosto, em Vinhedo, acidentes com aviões ATR-72 de todo o tipo tinham registado 470 mortes desde que foram lançados, como citado nas publicações virais. No entanto, se nos focarmos no modelo em específico, o ATR-72-500, verifica-se que houve 178 ocorrências registadas, que vitimaram 182 pessoas. Além disso, a alegação de que a Anac, autoridade brasileira de aviação civil, “permite que aviões como o que caiu em Vinhedo (SP) operem à vontade em voos regionais no Brasil” é contestada pela própria entidade, que garante que “a aviação brasileira segue os mais rigorosos padrões internacionais de segurança da aviação civil e que há mais de 15 anos o setor não vivia um acidente deste porte”.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ENGANADOR

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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