Circula nas redes sociais uma nova teoria sobre a morte de António de Oliveira Salazar, a cara do Estado Novo. Governou Portugal durante 36 anos. Uma publicação no Facebook partilha uma imagem a preto e branco que mostra o corpo de um defunto deitado numa cama, com uma mulher à cabeceira e uma grande coroa de flores aos pés.

Publicações com teoria sobre morte de Salazar

Publicações com nova teoria sobre morte de Salazar

Quanto à teoria sobre a morte de Salazar, o utilizador de Facebook escreve que “a 23 de abril de 1974 o ditador fascista Antónia de Oliveiro Salazar é assassinado” — antes de analisar as datas mencionadas, importa corrigir o nome escrito na publicação: o nome do antigo ditador português é António de Oliveira Salazar e não Antónia de Oliveiro Salazar. “Reza a história”, continua a publicação, “que Salazar apoiava padres pedófilos e que o pai de um seminarista se vingou no porco ditador”.

Várias imprecisões em apenas três linhas de texto. Vamos à primeira, a data da morte de Salazar: “23 de abril de 1974”, ou seja em vésperas do 25 de abril.

A história de António de Oliveira Salazar não deixa espaço para dúvidas. Considerado a “personalidade política mais marcante do século XX português” pelo governo de Portugal, Salazar foi chamado pelo então presidente Óscar Carmona para assumir o ministério das Finanças, em plena ditadura militar, em 1928. Quatro anos depois, passa de “mago” das Finanças a chefe de governo. Funda o Estado Novo em 1933, escolhe como lema “Deus, Pátria e Família” e governaria Portugal até 1968 de forma autoritária, num regime de partido único com ajuda de uma polícia política — a PIDE.

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A história de António de Oliveira Salazar é assim resumida por Abílio Pires Lousada e Humberto Nuno Oliveira, num artigo publicado na Revista Portuguesa de História Militar, partilhada na página do Ministério da Defesa Nacional.

Os autores traçam a história do homem que viu o seu nome para sempre associado ao regime que criou — o Estado Novo — até à Revolução dos Cravos, no dia 25 de abril de 1974, e são perentórios: “Epílogo a que Salazar não assistiu por ter morrido a 27 de Julho de 1970, quase dois anos após uma queda que lhe provocou um derrame cerebral e o afastou da condução dos destinos da Nação”.

António de Oliveira Salazar morreu a 27 de julho de 1970, depois de ter sofrido uma queda que deixou consequências físicas que conduziriam à sua morte, e não a 23 de abril de 1974. Como é igualmente consensual entre historiadores, Marcello Caetano e não António de Oliveira Salazar liderava o governo, quando a revolução de 25 de abril pôs fim ao Estado Novo.

As cerimónias fúnebres de Salazar estão igualmente bem documentadas em vários meios de comunicação social, como nos arquivos da RTP e do Diário de Notícias, que na altura escreveu em manchete “Portugal está de luto — Morreu o Presidente Salazar”. Como podemos ver nestes arquivos, o funeral de Salazar realizou-se em Lisboa, no Mosteiro dos Jerónimos, a 30 de julho de 1970, e depois o seu corpo seguiu de comboio para Santa Comba Dão, terra onde nasceu e onde está sepultado.

Ainda assim, a publicação não se engana apenas na data da morte do ditador português, mas também nos acontecimentos que estiveram na sua origem. Escreve o utilizador de Facebook que foi um “pai de um seminarista” que “se vingou” e matou Salazar pelo seu apoio a “padres pedófilos”. Apesar de António Oliveira Salazar ter de facto ingressado no seminário de Viseu em 1900 e lá ter estado durante oito anos e a sua relação com a Igreja ser uma das principais bandeiras do Estado Novo e de ter motivado até livros sobre o assunto por autores como Arnaldo Madureira, esta relação não tem nada a ver com a sua morte.

Aqui basta recorrermos aos arquivos do Diário de Notícias e cruzarmos a informação que consta no portal do Ministério da Defesa Nacional. A morte de Salazar aconteceu dois anos depois de um acidente que “lhe provocou um derrame cerebral”. Esse acidente, como explica o DN, foi a “célebre queda da cadeira” que aconteceu em agosto de 1968, “quando folheava o nosso jornal no Forte de Santo António, no Estoril”. Foi essa queda que obrigou Salazar a deixar a liderança do governo — depois assumida por Marcello Caetano — e que mais tarde causou a sua morte.

Conclusão

Não, António de Oliveira Salazar não morreu na véspera do 25 de abril de 1974, nem foi “assassinado” por um “pai de um seminarista” pelo apoio que teria dado a “padres pedófilos”. Historiadores e arquivos dos jornais da altura comprovam o contrário. A morte de Salazar aconteceu em julho de 1970, as suas cerimónias fúnebres e até a viagem de comboio do seu corpo para Santa Comba Dão, onde foi enterrado, estão bem documentadas. O mesmo sobre a causa da sua morte, “um derrame cerebral”, provocado por uma “queda” que tinha dado dois anos antes. A “célebre queda da cadeira”, como descreve o DN.

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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