A afirmação surge seguida da imagem de uns pés em ferida e, depois, com uma explicação sobre o que a “erupção fixa por medicamento” pode significar. Na mesma informação lê-se que “Patricia”, a suposta voluntária que testou a vacina desenvolvida pelas farmacêuticas Pfizer e BioNtech contra a Covid-19, “não consegue andar sem bengala” desde o dia 2 de novembro, quando lhe foi administrada a vacina.

A publicação que tem sido partilhada na rede social Facebook foi, no entanto, explicada pela própria voluntária que, de facto, se chama Patricia e tem 30 anos. Os pés em ferida que a imagem divulga são os dela, sim. E Patricia, que mora no Texas, participou mesmo no ensaio da vacina que começou a ser administrada a 8 de dezembro no Reino Unido. No entanto, ela não chegou a receber a vacina, mas sim um placebo, ou seja, uma pequena injeção de água salgada. Os investigadores costumam fazê-lo com uma parte dos voluntários, de forma a poderem comparar os grupos que de facto receberam a vacina com os restantes.

As feridas nos pés de Patrícia, como a própria já explicou, apareceram em finais de outubro, depois de ter feito uma caminhada ao frio. Primeiro, começou por sentir uma dor no pé esquerdo e até pensou que fosse do calçado. Mas quando chegou a casa percebeu que a planta do pé estava inchada. No mesmo sítio, formou-se uma enorme bolha que não sarava. Acabou por acontecer o mesmo no outro pé, o que lhe trouxe grandes dificuldades de locomoção.

Numa consulta médica, acabariam por dizer-lhe que uma das possíveis causas para o que lhe aconteceu podia ser a reação a um medicamento, que podia resultar na tal “erupção fixa por medicamento”. Patricia pensou logo que podia ter sido a vacina contra a Covid-19 que tinha levado, pela segunda vez, cinco dias antes. Até porque, apesar de sofrer de um problema nas costas, que a vai obrigar a ser alvo de uma intervenção cirúrgica pela terceira vez, a sua medicação é a mesma desde 2012. A vacina seria o único medicamento que tomara diferente.

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Sem poder trabalhar, e antecipando as despesas médicas a sobreporem-se às que já tinha, um familiar seu decidiu criar (com a autorização de Patricia) uma angariação de fundos no site GoFundMe para arrecadar dinheiro para despesas médicas. E foi a descrição desse pedido que rapidamente foi copiada para alguns sites com posições anti-vacina contra a Covid-19 — e que rapidamente alcançou as redes sociais e o mundo: “Patricia… foi voluntária num estudo de vacina contra Covid-19 recentemente e teve uma reação adversa grave”, dizia o texto, com uma imagem de Patricia acompanhada do marido e do filho ainda bebé, e outra imagem do estado das lesões nos seus pés.

Nalgumas publicações, que se reproduziram por vários sites e redes sociais e em várias línguas, foram sendo acrescentados pormenores ao texto ao original.

Quando a informação chegou à equipa da Pfizer que estava a fazer os testes, Patricia foi contactada de imediato com uma informação preciosa: Patricia não tinha nunca tomado a vacina, mas sim uma solução à base de água e sal à qual os médicos chamam de placebo e que permite comparar os efeitos de quem toma e de quem não toma aquela vacina em teste. Normalmente, os voluntários não são informados do que lhes é administrado — se o placebo, se a vacina. Depois desta informação, Patricia tem-se desdobrado em várias consultas médicas para perceber o que tem.

Aliás, num vídeo publicado no Youtube, a 27 de novembro, a voluntária do Texas diz mesmo que foi a quatro médicos diferentes e que todos associaram as lesões nos pés a uma reação à injeção que tinha levado cinco dias antes, e que seria já a segunda dose. No entanto, quando lhe disseram que não tinha sido ela a levar a vacina, Patricia baixou os braços. “Não sei o que causou isto, o que eu sei é que é muito doloroso”, confessa, numa mensagem onde diz que além das dores e das dúvidas do que lhe possa ter causado tais feridas nos pés, também foi alvo de vários ataques por parte de alguns cibernautas. “Tem sido uma semana muito stressante”, diz a certa altura.

No site GoFundMe o texto da publicação de angariação de fundos chegou a ser retirado, mas foi depois republicado com um novo texto a assumir que Patricia desconhece a causa da sua doença. “Tenho que assumir alguma culpa por divulgar minha história”, disse Patricia. “É a rede social. O que partilha num segundo pode pegar e tornar-se viral.”, afirmou, citada pela BBC. “As minhas feridas não tiveram nada a ver com a vacina. Desculpem. As pessoas cometem erros.”

Já no dia 1 de dezembro, num segundo vídeo também no Youtube, Patricia diz que já ouviu uma segunda opinião. “O dermatologista disse que foi causada por ibuprofeno. Parece que nunca mais vou tomar ibuprofeno na minha vida”, disse, incrédula, uma vez que é um medicamento que toma há vários anos por causa de um problema que tem nas costas. Aparentemente, Patrícia estava a tomar uma versão mais forte do anti-inflamatório cetoprofeno.

Também a Pfizer já afirmou ao Aos Fatos que nenhum voluntário dos testes apresentou erupções cutâneas semelhantes. Segundo o comunicado publicado no dia 18 de novembro, as únicas reações adversas encontradas foram fadiga e dor de cabeça.

Conclusão

Não é verdade que as feridas que Patricia tem nos pés tenham sido causadas pela vacina contra a Covid-19 porque ela integrava o grupo a quem foi administrado apenas placebo, ou seja, uma solução à base de água e sal. É isso que a Pfizer garante, depois de uma publicação que correu mundo em várias línguas a afirmar que as feridas nos pés eram uma reação adversa à vacina que tinha levado cinco dias antes.

Já uma segunda opinião médica, como a própria veio anunciar via Youtube, vem dar como causa da reação nos pés o cetoprofeno, que Patricia tomou para uma doença que tem nas costas. Patricia terá tomado uma dose mais forte do que o habitual, o que poderá ter provocado a tal reação.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota 1: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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