No início de 2021, após o surgimento das primeiras vacinas contra a Covid-19 em dezembro de 2020, começaram a ser partilhadas nas redes sociais alegações de que quem é vacinado emite um sinal bluetooth, como nota o Poytner Institute. Em dezembro de 2021 ano, depois de esta alegação já ter sido várias vezes refutada, voltou a ser partilhado num grupo de Facebook uma publicação com uma hiperligação que mostra um vídeo de um teste fictício feito em França no qual se diz provar esta afirmação. Este teste é falso.

O autor em causa partilha uma hiperligação que redireciona para uma página alojada na plataforma online canadiana de partilha de vídeos rumble, que é bastante popular entre grupos de extrema-direita norte-americanos. Na página, além de se mostrar um vídeo em francês traduzido para português, é mencionado que “a equipe francesa foi para o campo para evitar sinais rádio externos e fez experiência conseguindo separar pessoas sem problemas, entre os ‘vacinados’ e ‘não vacinados’ e só por meio da irradiação que os
injetados emitiam”. Além disso, o texto de resumo do vídeo, que está incluido no mesmo, refere que “informaram os injetados sobre o seu código pessoal”. Mais à frente, já no vídeo, é referido ainda que foi possível captar o sinal “por meio da irradiação que os ‘vacinados’ emitiam conseguiram identificar os códigos bluetooth”.

Ora, o vídeo em nada prova a alegação que tenta provar. A única imagem que demonstra na qual é visto um suposto sinal de Bluetooth é de um dispositivo que pode ser qualquer outro aparelho qualquer que emite este tipo de sinais — caso dos smartphones, auriculares ou até o computador no qual é visto um alegado sinal captado.

Sendo antiga a alegação falsa de que vacinados contra a Covid-19 emitem um sinal de bluetooth, e como já referimos, esta já foi desmentida por especialistas e em artigos de vários órgãos de comunicação social, como este e este da Reuters ou este do USA Today. Um dos principais motivos mencionados para explicar que as vacinas não podem dar um identificador a cada pessoa que as recebe é porque nem sequer é possível fazer isso com a atual tecnologia bluetooth que existe.

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Como contou à Reuters em dezembro de 2021 Ken Kolderup, diretor de marketing da Bluetooth SIG (a organização que, desde 1998, é responsável pelos padrões principais desta tecnologia), “atualmente, não há uma maneira conhecida para se desenvolver um chip bluetooth pequeno o suficiente para que possa ser adicionado a uma vacina e injetado através de uma agulha hipodérmica”.

Para compreender esta afirmação basta perceber como funciona e por que é que foi criada esta tecnologia criada em maio de 1998. Tudo começa com o nome Bluetooth, que é uma alusão ao rei dinamarquês e norueguês Harald Bluetooth. Este líder ficou conhecido por, durante um período da História, ter unido várias tribos escandinavas num só reino e ter levado o cristianismo a estas terras. O símbolo utilizado é uma espécie de junção caracteres nórdicos antigo, apelidados de runas, que juntam as iniciais deste antigo líder.

A alusão é feita devido à união fácil sem necessidade de fios ou cabos que a tecnologia quer permitir que exista entre aparelhos eletrónicos. Atualmente, a maioria dos dispositivos utiliza este padrão para se conectar sem problemas, por exemplo, auriculares a uma televisão carregado em poucos botões. Para isso, o Bluetooth usa ondas de rádio UHF (termo inglês para “Ultra High Frequency”, algo como “Frequência Ultra Alta”, em português) nas bandas ISM (siglas para “Industrial Sientific and Medical”, a banda reservadas para uso industrial e médico) de 2,402 GHz a 2,48 GHz.

Desta forma, aparecem os vários aparelhos possíveis para serem conectados. Se estiver vacinado e tiver um smartphone, é provável que o mesmo tenha um recetor bluetooth para ligar algum aparelho em seu redor. Devido a ser uma tecnologia utilizada em todo o mundo, é normal que até apanhe, por exemplo, sinais de bluetooth de um dispositivo de um vizinho que esteja perto de si. Mas não será da vacina. O mais provável, se aparecer um destes sinais, é ser de um computador ou smartphone que tem esta funcionalidade ligada.

Com isto, voltamos à afirmação de Kolderup. O mesmo responsável do consórcio para a padronização do Bluetooth explica que “os chips Bluetooth conhecidos até hoje são ainda maiores do que dois milímetros por dois milímetros”. E isto “sem incluir os componentes adicionais necessários para criar um transmissor Bluetooth funcional, como uma antena ou fonte de alimentação”. Por outras palavras, mesmo que alguém o quisesse fazer, não é possível injetar um dispositivo bluetooth que funcione através das vacinas que estão a ser aplicadas à população, esclarece Kolderup.

Além desta refutação dos factos alegados, de acordo com os ingredientes listados pela Agência Europeia do Medicamento para as vacinas aplicadas na Europa — a Comirnaty, a Janssen e a Moderna–, não consta que existam chips Bluetooth. Os ingredientes de cada vacina podem ser vistos aqui, aqui e aqui, respetivamente.

Conclusão

Não é verdade que as pessoas vacinadas emitam um sinal bluetooth. Para isso, era necessário que a própria tecnologia já tivesse criado chips pequenos o suficiente para funcionarem sem necessidade de uma antena ou fonte de alimentação que não podem sequer ser injetados. O vídeo no qual tal afirmação é feita nem sequer comprova a própria alegação com factos, mostrando apenas uma imagem que não demonstra a veracidade do teste. Além disso, de acordo com a entidade europeia responsável pela aprovação de vacinas, um chip Bluetooth não faz parte dos ingredientes das mesmas.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook

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