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Porque é tão importante a escolha do vice-Presidente? |
Por esta altura da campanha, já deve ter reparado que Donald Trump e Joe Biden não são propriamente dois homens na flor da idade. O Presidente dos EUA tem atualmente 74 anos e o ex-vice-Presidente, que agora quer chegar a número um, fará 78 a 20 de novembro. São os dois homens mais velhos de sempre a concorrer à Casa Branca. |
Agora considere esses dois números juntamente com um terceiro, também oficial: a esperança média de vida para um homem branco nos EUA é de 76,4 anos. E lembre-se de que estamos a falar de um país com a dimensão e a importância dos Estados Unidos, onde não basta a longevidade, também é preciso energia e resistência para enfrentar a governação. |
Fazer estas contas torna muito mais fácil perceber porque é que serem estes candidatos e não outros tem um grande impacto na estratégia dos partidos — e no voto dos eleitores. |
“O vice-Presidente Biden e o Presidente Trump serão os candidatos à presidência dos EUA mais velhos de sempre. Só isso implica que a escolha de um vice-Presidente é mais importante nestas eleições do que em todas as anteriores”, disse-me em entrevista, no início de agosto, o académico Joel Goldstein, referência no estudo da vice-Presidência dos EUA. |
Assim, depois de olhar com atenção para os nomes de Donald Trump e Joe Biden, talvez valha a pena pensar noutros dois: Mike Pence e Kamala Harris. |
O primeiro foi vice-Presidente nos últimos quatro anos. Antes disso, foi congressista pelo Indiana e, mais tarde, governador desse mesmo estado. Ainda antes de ter chegado a Washington D.C. definia-se como “cristão, conservador e republicano, por esta ordem de importância”. Atualmente, além de tudo isso, é um homem inabalavelmente leal a Donald Trump. Prova disso foi o discurso que fez na terceira noite da Convenção do Partido Republicano, onde atribuiu todos os louros dos últimos quatro anos ao Presidente — mesmo nos dossiers, como a gestão da pandemia, que Mike Pence foi chamado a assumir. |
A segunda é senadora pela Califórnia, estado do qual chegou a ser a primeira procuradora-geral afro-americana. Mais recentemente, foi adversária de Joe Biden nas eleições primárias —e que adversária. Em julho, o ambiente gelou entre os dois quando Kamala Harris lembrou num debate que, na década de 1970, Joe Biden negociou com republicanos pró-segregação racial a integração de alunos afro-americanos em escolas exclusivamente brancas. E contou como “havia uma menina na Califórnia que fez parte do segundo ano que integrou” as escolas brancas. Depois, rematou: “E essa menina era eu”. A frase caiu com força e a campanha de Harris até vendeu t-shirts com ela. Agora, esse momento parece estar ultrapassado, com Joe Biden a chamá-la para sua número dois. Na convenção democrata, Kamala Harris quebrou a tradição de apenas tentar vender o seu número um — em vez disso, dedicou a maior parte do tempo a explicar porque acredita que ela mesmo pode ser uma boa número dois. |
O foco do discurso de Harris é sintomático da crescente importância do cargo do vice-Presidente na política dos EUA — uma tendência iniciada por Jimmy Carter, que deu importantes pastas ao seu número dois, Walter Mondale, com destaque para a política externa. Até aí, a história era outra — abundando os casos de homens que passaram por aquele cargo e que não tiveram coisas agradáveis a dizer sobre ele. John Garner, 32º vice-Presidente dos EUA, passou o resto da sua vida a dizer que o cargo que exerceu “não vale um balde de cuspo quente”. E Harry Truman disse que os homens que passaram por aquelas funções “eram tão úteis como a quinta teta de uma vaca”. Ironia do destino: depois de dizer aquelas palavras, ele mesmo foi vice-Presidente e, pouco depois, Presidente, após a morte de Franklin Delano Roosevelt. Só quando chegou a número 1 entendeu o quão pouco o consideravam enquanto número 2, ao saber que não tinha sido incluído no leque de pessoas que sabiam que os EUA tinham armas nucleares. As mesmas que ele próprio viria a usar contra o Japão, pondo fim à Segunda Guerra Mundial. |
Mas o facto é que, até hoje, entre os 45 homens (e nunca mulheres, pelo menos por enquanto) que chegaram a vice-Presidente, um total de 14 chegou a Presidente — dito de outra forma, 1 em cada 3. Daqueles 14, oito foram promovidos porque o Presidente morreu e teve de ser substituído; quatro porque, mais tarde, concorreram à presidência e ganharam; e um, Gerald Ford, porque Robert Nixon se demitiu a meio do mandato. Por isso, não é de descartar que, de uma maneira ou outra, Mike Pence e Kamala Harris passem de número dois a número um no futuro. É tudo uma questão de probabilidades. |
O que aconteceu esta semana |
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- Convenção do Partido Republicano
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Depois dos democratas, foi a vez de os republicanos se juntarem perante o país. A convenção propriamente dita foi em Charlotte, na Carolina do Norte, mas os momentos principais foram bem longe dali. Sem intervalos para música ou festa, a convenção fez-se quase exclusivamente de discursos. À ausência de anciãos do Partido Republicano, a organização respondeu com uma convenção que juntou os mais próximos de Donald Trump, tanto na família (além da primeira-dama, discursaram quatro filhos e duas noras do Presidente) como na base eleitoral (mineiros, polícias, pescadores de lagosta, portadores de armas). A maior parte dos discursos foi no Andrew Mellon Auditorium, em Washington D.C., sem público. O mais importante de todos foi lá perto: na Casa Branca, onde Trump falou para uma plateia com cerca de mil pessoas, sem máscaras nem obrigação de fazerem testes à Covid-19. |
Vale a pena focar nos 70 minutos de Trump, já que foi uma súmula dos restantes da convenção. Varrendo os seus quase quatro anos de poder, o Presidente dos EUA gabou-se de ter construído “a maior economia da História” e de, com ela, ter melhorado a qualidade de vida de todos os norte-americanos — com especial atenção aos afro-americanos, que tiveram números recorde de emprego, o que levou Donald Trump a dizer “modestamente” que fez mais por aquela comunidade que “qualquer Presidente desde Lincoln”. Houve também espaço para prometer o desfecho rápido de dois projetos: um de longa data, o muro, que Trump disse estar “perto de ser completado”; e outro mais recente e urgente, a vacina “segura e eficaz” para a Covid-19, que o Presidente dos EUA diz que vai estar pronta “este ano”. |
O retrocesso de tudo isto, garantiu, seria uma presidência de Joe Biden. Trump descreve o democrata como um “cavalo de Tróia do socialismo”, que quer impor ao país um novo confinamento — uma “rendição ao vírus” — e cuja governação deixaria uma certeza quanto à política internacional: “A China vai mandar no nosso país se Biden ganhar”. Ainda mais insistentemente, o atual Presidente acusou o adversário de querer tirar financiamento aos departamentos de polícia de todo o país — algo que o próprio nega. “Ninguém vai estar seguro na América de Biden”, garantiu Trump. |
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- Violência policial e motins em Kenosha, Wisconsin
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Na tarde 23 de agosto, a polícia foi chamada a uma ocorrência em Kenosha, no Wisconsin, depois de receber uma chamada de uma mulher. Segundo a queixosa, o namorado insistia em entrar em sua casa contra a sua vontade. Chegados ao local, dois polícias tentaram deter o suspeito, com recurso a descargas elétricas. Este resistiu e dirigiu-se até ao carro, onde os seus três filhos estavam sentados no banco traseiro. Achando que o homem pegava numa faca — que seria depois encontrada dentro do carro —, um dos dois polícias disparou sete tiros sobre ele. O suspeito foi atingido em vários órgãos e ficou paraplégico — mas não corre perigo de vida. |
Rapidamente “este homem”, “ele” e tantas outras designações foram substituídas por um nome: Jacob Blake. Afro-americano de 29 anos, o seu nome passou a figurar na lista de negros vítimas de violência policial no momento da detenção. E rapidamente este novo caso se assemelhou ao de George Floyd, com manifestações pacíficas a tornarem-se violentas, com incêndios nas ruas, montras partidas e lojas saqueadas. A violência subiu ainda mais de tom quando Kyle Rittenhouse, um menor de 17 anos do Illinois, viajou àquele estado vizinho munido de uma AR-15, com o pretexto de querer defender a cidade dos motins. Acabou por usá-la para matar dois manifestantes, mesmo em frente à polícia, que não o deteve no momento. Os motins continuaram, pelo menos, até domingo, sem fim à vista. |
Quanto a reações políticas, houve três tipos. Primeiro, Trump (que vai a Kenosha esta terça-feira, numa visita cujos contornos são ainda desconhecidos) insistiu junto do governador do Wisconsin, o democrata Tony Evers, para aceitar o envio de agentes federais (polícia militarizada) — o que acabou por acontecer. Depois, do lado democrata, Biden falou com a família de Jacob Blake — e, num vídeo, disse que aquela ação policial lhe causava “nojo” e que os motins eram “violência desnecessária”. Enfim, a resposta do mundo do desporto norte-americano. Começou tudo com um boicote dos Milwaukee Bucks (a maior equipa de basquetebol do Wisconsin) a um jogo da NBA — e rapidamente toda a NBA e a WNBA passaram a fazer o mesmo, além das principais ligas de basebol e futebol. |
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- Número de infetados com Covid-19 ultrapassa os 6 milhões nos EUA
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Os EUA voltaram a atingir uma nova marca no número de casos, ultrapassando agora os 6 milhões de infetados. De acordo com a Johns Hopkins University, os EUA têm, à altura em que escrevo esta newsletter, um total de 6.002.615 casos positivos. É a maior fatia dos 25.259.201 casos registados em todo o mundo. |
De acordo com os números oficiais, que dizem respeito a uma estimativa de julho de 2019, a população dos EUA é de 328.239.523. E a população mundial, de acordo com estimativa das Nações Unidas, é de 7,8 mil milhões — mais propriamente 7.794.798.729. |
Isto quer dizer que os EUA têm 4,2% da população mundial, mas 23,8% dos casos registados em todo o mundo — uma desproporção preocupante, mas que deverá, ainda assim, ser lida à luz do facto de os EUA serem um dos países com maior número de testes por 100 mil habitantes. |
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os nossos especiais
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Eleições EUA
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Num discurso de 70 minutos, Donald Trump enalteceu o seu primeiro mandato — e comparou-se até a Lincoln. Sobre o futuro, colocou duas hipóteses: ou o regresso à "grandeza" ou o "socialismo" de Biden.
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Eleições EUA
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Além de Donald Trump, na segunda noite da convenção republicana falou a mulher, Melania Trump, e dois filhos. Cada um à sua maneira seguiu as pisadas do patriarca — com especial atenção para os media.
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Violência Policial
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Protestos pacíficos da tarde transformaram-se, apesar do recolher obrigatório, em imagens de destruição. Cidade do Wisconsin está a ferro e fogo após um homem negro ter sido alvejado pela polícia.
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Estados Unidos da América
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Kamala Harris é uma mulher de respostas prontas — e Biden foi quem mais sofreu com isso. Agora, chamou-a para o seu lado. De que forma pode ajudá-lo? Em parte, com as suas próprias contradições.
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o que se escreve lá fora
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agenda para a semana
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