Quando é que a hora da refeição se tornou um momento de preocupação? Quando é que o jantar passou a ser um penoso conjunto de minutos em que todos tentam não olhar para o prato da adolescente mas não o conseguem evitar? Quando foi a a última vez que a viu comer com prazer e sem culpa? E quanto tempo passou até se aperceber que havia um problema aí em casa e é preciso lidar com ele? |
Evitar o assunto não adianta. Fazer comentários constantes sobre a pouca comida que ela ingere não adianta. Perguntar a toda a hora “mas tu só comes isso?” não adianta. Gritar não adianta. Castigar não adianta. Criticar em surdina não adianta. Não falar de anorexia ou bulimia não adianta. |
O que adianta, então? Bom, para começar, pedir ajuda. Chega a um ponto em que é mesmo necessário recorrer ao apoio de um profissional de saúde mental. Que ajude a explicar o que é uma perturbação do comportamento alimentar, de onde vem, o que pode ser feito para lidar com ela e como se pode ajudar aquela jovem ou adolescente e a família. |
É verdade que estou a usar o género feminino, mas apenas porque é isso que as estatísticas dizem, como se pode constatar neste vídeo. No mais recente episódio da série O Médico dos Malucos e Outros Mitos sobre Saúde Mental, o psiquiatra Gustavo Jesus conversa com a jornalista Sara Antunes de Oliveira sobre algumas falsas verdades que é importante desmontar sobre anorexia e bulimia. E, claro, tocam na questão do género. |
Uma pesquisa rápida no Google é bastante esclarecedora. Mesmo que se enviesem um pouco os resultados, juntando “anorexia” ou “bulimia” a “atriz”, “modelo” ou “cantora”, o motor de busca devolve de imediato dezenas de ligações sobre estas perturbações do comportamento alimentar e figuras públicas que admitem que, em algum momento das suas vidas, já passaram por elas. |
Num mundo acelerado, muito centrado na imagem, com o culto do corpo e da forma física a servir de fundo a uma série de ocupações do mundo do entretenimento, poderá tornar-se fácil encontrar terreno fértil para o desenvolvimento de perturbações destas. As fotografias no Instagram, os videoclips das canções, as sessões de imagem para as revistas, os concertos, os filmes, as partilhas na praia, as presenças na televisão. |
Mas se a adolescente ou jovem que tem em casa e com quem já passou por algumas situações descritas no primeiro parágrafo não é uma figura pública e não precisa de estar constantemente em forma para com isso ganhar a vida, porque é que estes problemas graves de saúde mental chegaram a esse ponto? Bom, esse é outro ponto para falar com o psicólogo ou psiquiatra. Ou ambos. |
Haverá várias formas de lidar com estes desafios, mas começar por associá-los a vaidade é bem capaz de ser meio caminho andado para — aí sim — enviesar a causa destas questões. Falar de vaidade ou de “preocupação excessiva com a imagem” é não só uma forma de menorizar o que pode ser um grave problema de saúde como pode até revelar alguma insensibilidade sobre o tema. |
Embora a pressão social posso ter o seu efeito, o certo é que há fatores genéticos que podem predispor para o aparecimento destes comportamentos, e muitos deles andam até “de mão dada” com outras doenças mentais, como é o caso da Perturbação de Hipertatividade e Défice de Atenção. Esta é uma das ligações que Gustavo Jesus faz neste episódio. Mas o psiquiatro vai mais longe e explica algumas diferenças entre estas perturbações mais frequentes. Fala de comportamentos restritivos, da pressão do ambiente exterior, de comer compulsivamente. E fala de culpa e remorsos depois da refeição. Essas terríveis sensações que a sua filha agora, fechada no quarto, pode estar a sentir após o jantar. |
O programa O Médico dos Malucos e outros Mitos sobre Saúde Mental faz parte da secção do Observador totalmente dedicada à saúde mental. Sobre este mesmo tema das perturbações do comportamento alimentar é lá que pode encontrar também… |
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Entretanto, estas são as reportagens mais recentes do Mental, a secção do Observador totalmente dedicada à saúde mental: |