Passou menos de meio ano desde que António Costa, notoriamente feliz com a vitória da extrema-esquerda na Grécia, afirmou taxativamente que a “vitória do Syriza é um sinal de mudança que dá força para seguir a mesma linha”. O entusiasmo do líder do PS com a vitória do Syriza foi tanto que aparentemente se esqueceu que, nessas mesmas eleições, o PASOK, partido irmão do PS português na Internacional Socialista, registou a sua mais pesada derrota histórica, praticamente desaparecendo do mapa eleitoral grego.

Desde Janeiro, muito mudou. Os amanhãs cantados para a Grécia sob governação da esquerda radical tardam em concretizar-se, as tropelias da dupla Tsipras-Varoufakis sucedem-se e o Syriza tem vindo, em consequência, gradualmente a perder credibilidade entre muitos que, na esquerda europeia, inicialmente olharam com simpatia para aos resultados eleitorais gregos. O próprio António Costa arrepiou caminho e veio em Maio classificar como “tonta” a acção do Syriza junto da UE.

No entanto, no interior do PS, muitas vozes influentes continuam a insistir nas manifestações de apoio ao governo de extrema-esquerda grego. Por exemplo, a deputada do PS Isabel Moreira escreveu ainda esta semana que “assistimos à humilhação da Grécia e dos gregos” porque estes “atreveram-se a fazer uma escolha que não agrada à Alemanha”. Para a seguir concluir: “As medidas de desastre social impostas – recomendadas – a uma Grécia já a sangrar, mas em todo o caso com um povo soberano que apoia o Syriza, nunca resultarão num acordo.”

Alguns poderão descartar a opinião de Isabel Moreira por falta de peso na estrutura do PS, mas o mesmo não pode ser dito de outros exemplos. Tiago Barbosa Ribeiro, o recentemente eleito líder do PS Porto e uma estrela em clara ascensão no partido, comentou a muito difundida imagem de Varoufakis sentado no chão numa reunião do Syriza no parlamento grego da seguinte forma: “Varoufakis ontem no Parlamento da Grécia. Sentado na casa do soberano, o povo. De pé contra os credores e os salteadores. Que não ceda.” Por sua vez, João Galamba, uma das mentes mais brilhantes na Assembleia da República e cada vez mais a principal referência intelectual do Partido Socialista (em especial em matérias económicas) tem também ao longo do tempo manifestado de forma consistente a sua admiração por Varoufakis.

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Daqui resulta uma equação de difícil resolução para o PS, que continua ambivalente entre duas posições incompatíveis. Se por um lado é certo que houve uma tentativa de aproximação ao centro através da colaboração de figuras como Mário Centeno e Manuel Caldeira Cabral, por outro é indisfarçável que uma parte significativa das elites do PS continua perigosamente atraída pelo radicalismo do Syriza. Essa atracção explicará aliás em parte a recepção muito pouco entusiástica em importantes segmentos do partido ao relatório “Uma década para Portugal”.

Os tradicionais partidos socialistas europeus enfrentam, em geral, uma escolha inevitável e inadiável: ou estão com o radicalismo do Syriza e a ruptura institucional ou se apresentam como alternativa política dentro do quadro estabelecido. Mas essa escolha afigura-se especialmente difícil para o PS, dados os notórios e persistentes sinais de atracção pela via do Syriza. É também por isso importante seguir com atenção o que se passa na Grécia e levar a sério o que sugeriu ainda há poucos meses o candidato a primeiro-ministro António Costa: a linha do Syriza pode muito bem ser o modelo para o próximo Governo de Portugal.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa