Foi importante a chamada telefónica de Trump e depois de Bolsonaro a Modi, pedindo para levantar a bloqueio de venda da Hydroxychloroquina aos EUA e ao Brasil. Aquele produto é usado para combater a malária e, agora, também parece resultar bem contra o vírus. Oxalá que sim, para alívio dos infetados e para salvar vidas.

Por causa da sua utilidade veio a restrição, para saber se as necessidades da Índia estavam asseguradas, bem como as dos países vizinhos que lhe compram os produtos farmacêuticos. Há, por isso, uma obrigação moral a respeitar, quando se levanta o embargo à exportação aos países que dele possam necessitar.

Ao ver que não tinha problemas de cumprir as obrigações, depressa se anunciou que forneceria a todos os países em necessidade. E veio o agradecimento dos dois Presidentes, aliviados com o embarque rápido do fármaco para os seus países.

A atitude de Trump começou com arrogância e ameaça de retaliações. Mas apesar do arranque “saloio”, deu grande projeção aos produtos indianos, ao ser o próprio presidente dos EUA a requisitá-los, sem cerimónias. A um país com os recursos militares dos EUA, faz muito bem a humildade de procurar um fármaco na Índia! Também outros países como o Reino Unido, a Espanha, Alemanha e Israel já estarão a receber as encomendas do medicamento.

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Reinava um “complexo de fidalguia” nalguns países europeus para comprar genéricos. Em Portugal, também por causa da comparticipação do Estado e para não esbanjar o dinheiro público, um Ministro obrigou a indicarem na farmácia os preços dos produtos genéricos equivalentes, a par do produto da receita, para o cliente fazer a opção. E os genéricos rapidamente entraram nos hábitos de compra. Quem vai gastar a mais, quando tem a garantia de que o produto genérico, com o mesmo  princípio ativo é igualmente eficaz?

Há anos tive uma surpresa quando fui adquirir um produto, com receita médica. Disseram-me custar 19 euros. Pareceu-me caro, nunca tinha pago um valor tão alto. Perguntei se teria genéricos, ao que me responderam que sim, havia um indiano, que custava 1,5 euros! Pois é esse que quero…, como faria qualquer cidadão sensato.

Existe, felizmente, o organismo FDA-Food and Drug Administration, nos EUA, que presta um valioso serviço aos laboratórios farmacêuticos indianos e de todo o mundo ao certificá-los e a cada um dos seus produtos, com inspeções frequentes. Assim, os produtos certificados podem ser vendidos nos EUA. E hoje, cada vez mais, países de quase todo o mundo, seguem a aprovação da FDA, que parece ser de grande rigor e totalmente fiável.

Nalguma ocasião referi a uma notável Conferência de Imprensa convocada em Londres pelo então Presidente dos Laboratórios Cipla, de Mumbai, Yussuf Hamied, em Junho de 2001. O ponto central era anunciar que a partir desse dia a Cipla venderia o seu produto contra a SIDA pelo preço de $1 /por dia, ou seja, $365/ano. O anúncio caiu como uma bomba! Houve gritaria e protestos… de todas as multinacionais: vocês não fazem Investigação…estragam o mercado, etc.

Hamied terá pensado bem que não lhe importavam os argumentos das multinacionais, pois tinha claro que a sua obrigação era de não “deixar morrer a esperança” dos que sofriam dessa doença, por não poderem pagar exorbitâncias por um produto novo, com baixo custo de produção. Eram muitos os que morriam na altura, com a SIDA.

Esclareço que aqueles laboratórios multinacionais (mais de 5 ou 6), vendiam o seu produto original para a SIDA pela módica quantia de $10.000/ano (Cfr. Fortune, 25 de Junho de 2001).

A Cipla, vendia três produtos num só, enquanto as multinacionais vendiam três produtos diferentes, para tomar diariamente, com as complicações de enganos e esquecimentos, talvez para justificarem um preço tão absurdo que cobravam.

Na altura não haveria 200.000 pessoas a tomar o anti-SIDA. Só os muito ricos ou a quem o Serviço Nacional da Saúde comparticipasse podiam dar-se ao luxo de o comprar. Hoje serão mais de três dezenas de milhões a sobreviver e levar uma “vida normal”. Desses, cerca de um terço utiliza os produtos da CIPLA e muitos usam outros genéricos “made in Índia”.

A atitude de Hamied deu grande notoriedade aos genéricos indianos e a toda a produção farmacêutica do país. Agora, com a pandemia e a busca do remédio para as necessidades imediatas, parece ter havido um reforço da notoriedade dos fármacos indianos, em todo o mundo.

Mumbai, 22 de abril de 2010