Marcelo veio agora pedir um pacto entre os maiores partidos na área da Saúde. Em Portugal, quem quer ficar bem na fotografia pede um pacto e creio que essa foi a intenção do Presidente. Não só porque este é um momento em que está politicamente vulnerável, mas também porque quem pede um pacto dá de si a imagem de consensualizador. Afinal está implícito que o pacto só não se consegue porque os outros só não aderem ao pacto por interesses ocultos, segundas intenções ou, o que para o caso vai dar ao mesmo, por cálculo político. Mas não só. Pedir um pacto para a Saúde é muito fácil porque, em 2024, o pacto para a Saúde não mudaria nada no estado do SNS. Oito anos de governação socialista, durante os quais o Presidente foi irresponsavelmente conivente com medidas como a aprovação das 35 horas para os trabalhadores do SNS, afastaram os portugueses do SNS, quer como utentes quer, ironia das ironias, como trabalhadores. Nada disto se resolve com pactos, mas sim com competência e pondo os interesses dos utentes em primeiro lugar.

Mas se o Presidente quer mesmo promover um pacto pode e deve virar-se para a Segurança Social, uma área em que um pacto é talvez a única forma de salvar da pobreza os actuais contribuintes e futuros pensionistas: segundo as projecções da Comissão Europeia, o valor das reformas vai cair para quase metade nos próximos anos. Actualmente o valor da reforma é equivalente a 84,9% do último vencimento. Em 2050 será de 43,5%. (As almas pias que andam para aí a dizer como quem reza um credo que os imigrantes estão a salvar a Segurança Social já pensaram que esses imigrantes terão uma reforma proporcionalmente muito mais baixa que aquelas que eles agora pagam?)

A degradação do valor das pensões não só é um tabu como a política dos pagamentos extraordinários inaugurada por Costa e prosseguida por Montenegro reforça a ilusão de que está tudo bem. Pior, agrava a politização da gestão da Segurança Social: cada vez menos o que se recebe é visto como o resultado de uma carreira contributiva, mas sim como o resultado da bondade de quem governa.

A opção do PSD de Rio e agora de Montenegro em não defender a importância dos governos de Passos levou não só a que Costa agarrasse a bandeira das contas certas como permitiu que se instalasse o dogma de que então se tinha governado contra os pensionistas. O resultado está aí à vista de todos no que se pode designar como política vice-versa: como se distinguem os pagamentos extraordinários de Costa dos de Montenegro? Não distinguem. Montenegro encurrala Pedro Nuno Santos ao anunciar os pagamentos extraordinários porque o líder socialista gostava de anunciar o mesmo. E, valha a verdade, podia fazê-lo nos mesmos termos.

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Sim, nós temos muitos problemas por não existir continuidade nas políticas, embora essa falta de continuidade só cause preocupações quando o governo deixa de ser socialista. Mas os nossos dramas resultam precisamente do contrário: da continuidade. Basta olhar para a Segurança Social para o percebermos. Arriscamos que quem se reformar em 2050 tenha uma reforma por metade do que teria actualmente porque em matéria de Segurança Social vivemos a continuidade.

Sim, faz-nos falta um pacto nesta área. Não para que exista a continuidade do tal empobrecimento silencioso, mas sim para que se possa fazer a ruptura indispensável que o minore. Mas disso o Presidente não quer ouvir falar. E Montenegro também não. E Pedro Nuno Santos ainda menos. É o chamado consenso vice-versa: aquele assunto-momento em que cada um pode dizer ou fazer o mesmo que o seu contrário. É precisamente esse o ponto em que a linha do empobrecimento se cruza com a da mediocridade. Podem chamar-lhe sina. Eu chamo mediocridade.

Um passe para a GP – Greves de Portugal. No Pontal, Luís Montenegro anunciou o passe ferroviário a 20 euros e logo o país desatou a fazer contas sobre as vantagens e desvantagens deste anúncio. Mas não adianta fazer contas e muito menos criticar ou elogiar o Governo por este anúncio pois custe o passe o que custar em muitos dias ele não serve para nada porque a CP na verdade não é CP – Comboios de Portugal  mas sim GP – Greves de Portugal. Estava Montenegro no Pontal a anunciar o passe ferroviário a 20 euros e já decorria a greve convocada pelo Sinfb e pelo Stmefe, respectivamente Sindicato Independente Nacional dos Ferroviários  e Sindicato dos Trabalhadores do Metro e Ferroviários, entre 9 e 31 de Agosto. Entretanto o Sinfb já convocou uma nova greve entre 29 de Agosto e 9 de Setembro, a partir da sexta hora de serviço e ao trabalho extraordinário.

Tendo em conta o muito que os contribuintes pagam à CP pelo serviço público de transporte o que precisamos não é tanto que os passes baixem (o que só aumenta ainda mais o valor a transferir para a CP), mas sim que a CP preste o serviço de que praticamente detém o monopólio em Portugal: transportar os passageiros dentro dos horários previsto.

Lusa, a nossa agência “noticiosa”: “Milhares de opositores reclamam por “verdade” e Maduro mobiliza caravana motorizada”. Esta verdade entre aspas usada no texto da Lusa logo replicado em várias notícias é um bom símbolo da forma como a agência Lusa nos mostra o mundo: os opositores a Maduro pedem “verdade”. Cautelosa a nossa Lusa coloca verdade entre aspas porque como é mais que óbvio quem pede verdade pode estar a mentir e portanto usam-se aspas, faz-se uma citação e fica tudo acautelado. Curiosamente  ao mesmo tempo que coloca aspas na verdade exigida pelo opositores a Maduro, a nossa Lusa (sim, todos nós contribuintes somos obrigatoriamente accionistas da Lusa) escreve sem aspas “Mortos em Gaza ultrapassam os 40.000″ A fonte deste número é o Ministério da Saúde de Gaza controlado pelo Hamas, que para a nossa Lusa merece uma credibilidade várias vezes superior à oposição venezuelana e portanto está dispensado de ter as suas declarações entre aspas.
Nada disto espanta na Lusa. O que espanta e deve suscitar perguntas é a opção do Governo de Luís Montenegro de enterrar ainda mais dinheiro dos contribuintes na Lusa. Note-se que o Estado português já era maioritário na Lusa, mas os 50,15% que aí detinha passaram em Julho deste ano a 96 % quando o Governo de Luís Montenegro comprou as participações da Global Media e da sua accionista maioritária Páginas Civilizadas no capital da Lusa. Não sei quais os planos governamentais para a Lusa mas, para começar, vale certamente a pena que a Lusa explique aos seus accionistas, ou seja a todos nós, quais os seus critérios para o uso de aspas. Ficava tudo mais claro, o que é naturalmente de agradecer.