Apesar do seu nome feminino – A Portuguesa – há quem entenda que o hino nacional é machista e, portanto, deveria ser corrigido, de acordo com o moderno paradigma da igualdade de género. Com efeito, alguém recentemente publicou, no Twitter, esta pérola: “Que o nosso hino nacional diga ‘heróis do mar’ e não ‘heroínas do mar’ diz tudo sobre o vasto caminho que ainda temos que percorrer no que toca à igualdade de géneros.”
É verdade que a inicial referência aos “heróis do mar” poderia parecer masculina, sobretudo para quem desconhece a língua portuguesa, como masculino é também o “nobre povo” que, de imediato, o hino refere. Contudo, o plural masculino, ao contrário do feminino, abarca os dois géneros e, por isso, ‘heróis’ inclui também as heroínas, enquanto que ‘heroínas’, pelo contrário, exclui os heróis. Por outro lado, se “nobre povo” é masculino, é feminina a “nação valente” que de imediato A Portuguesa menciona, pelo que há, no hino nacional, um certo equilíbrio entre expressões masculinas e femininas.
Não se justifica, pela mesma razão, a redundante expressão ‘portuguesas e portugueses’, ou ‘irmãs e irmãos’ porque o último termo engloba todos os cidadãos nacionais, bem como todos os fiéis, ou filhos dos mesmos pais. Também os ‘doentes’, ou ‘colegas’, ou ‘presidentes’, ou ‘montanhistas’, ou ‘transeuntes’ são todos os que, qualquer que seja o seu sexo, respectivamente padecem uma enfermidade, partilham o mesmo trabalho, presidem a uma organização, escalam montanhas ou transitam pela via pública. Admita-se uma excepção, para a curial expressão ‘minhas senhoras e meus senhores’ porque, neste caso, mais do que negar que o plural masculino também inclui os sujeitos do género feminino, pretende-se ter uma especial deferência para com as senhoras presentes. Mas seria absurdo, embora não seja infrequente, que todas as vezes que um orador se dirigisse ao público, o fizesse nesses termos pleonásticos.
A disparatada invenção de um termo expressamente feminino – ‘presidenta’, etc. – em boa lógica deveria levar à criação de um correspondente masculino, já que estes termos – presidente, estudante, doente, artista, etc. – são neutros quanto ao género. Ou seja, se a mulher que preside é ‘presidenta’, e não presidente, por que razão o homem que dirige não há-de ser ‘presidento’?! Portanto, se há ‘presidentas’, também deveria haver ‘presidentos’, ‘estudantos’, ‘doentos’, ‘artistos’, etc.
No Twitter citado propõe-se que, em vez de “heróis do mar”, o hino nacional se refira às “heroínas do mar”, que não constam na nossa História trágico-marítima. Nos Descobrimentos não se conhecem personagens femininas, excepto as míticas tágides, ou as anónimas mulheres que, no inspirado dizer do autor da Mensagem, verteram as lágrimas a que o mar deve o seu sal.
Se é verdade que a empresa ultramarina foi essencialmente, senão mesmo exclusivamente, masculina, não o foi por incúria feminina, mas porque então não eram admitidas mulheres nas tripulações das naus que se fizeram ao mar. Mas hoje não faltam profissões em que há uma clara predominância feminina, sem que isso aflija os exaltados defensores da tão propalada igualdade de género. Na medicina e na enfermagem, na educação de infância e no ensino, na magistratura e na advocacia, na assistência social, etc., há uma clara predominância feminina. Depois de ultrapassada – e bem! – a injusta proibição de as mulheres acederem a algumas profissões, assiste-se agora ao fenómeno inverso: nalguns ofícios, são os homens que estão em minoria!
É razoável que o Estado garanta, à partida, o acesso de todos os cidadãos, qualquer que seja o seu sexo, a todas as funções, mas sem esquecer que, iguais em dignidade, direitos e obrigações, homens e mulheres não são fisicamente iguais. A diferença natural é uma evidência, que é manifesta na prática desportiva: não faria sentido, por hipótese, que os homens e mulheres competissem em plano de igualdade e, por isso, as competições desportivas são femininas, ou masculinas, mas não mistas. A igualdade estipulada na Constituição não pode esquecer as discriminações que são exigidas pela ordem natural.
Para além das exigências decorrentes da natureza, é razoável admitir, numa etapa transitória, vantagens a favor do sexo mais desfavorecido, para que desse modo se corrijam condições iniciais diferenciadas. Mas, garantida a equivalência inicial, qualquer medida discriminatória posterior violaria o princípio constitucional da igualdade, que deve ser aferido à partida, mas sem beneficiar quem não mereça, em detrimento de quem, embora de outro sexo, é mais capaz.
Seria razoável que, para contrariar a predominância de alunas nas Faculdades de Medicina, se impusesse uma quota de alunos do sexo masculino?! Claro que não! O acesso a esse curso deve ser assegurado por um critério objectivo de seleção, pois não seria justo que alguém fosse preferido, ou preterido, em função do seu sexo. Se há rapazes que querem ser médicos, a solução não é criar uma quota masculina, mas ajudá-los para que consigam as notas necessárias para esse efeito.
Salvo melhor opinião, a solução para as assimetrias não deve passar por medidas protecionistas, pois seria humilhante que uma pessoa fosse escolhida para uma função só por razão do seu sexo, e não pelas suas qualidades e aptidões pessoais. É muito bom que no Parlamento, como no Governo, no Supremo Tribunal de Justiça ou nas Forças Armadas, haja mulheres e homens, mas cada qual no lugar que lhe corresponda pelas suas qualidades pessoais, não como representante ‘corporativo’ do seu sexo.
Portugal precisa de pessoas competentes e honestas, quer sejam mulheres ou homens. É preferível um órgão exclusivamente feminino, ou masculino, se esse for, efectivamente, o que melhor serve o país, do que paritário, se a distribuição das funções pelos dois sexos se fizer com prejuízo dos méritos individuais. Se a escolha das pessoas obedecer a critérios sexistas, é de prever a mediocridade da administração pública e das empresas, porque as pessoas não serão escolhidas pelas suas qualidades pessoais, mas pelo seu sexo, ou por outras razões alheias ao bem comum.
Não constam ‘heroínas do mar’, mas há muitas heroínas nos órgãos de soberania, nas empresas, na administração pública, no desporto, na arte, na família, no laboratório, no hospital, na escola, junto dos mais necessitados e dos mais pobres dos pobres, como Santa Teresa de Calcutá e tantas outras heroínas cristãs.
Quando Deus se fez homem, prescindiu de um progenitor masculino, mas quis ter uma mãe: Maria é a única criatura que, não só é Mãe de Deus, como também foi concebida sem pecado original – ou seja, é imaculada – e subiu ao Céu em corpo e alma. Por isso, está muito acima dos apóstolos, profetas, mártires e santos. Maria é a única criatura a que é reconhecida a santidade superlativa: é santíssima! Se é, por graça de Deus e mérito próprio, a primeira das criaturas humanas, não é por nenhuma sua exigência ou reivindicação, mas porque foi a primeira no serviço e no amor.