Começo por afirmar que não tenho outra motivação ao partilhar esta reflexão, que não seja a do Interesse Nacional. E principio por formular ardente voto para que se dispa a verdade de enganadoras roupagens e que ela regresse nua à praça pública, de modo a que o apontar de um erro não possa ser apodado de ataque partidário ou simples oposição ideológica. Posto isto pergunto:
O que têm a TAP e o NAL em comum? A resposta na minha opinião é: Padecem de ausência de estratégia resultante da incapacidade crescente dos partidos do arco do poder, para convergir em soluções políticas adequadas e eficazes, e estabelecer pactos de regime visando a obtenção de objetivos de interesse nacional de longo prazo.
Daí a inépcia por parte dos sucessivos governos democráticos no que à política de transporte aéreo e à política aeroportuária diz respeito.
Este “mal” é geral e transversal a todas as outras áreas tuteladas pelos diferentes ministérios e é suportado e agravado pela excessiva partidocracia e evidente diminuição gradual, de um modo geral, da qualidade individual (académica, profissional, ética e moral), dos que à causa pública se dedicam e que, encastrados partidariamente, vão trepando os degraus do poder conseguindo surpreendentemente (até para os próprios) atingir cargos e lugares cimeiros.
Não tenho dúvidas que no nosso País, quer a TAP quer o NAL, deveriam constituir dois importantes ativos estratégicos.
Acredito que a operação em HUB e crescimento da primeira, com tudo o que isso implica de receitas e ganhos públicos e privados, dependia de uma boa e atempada decisão de construção e implementação do segundo. Para que isto continuasse a verificar-se após a venda da ANA (Aeroportos de Portugal) à VINCI, os interesses da nova e atual concessionária teriam de ser convergentes com os interesses de Portugal, o que à partida logo anteciparia como sendo difíceis ou impossíveis de conciliar. Aqui uma vez mais esteve ausente a estratégia.
Entretanto, constatámos atónitos que os sucessivos governos de Portugal das últimas duas décadas foram sucessivamente decidindo que o NAL fosse anunciado nos meios de comunicação, para inicialmente ficar “definitivamente localizado na Ota”, com a mesma convicção com que depois foi anunciada a sua “definitiva localização em Alcochete” e posteriormente uma vez mais anunciada com idêntica convicção e sem alternativa, a sua “localização definitiva no Montijo”.
E atualmente, após tanto dinheiro dos contribuintes esbanjado nestes estudos (nos projetos económico-financeiros, na contratação de sociedades de advogados, e de gabinetes técnicos, de arquitetura e de estudos de impactos ambientais), recursos estes difíceis de serem contabilizados; e num momento em que o Aeroporto Humberto Delgado já presta um péssimo serviço aos passageiros e utentes e está muito próximo da saturação, estamos novamente na estaca zero a aguardar quase mais um ano até que seja tomada mais uma (definitiva?) decisão. E apenas para decidir onde o localizar.
Após a decisão da localização e até se iniciar a construção e finalização da obra, sobretudo se for faseada, decorrerá provavelmente o tempo de mais outra geração… se tudo correr bem!
Por outro lado, a TAP tem vindo ao longo destes últimos tempos a abrir os noticiários pelos piores e mais rocambolescos motivos. Inicialmente de forma esporádica e depois gradualmente com maior incidência, até atingir uma frequência quase diária. Nos últimos meses, as notícias sucedem-se, ilustrando até à náusea as trapalhadas da gestão.
Os problemas não resultam da falta de produtividade dos seus tripulantes ou trabalhadores, mas residem na gestão da empresa, cuja responsabilidade tem sido assegurada pelo Estado desde 1975, através dos respetivos governos dos vários partidos que os integraram, excetuando o curto prazo em que esteve privatizada.
Consequentemente, a opinião pública sobre a TAP alterou-se, inclusivamente a de alguns jornalistas que reiteram na televisão, perante as recentes vergonhosas e indecentes evidências, que afinal os problemas da TAP não têm tido origem nos seus trabalhadores que, com avultados cortes salariais, e sob enorme pressão mediática durante tanto tempo, contribuem abnegadamente com o seu profissionalismo e dedicação para que a empresa apresente resultados positivos.
A segurança de vôo não pactua com a pressão mediática exagerada e prolongada sobre pilotos e trabalhadores de manutenção de uma empresa de transporte aéreo.
Quem entende de segurança de vôo e estuda a problemática dos fatores humanos na aviação, sabe que pressões exógenas em excesso são perigosas e altamente desaconselháveis, uma vez que afetam o foco e concentração de quem tem nas mãos centenas de vidas humanas. O mesmo se passa relativamente aos controladores de tráfego aéreo.
Neste momento a TAP atravessa uma situação de “semi autogestão” aplicando um plano de recuperação pago pelos contribuintes sob o olhar atento de Bruxelas. Para a sua boa execução em nada contribui uma administração desfalcada, parcialmente demitida e desmotivada, a discutir na praça pública as divergências e problemas internos, mas ainda em funções.
E é nestas circunstâncias que a TAP vai ser privatizada?
Relembro que tendo nascido por iniciativa privada, a TAP foi posteriormente nacionalizada depois do 25 de abril, reprivatizada em 2015 e recentemente novamente nacionalizada.
Vai ser então uma vez mais privatizada, pelo mesmo atual Primeiro-Ministro que defendia há pouco tempo que deveria ser pública, e que reverteu a sua privatização, renacionalizando-a de seguida.
E é este Primeiro-Ministro que, perante tudo isto, “se finge de morto” ao afirmar que aguarda o final da Comissão Parlamentar de Inquérito para daí retirar consequências políticas, e se esquece que uma gestão responsável e credível da TAP não pode esperar…
Urge assim, antes de mais, que sejam tomadas medidas no sentido de devolver a serenidade à empresa, de a retirar dos holofotes da comunicação social repondo as condições de “governance” e liderança, que motivem os colaboradores e projetem o crescimento da empresa, recuperando a sua boa reputação junto dos seus clientes, parceiros, fornecedores e potenciais compradores.
E a propósito de reputação, qual a que passamos para fora do país? Como explicar a um contribuinte ou amigo europeu esta forma de gerir as empresas estatais (quase centena e meia delas), em Portugal? Ou será que a TAP é a única gerida desta forma? E por outro lado, como se explica o desperdício sem escrúpulos e impune, dos dinheiros públicos em estudos que suportam obras públicas que… não existem?
A semelhança de “certezas e convicções” entre a TAP e o NAL e sobretudo as constantes alterações de rumo e de rota que ambos têm vindo a sofrer, levar-me-iam a dizer que pior é impossível, mas por razões que aqui ficaram bem claras, já não me atrevo!