A implantação nacional do PSD garante-lhe que não seguirá a curto prazo o destino do CDS mas a liderança de Luís Montenegro poderá muito bem ser a última oportunidade para o PSD manter a sua posição como um dos dois grandes partidos nacionais e alternativa natural de governação ao PS. Se Montenegro e quem o acompanha não forem capazes de inverter a trajetória de declínio do PSD, é bem possível que os resultados das legislativas de 2022 se apresentem apenas como um primeiro passo decisivo no sentido da reconfiguração do espaço da direita portuguesa no sentido do padrão mais comum no resto da Europa. Não é demais recordar que em múltiplos países europeus – com destaque para vários sociologicamente e culturalmente mais próximos de Portugal, como França, Espanha e Itália – os partidos tradicionais de centro-direita têm visto parte substancial do seu espaço tradicional ocupado por novos partidos. Essas novas forças partidárias são diferentes entre si mas todas incorporam pelo menos alguns elementos do que se convencionou designar como radicalismo ou populismo, numa linha cujo representante mais próximo em Portugal é inequivocamente o Chega, liderado por André Ventura.
Apesar de relativamente pouco conhecido, Montenegro tem uma boa imagem e um perfil combativo que pode ser adequado para o actual contexto. Seria no entanto um erro para o novo líder do PSD desvalorizar os riscos da concorrência directa de André Ventura. Importa recordar que, não obstante a elevada taxa de rejeição por amplos segmentos do eleitorado de que padece o líder do CH, Ventura apareceu já em alguns estudos de opinião como sendo percepcionado como o líder da oposição, superando o anterior líder do PSD Rui Rio.
Conforme salientei logo no final do Congresso do PSD, Montenegro enfrenta dois grandes desafios ao assumir a liderança do PSD. O primeiro é o de agregar o partido em torno da sua liderança e promover a unidade interna, algo que Rio nunca foi realmente capaz de conseguir. Relativamente a este objectivo interno, há vários sinais positivos. O anúncio de Joaquim Miranda Sarmento como novo líder do grupo parlamentar, a apresentação de Carlos Moedas como cabeça de lista ao Conselho Nacional (e a maioria expressiva que a sua lista obteve), assim como a apresentação de Paulo Rangel e de Miguel Pinto Luz como vice-presidentes e de Hugo Soares como secretário-geral do partido. Nos últimos dias, a notícia sobre a reaproximação a Santana Lopes reforça esta tendência agregadora. No plano interno, a principal nota negativa diz respeito à reduzida presença de mulheres em posições de destaque, sendo de esperar que figuras como Inês Domingos, Margarida Balseiro Lopes (ambas próximas de Montenegro) e Catarina Rocha Ferreira (próxima de Rio, mas um dos maiores valores de um depauperado grupo parlamentar) possam assumir maior protagonismo nos próximos tempos e ajudar a atenuar a imagem de um partido essencialmente masculino (uma imagem letal em especial para um partido que ambiciona ser catch-all).
O segundo desafio de Montenegro será conseguir afirmar junto do eleitorado uma alternativa de governação capaz de retirar o PS do poder ao mesmo tempo que contém o crescimento de IL e CH, ambos com perfis ideologicamente bem mais marcados do que o PSD e o CDS. A ausência prolongada do poder pode ser fatal para um partido abrangente e ideologicamente ambíguo como o PSD e não é demais recordar que se a actual legislatura tiver a duração expectável com a maioria absoluta o PS estará no poder ininterruptamente entre 2015 e 2026.
Além da promoção da unidade interna, Montenegro esteve bem ao evitar fazer do CH um assunto de destaque ao mesmo tempo que relembrou a absoluta falta de legitimidade do PS que não hesitou em apoiar-se em bloquistas e comunistas para chegar ao poder para vir exigir “cordões sanitários” ao PSD. Está no entanto ainda por demonstrar que consiga construir e afirmar uma ampla coligação política e social que permita ao PSD voltar ao poder. A guerra civil no PS (que passou de latente a aberta), a crise económica e social, a inflação e a cada vez mais notória degradação de muitos serviços públicos poderão gerar oportunidades, mas caberá a Montenegro saber aproveitá-las para se apresentar como uma alternativa de governação credível e ultrapassar a crise existencial do PSD.
Se, à semelhança do que aconteceu com o seu antecessor Rui Rio, Montenegro também falhar, então o PSD poderá perder mesmo o seu estatuto de grande partido, com implicações estruturais e duradouras para o panorama político-partidário português.