Quaisquer conversações, por mais inúteis e longas que possam parecer, são sempre melhor do que um conflito armado. A Rússia conseguiu que o Ocidente finalmente lhe prestasse atenção, os Estados Unidos dizem estar prontos a analisar algumas das preocupações de Moscovo sobre a sua segurança, nomeadamente no que diz respeito à redução dos mísseis de curto e médio alcance na Europa, mas viu recusada a sua exigência de impedir a entrada da Geórgia, Moldávia e Ucrânia na NATO. A bola está nas mãos do Kremlin e vamos ver qual vai ser a resposta de Vladimir Putin à resposta dos Estados Unidos e da NATO.

Entretanto, existe um problema de muito difícil resolução em todo este conflito: o cumprimento dos Acordos de Minsk, assinados no início de 2015 pela Rússia, Ucrânia, França e Alemanha. Este documento visava resolver gradualmente o conflito entre Kiev e os seus territórios separatistas de Lugansk e Donetsk, estes apoiados por Moscovo.

É de sublinhar que esses acordos foram assinados num momento em que as tropas ucranianas sofriam pesadas derrotas na luta contra os separatistas russófonos e “voluntários” russos.

Esta é uma das razões que leva os actuais dirigentes ucranianos a recusarem-se a cumprir o estipulado e a exigirem a sua revisão. Alexey Danilov, secretário do Conselho de Segurança e Defesa Nacional da Ucrânia, declarou a este propósito: “O cumprimento dos Acordos de Minsk significa a destruição do país. Quando eles foram assinados sob a mira dos canhões russos, enquanto os alemães e franceses observavam, todas as pessoas sensatas compreenderam que a realização desses documentos é impossível”.

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Moscovo, pelo contrário, insiste em que o Ocidente obrigue a Ucrânia a cumpri-lo. “Quando foi analisada a situação na Ucrânia, Serguei Lavrov apelou a que, em vez de incentivar a retórica política e equipar as forças armadas ucranianas com vários tipos de armamentos, os Estados Unidos devem utilizar a sua influência sobre as autoridades ucranianas para obrigá-las a cumprir completamente os Acordos de Minsk”, lê-se num comunicado publicado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros após a conversa telefónica entre os chefes da diplomacia norte-americana e russa: Antony Blinken e Serguei Lavrov.

As principais divergências dizem respeito principalmente à ordem como devem ser cumpridos os parágrafos dos acordos. Estes preveem, inicialmente, a realização de eleições nas regiões separatistas após a revisão da Constituição da Ucrânia e a aprovação de uma lei que concede um estatuto especial a Lugansk e Donetsk. Depois, as fronteiras entre a Rússia e a Ucrânia, na região do conflito, passarão a ser controladas por tropas ucranianas.

Ora Kiev exige, primeiramente, o controlo da fronteira e só depois a realização das restantes propostas. Isto porque as autoridades ucranianas receiam perder parte do seu território, pois centenas de milhares de habitantes das regiões separatistas já receberam o passaporte russo, o que permitirá eleger forças pró-russas e utilizar a autonomia a favor de Moscovo, transformando as duas regiões como trampolim para alargar a sua influência a novas regiões da Ucrânia. A federalização do país poderá levar à sua desintegração territorial.

“A escalada nas fronteiras não está ligada ao início de uma guerra de grandes dimensões contra a Ucrânia, embora esse risco exista sempre, mas para obrigar a Ucrânia a cumprir os Acordos de Minsk. Se não compreendem que os actuais acordos significam a perda da independência e da soberania da Ucrânia, leiam o documento”, declarou Iúlia Timoshenko, uma dos líderes da oposição.

O Presidente ucraniano Vladimir Zelenski nunca apoiou os documentos assinados pelo seu antecessor Petro Poroshenko, que hoje também protesta contra a sua implementação, pois, se ceder nesta matéria, arrisca-se a ser varrido do poder não só pela oposição, mas por muitos dos seus apoiantes.

“Se eles [Estados Unidos, NATO e União Europeia] existirem no cumprimento dos actuais Acordos de Minsk, isso será muito perigoso para o nosso país. Se a sociedade não aceita esses acordos, isso pode provocar uma situação política interna, e a Rússia aposta nisso”, avisa Alexey Danilov.

Os membros do “Quarteto da Normandia”, que elaboraram o citado documento, tencionam continuar as conversações, mas é difícil vislumbrar uma solução para este problema. Um dos cenários mais prováveis a congelação do conflito e a integração cada vez maior de Ligansk e Donetsk na Federação da Rússia.