Se acaba este ano o liceu numa escola dos EUA ou se se gradua numa qualquer universidade americana, Bill Gates tem um presente para si: “Factfulness”. E se é pai/mãe, familiar ou amigo de alguém que acabe o liceu este ano, pense em oferecer este livro. Se ponderar um pouco mais e se pensa investir em se autovalorizar, compre e ofereça-se a si próprio este livro. E leia.
O livro de Hans Rosling (acabado pelo filho e nora) foi publicado este ano em Abril de 2018 após a sua morte em 2017. Rosling foi um académico, médico mas mais que tudo estatístico brilhante. Na web há vários TED’s de sua autoria mas há um, talvez o fundacional, que aconselho vivamente.
Os alunos portugueses, e os portugueses em geral, não terão dificuldade em encontrar um exemplar do livro ou via livrarias (on e offline) ou mesmo tentando a sua sorte nas Gates Notes on-line. O link segue aqui.
Mas afinal, e sabendo que Bill Gates gosta de livros e que despende uma boa parte da sua vida a procurar deixar uma marca positiva no mundo e mais, que em paralelo, vai oferecendo livros, não é complexo perceber que neste caso, por se tratar de uma oferta tão generalizada e tão transversal a tantas e tantas pessoas, o livro deve conter alguma coisa de verdadeiramente interessante. O que será?
Algo de muita simplicidade: factos, por um lado (que a estatística tão bem comprova). E, por outro, esse grande facto, também, que reside na obrigação de sabermos que vivemos num mundo que, apesar de todos os males, é fantástico e que evolui e tem evoluído sempre para melhor. E que nós temos e podemos e devemos fazer por ele mais e melhor. Deixando um pouco de nós. Cunhando a nossa marca e oferecendo-a ao mundo. Procurando a nossa diferença e o nosso legado.
As 10 razões, primeiros instintos, e as regras de ouro que moldam estas razões e que devem ser acompanhados de um pensamento mais estruturado, seguem abaixo. São eles a essência do livro. São eles, também, o que justifica o presente transversal associado à vontade de Gates em contribuir para um mundo melhor. E são eles, igualmente, que estão na origem desta dádiva tão generalizada.
- Instinto básico: medo. Regra de Ouro: controlar o medo. Pensamento: se sente medo pense em como o medo é um sentimento tão básico e que aparece de forma tão frequente que, para viver melhor, há que procurar combatê-lo.
- Instinto básico: negatividade. Regra de Ouro: esperar, efetivamente, o lado negativo das coisas. Pensamento: se a negatividade se apoderar de nós (não obstante) será bom pensarmos até que ponto é que o lado positivo consegue a mesma atenção que o negativo.
- Instinto básico: exagero. Regra de Ouro: avaliar a performance e relativizar o exagero. Pensamento: se algo parece extremamente negativo, positivo, urgente ou dramático pode ser considerado um exagero.
- Instinto básico: gaps. Regra de Ouro: lembrar a maioria. Pensamento: se identificar um gap pense em como há uma maioria no meio e entre esses extremos que definem um gap no meio.
- Instinto básico: estereótipos. Regra de Ouro: ver através dos estereótipos. Pensamento: se pensar que outras pessoas são estranhas talvez não seja mau perceber que estereótipos são simplificações drásticas e excessivas.
- Instinto básico: destino. Regra de Ouro: observar as pequenas mudanças. Pensamento: se vir algo como estático pense em como o que parece estático sofre sempre pequenas mutações.
- Instinto básico: generalizações. Regra de Ouro: evitar generalizações arrebatadoras. Pensamento: se começar a observar um padrão não viaje imediatamente para as conclusões.
- Instinto básico: singularidade. Regra de Ouro: usar instrumentos e ferramentas múltiplas. Pensamento: se encontrar uma solução simples para um problema complexo talvez não seja a correta pelo que há que a rever.
- Instinto básico: culpabilizar terceiros. Regra de Ouro: resistir à culpabilização. Pensamento: se sentir a necessidade de culpabilizar reveja as circunstâncias.
- Instinto básico: urgência. Regra de Ouro: dar pequenos passos. Pensamento: se pensa que devemos agir agora, em registo de urgência, talvez seja melhor pensar tudo de novo.
São instintos básicos e regras de ouro o que nos ensinam os factos. Que são comprovados pela estatística. E que se devem tornar regras de vida. Daí a importância, na simplicidade, que têm e que Bill Gates lhes reconhece. A ponto de oferecer o livro a todos os finalistas americanos de liceu e universidade.
As grandes conclusões que se podem levar do livro são francamente interessantes e úteis a todos nós:
- O mundo está em melhor estado do que o que pensamos (vejam-se os factos).
- Temos tendência a dividir o mundo em dois: o nosso mundo e o mundo deles (ou dos outros).
- Quando nos preocupamos com tudo a todo o tempo em vez de termos uma visão holística baseada em factos podemos perder a capacidade para perceber o que efetivamente nos ameaça.
- Tendemos a perceber o progresso quando pensamos que tudo está a ficar pior do que estava.
- Vemos os media (e o mundo) através de lentes com regras (ou a geometria) de medo.
A não esquecer e a fechar: apenas os factos contam a verdadeira história. Por isso: “Factfulness”. Se não leram, por favor leiam. E ofereçam. E aproveitem o mundo que temos, muito melhor do que aquele em que acreditamos.
José Crespo de Carvalho é Professor Catedrático e Diretor Académico – Executive Education na NOVA SBE – Nova School of Business and Economics (crespo.carvalho@novasbe.pt)