A sério: queria recomeçar a escrever sobre outras coisas que não o desgoverno PS que por ora nos apascenta. Tenho um rol crescente de assuntos com que vos maçar, queria dar-lhe uso, mas o facto é que o PS tem feito tudo para sequestrar a minha opinião. Foi aprovada legislação sobre as quotas e tenho imenso para partilhar convosco sobre isso. Vêm aí as autárquicas e será inevitável escrever sobre a catástrofe lisboeta de Medina. Provou-se que o PS mentiu quando acusou em gritaria histérica o anterior governo de ter deixado dinheiro ‘fugir’ para offshores.

Porém, no meio de tudo isto, é António Costa que foge para Espanha, de férias. Quinze dias depois de uma catástrofe que matou 64 pessoas, que oficialmente é para esclarecer doa a quem doer (oficiosamente é para enterrar sem responsáveis). Quando os relatórios pedidos pelo desgoverno se desmentem entre si e desmentem as versões iniciais sobre o fogo de Pedrógão Grande. Dias depois de um assalto mirabolante de material de guerra – que mais cedo ou mais tarde também matará gente, em alguma zona do mundo. Com o país boquiaberto com a incapacidade gritante do desgoverno gerir (quanto mais minimizar através de prevenção) qualquer crise. Dois ministros presos por um ténue fio a esgaçar-se.

É certo que António Costa não faz falta em demasia. Costa é um mestre na velhacaria política, em comprar aliados, nos jogos de cintura para manter o poder, na tentativa de intimidação. Mas não é dotado para a política nobre – a prossecução de políticas que sirvam o bem comum. É porventura o político que esteve associado a mais disparates governativos nos últimos vinte anos antes de chefiar um governo. O que faz é à bruta, pouco pensado, com conhecimento pela rama dos problemas e das vantagens e desvantagens das soluções que aplica – e terminam mal. Não falha.

Quando ministro da justiça de Guterres, legislou sobre escutas telefónicas de uma forma que até o seu partido, incluindo o Presidente Jorge Sampaio (em ocasiões oficiais), criticou. Quando ministro da administração interna, julgou (à boa maneira socialista) que os problemas se resolvem atirando-lhes dinheiro para cima e supôs extinguir o dos incêndios com os helicópteros Kamov, essa anedota nacional. Foi um pai do SIRESP, aceitando contratualmente que o sistema de comunicação em situações de calamidade estava dispensado de funcionar durante calamidades.

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Mas apesar das manigâncias de António Costa, os símbolos contam. Um chefe de governo não vai passear, espairecer e bronzear-se quando o estado e o governo estão em cacos. Pessoalmente preferiria que Costa ficasse de férias pelo resto da legislatura. Já sugeri no twitter umas voltas ao mundo em balão de ar quente – relaxantes (bom para o primeiro-ministro) e demoradas (bom para os restantes portugueses). Pelo menos, Costa poderia viajar para Londres e iniciar uma volta ao mundo em 80 dias.

Não obstante, as férias do primeiro-ministro neste momento particular têm um significado político que vai além do desejo de alguns portugueses se livrarem durante uns tempos da sua magnificência. Mostra a estratégia de Costa e do PS para lidarem com o roubo de Tancos e a tragédia de Pedrógão: desvalorizarem o que sucedeu, culparem exclusivamente a natureza, inventarem assaltos de igual dimensão noutros países aliados, organizarem uma pantomina que alegadamente quer escrutinar responsabilidades, participarem em festas e abalarem de férias.

Afinal nada de grave se passou, pois não? Pelo menos é o que diz o famoso e infame focus group que o PS usou, ainda Pedrógão ardia, para medir o mais importante para os nossos governantes: se a popularidade de Costa fora afetada. A conta de Twitter de Costa, pelo menos, continuou a viver num mundo bestial. À falta de melhor, congratulou o país pelo terceiro lugar numa modalidade qualquer.

Verdade: Espanha faz bem. A ministra Urbano de Sousa também lá esteve em trabalho e foi fotografada sorridente e feliz, em claro contraste com as lágrimas constantes que por cá exibia. Os ares espanhóis trouxeram-lhe súbita felicidade.

A Costa também fará maravilhas: evitarão vaias na praia pelos apesar de tudo numerosos portugueses que, picuinhas, se enxofram quando morrem dezenas de pessoas e o governo lhes diz que correu tudo como devia, o downburst e tal. E Costa confessou-nos por comunicado que as férias estavam planeadas. Consistente com a sua estrondosa capacidade de planeamento, esqueceu-se de escolher as tarifas de avião que permitem alterações, e de verificar a política de cancelamento do local onde se hospedou, de modo a adiar férias se o cargo que escolheu ocupar assim o pedisse. Só pessoas de coração duro desejariam neste momento colocar o senhor primeiro-ministro em mais despesas, certo?

Em todo o caso, aconselharia o primeiro-ministro a não confiar em demasia no grupo que lhe mantinha a popularidade. Pedrógão Grande – e as mentiras e opacidades que lhe estiveram, e continuarão a estar, associadas – são o momento de viragem na relação dos portugueses com Costa. (De resto, os insultos de socialistas nas redes sociais e no mail mostram que o sabem). Apesar do ar blasé socialista ‘Pedrógão, onde é Pedrógão?’, como os gauleses a negarem a batalha de Alésia nos livros do Astérix, Pedrógão é incontornável e teve a assinatura de Costa em decisões que propiciaram a tragédia. Pode não ser imediato, mas ninguém perdoará.

Posto isto, então bons banhos no Mediterrâneo, senhor primeiro-ministro. Gosto muito de Ibiza. (É Ibiza?) A discoteca Pacha: ainda existe? Aproveite os mojitos numa esplanada junto ao porto. Não se esqueça de presentear a sua mulher com um ou dois jantares românticos. O seu bem-estar é o mais importante para nós.