Como pastor ouço confissões. Por muitas que já tenha ouvido, nunca estou preparado para elas. Talvez seja o momento que mais inadequado me sinto, o de ouvir alguém confessar-se—é a minha profissão e nunca me sentirei um profissional.

A pessoa que se confessa, engole-se a si mesma. É algo espiritual, a confissão, mas é algo físico também. Muda o que está dentro da pessoa, para ela se confessar, mas muda o que está fora também. Não exagero quando falo em engolir-se porque o que acontece na garganta de quem se confessa também é um prodígio físico.

É mais intenso uma pessoa que se confessa do que uma pessoa com problemas sérios de digestão. Já vi gente que quando come fica aflita e eu próprio já me vi aflito a comer. Se não tivesse alguma experiência com refluxo, julgaria estar a ter um ataque cardíaco com alguns dos apertos que já passei. Sei o que se pode sofrer com problemas de comida.

Mas a pessoa com problemas em engolir não é a pessoa com problemas a engolir-se a si mesma, e é isso que a confissão exige. Na confissão a pessoa tem de comer-se a si mesma e esse é o prato mais indigesto que existe. Quando reconhecemos verbalmente o mal que fizemos, comemos o pior que podemos ser. É preciso estômago para isso.

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A história de Jonas na Bíblia conta-nos do profeta que não quer profetizar o que Deus lhe mandou e, por isso, foge. Deus envia um grande peixe (que na imaginação popular é uma baleia) que o engole para que Jonas seja vomitado de volta à missão de que fugia. Ao ser um profeta que não quer profetizar, Jonas foge do patrão e foge de si mesmo.

Sermos devolvidos ao nosso destino não pede menos do que sermos engolidos e vomitados de volta. Ninguém gosta de vomitar mas aqui o espasmo desagradável ganha um elemento positivo. E, nesta medida, confessar-se é primeiro engolir o que somos e a fantástica regurgitação divina que se segue. Entra mas felizmente também sai.

A pessoa que se confessa engole-se a si mesma para não voltar a ser a mesma — e a esperança é precisamente esta. O pior que acontece são pessoas que nunca tiveram de se engolir a si mesmas e andam pela vida tragicamente viçosas, ainda por serem vomitadas.

Por muito inadequado que me sinta, quando alguém se engole a si mesmo confessando-se a mim, sei do milagre que presencio. Não o mereço e o melhor que posso fazer é aprender com aqueles auto-engolidos à minha frente—por não merecer a confiança que em mim é colocada, quero confiar noutros para me confessar também.

Se espiritual puder ser a nossa vida, ela será um verdadeiro ciclo digestivo na mesa de Deus.