Durão Barroso já se conformou: acordo entre as “principais forças políticas” para um “plano de médio prazo”, só depois de eleições legislativas. Então — e só então–, surgirá “naturalmente”. Mas foi Fernando Medina, o vice de António Costa, quem, em entrevista a Maria João Avillez, explicou porque tem de ser assim. Na linguagem da chicana partidária, disse isto: com Pedro Passos Coelho, nunca haverá acordo. O que, traduzido em português, quer dizer isto: só poderá haver acordo, se o PS ganhar as próximas eleições.

Para muita gente, os acordos de regime são uma questão de moderação doutrinária. Bastaria a direcção do PS impor-se à “ala esquerda”, ou o PSD reverter à “social democracia”. Tudo isso é conversa. O consenso entre as “principais forças políticas”, conforme sugere Fernando Medina, não é uma questão de ideologia, mas de correlação de forças: o PS jamais aceitará qualquer compromisso, acordo ou coligação, enquanto não estiver em condições de nomear o primeiro-ministro. É esta a chave dos entendimentos governativos no actual regime português: só são possíveis na medida em que o PSD ou o CDS aceitarem subordinar-se ao PS.

Que o PS deseje que seja assim, é compreensível. Mas por que razão julga o PS que pode ser assim? Pela mesma razão que há, no PSD, uma imensa fila de candidatos a Sancho Pança de António Costa, mas no PS, não há nem nunca haverá ninguém para fazer de vice de Passos Coelho, de Rui Rio, ou de quem quer que seja o líder do PSD. O facto é este: o PS acredita que a direita em Portugal não tem licença para governar sem ser sob a sua tutela, e muita gente à direita acredita na mesma coisa.

Este Tribunal Constitucional (e tudo aquilo que ele representa) é um grande trunfo socialista. O PS é único partido que pode governar “legalmente”, mesmo quando as políticas são as mesmas da direita (como os “cortes de Sócrates”). Mas o PS tem ainda outra vantagem: o PCP e a extrema-esquerda. À direita, julga-se que comunistas e neo-comunistas, esterilizados para fins governativos, são bons para desviar votos do PS. Talvez sirvam para isso, mas também para outra coisa: sempre que cai na oposição, o PS sai da frente e deixa à solta o sindicalismo comunista e o jornalismo de extrema-esquerda, confiando em que, com a ajuda de um ou outro socialista oportunamente “radicalizado”, saberão criar a “crispação” e a “contestação social” suficientes para confundir a direita governativa.

Não é difícil. Em 1975, a direita foi amestrada para se submeter ao PS, que os EUA e a Igreja Católica ungiram para encabeçar a resistência anti-comunista. A cada grandolada, ao primeiro rumor da Aula Magna, uma parte da direita lembra-se do PREC e suspira: como tudo seria mais fácil na companhia do PS. Neste esquema de pressão sobre a direita, só um elemento falta hoje aos socialistas: um Presidente da República disposto a tirar as “devidas ilações” do último acórdão ou do próximo manifesto. Daí a impaciência do PS com o professor Cavaco Silva.

O PS nunca será o parceiro menor de uma coligação, como o SPD é agora na Alemanha. Quem no PSD sonha com um “Bloco Central” deve pensar que, para o PS, a fórmula não significa um contrato entre iguais, mas a submissão do PSD. Com o PS a mandar, haverá sempre mais impostos, mas nunca revisão constitucional ou reforma do Estado. O PS, como se compreende, não tem motivos para renunciar às vantagens que lhe dá este regime. Resta saber se CDS e PSD ainda vão tentar renovar a maioria, ou se, pelo contrário, já só pensam em quem será o primeiro a dobrar o joelho perante o dono do regime.

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