Com a proximidade das eleições regionais na Madeira, a que se seguirão as eleições europeias no próximo ano, este é um bom momento para considerar os principais desafios que se colocam à direita em Portugal para constituir uma alternativa de governação face ao notório desgaste do PS. De facto, apesar de a incapacidade da governação socialista para lidar com os principais problemas do país ser cada vez mais amplamente reconhecida, não é de todo evidente ainda para a maioria do eleitorado que exista uma alternativa credível de governação à direita do PS.

A necessidade de credibilização como alternativa de governação pode assim ser vista como o primeiro grande desafio que a direita enfrenta em Portugal. Um desafio que por sua vez está também relacionado com a crescente fragmentação do espaço político à direita do PS. As eleições legislativas de 2022 foram evidência disso mesmo, com Portugal a aproximar-se de uma configuração de forças à direita mais em linha com os padrões predominantes no espaço europeu. Conforme salientei logo a seguir a essa eleições:

Durante décadas, Portugal não teve qualquer partido liberal nem qualquer partido de direita radical, ao contrário do que se foi tornando habitual na maioria dos países europeus. A anomalia histórica portuguesa (provavelmente associada às particularidades da transição democrática) era ter à direita do PS apenas partidos filiados no Partido Popular Europeu. Ainda para mais reivindicando o maior deles a “social-democracia” e o mais pequeno (pelo menos inicialmente) um posicionamento “centrista”. Ainda que a sustentabilidade a longo prazo da IL e do CH estejam por demonstrar, tudo indica que as eleições de 2022 marcam não só uma viragem à direita mas também a reconfiguração dessa direita no sentido de um padrão mais consonante com o que acontece no resto da Europa.

A maioria absoluta conquistada por António Costa para o PS beneficiou da forte mobilização do eleitorado à esquerda pelo PS – com a correspondente forte penalização de BE, CDU e PAN, que sofreram perdas substanciais face a 2019. Mas a maior fragmentação do sistema partidário à direita (com o crescimento de CH e IL) foi também fundamental para fazer reduzir o limiar de votos necessário para atingir uma maioria absoluta, o que possibilitou ao PS conquistar essa maioria com apenas 41% dos votos e beneficiando da distância significativa face ao PSD. Assim, paradoxalmente, em 2022 o PS obteve maioria absoluta numas eleições nas quais a proporção de votos à direita do PS efectivamente cresceu.

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Este segundo grande desafio – o da fragmentação – pode ter duas soluções possíveis. A primeira é a de o PSD conseguir travar a sua erosão e recuperar espaço à direita, fazendo recuar a IL e, em especial, o CH. A segunda solução será aprender a viver com essa fragmentação. A este respeito as eleições na Madeira poderão fornecer dados interessantes. Caso se venha a confirmar a renovação da maioria absoluta por parte de Miguel Albuquerque e um resultado relativamente pouco expressivo do CH, valerá a pena tentar compreender por que razões a Madeira estará em contraciclo com a realidade nacional nesta dimensão. Sendo certo que as especificidades regionais limitam necessariamente leituras nacionais, os resultados das eleições regionais na Madeira, sejam eles quais forem, não deverão deixar de ser objecto de reflexão cuidadosa à direita.

Do ponto de vista nacional, é prioritário para o PSD contrariar o crescimento do CH por duas razões. A primeira é que parece francamente mais difícil para o PSD estabelecer entendimentos a nível nacional com o CH do que com a IL. Nesse sentido, um bom resultado da IL não é necessariamente um impedimento à formação de uma alternativa de governação à direita do PS (ainda que a aritmética do sistema eleitoral torne essa tarefa mais fácil com uma menor fragmentação dos votos à direita). A segunda razão é que é o CH que parece ter maior potencial de crescimento, representando por isso uma ameaça eleitoral maior para o PSD, sendo que temos assistido em alguns países europeus à substituição de partidos tradicionais do PPE por partidos de direita radical na posição de principal força à direita.

A segunda solução – aprender a viver com uma maior fragmentação à direita – exigirá ser capaz de transformar uma eventual maioria à direita do PS numa base parlamentar minimamente estável e funcional de apoio a um futuro governo. Uma tarefa que não se afigura nada fácil. Além de exigir uma rejeição clara e inequívoca de uma lógica assimétrica de cordões sanitários, a possibilidade de estabelecer essa base dependerá também de os posicionamentos do CH não a inviabilizarem, o que está longe de ser garantido.