Nas eleições legislativas não votamos para escolher quem pode ser primeiro-ministro. Ao contrário de outras eleições, como as autárquicas ou mesmo as presidenciais, sabemos que, no primeiro caso, o presidente da câmara do nosso município será o número um da lista mais votada e, no segundo, o Presidente da República eleito será o candidato que obtiver mais de metade dos votos validamente expressos, não se considerando como tais os votos em branco (maioria absoluta). Se nenhum dos candidatos obtiver esse número de votos, haverá um segundo sufrágio, ao qual concorrem apenas os dois candidatos mais votados.
Em eleições legislativas o nosso voto vai para a composição da Assembleia da República, formada por 230 deputados. No entanto, a Constituição estabelece que a sua composição pode variar entre um mínimo de 180 e um máximo de 230 deputados.
Os deputados são eleitos por listas apresentadas por partidos, ou coligações de partidos, em cada círculo eleitoral. A conversão dos votos em mandatos faz-se de acordo com o sistema de representação proporcional e o método da média mais alta de Hondt.
Normalmente, é chamado pelo Presidente da República a formar governo o partido ou a coligação de partidos que venceu as eleições, depois de ouvidos todos os partidos com assento parlamentar. O Presidente indigitará assim o primeiro ministro que se apresenta de seguida à Assembleia da República com o seu programa.
Posteriormente, cabe aos senhores deputados votar favoravelmente ou não esse mesmo programa apresentado pelo primeiro ministro indigitado. Se do resultado dessa votação surgir uma maioria de “sim”, temos governo, se não procurar-se-ão outras soluções que garantam a governabilidade do país. Esgotando-se todas as hipóteses não resta outra solução senão a de irmos de novo a eleições.
Conforme o desenho do quadro parlamentar que resulta da escolha dos eleitores, e não havendo maioria de deputados de uma só força política – sendo este o cenário mais provável na noite do dia 30 de janeiro – começarão então as negociações com os mais diversos partidos. Para se atingir uma maioria absoluta é preciso que existam 116 deputados (115+1) eleitos por um só partido.
Em suma, como não votamos, erradamente na minha opinião, para a escolha do primeiro ministro, aquele que julgamos que pode vir a formar governo por ser líder do partido mais votado pode perfeitamente não chegar a entrar no magno palacete de São Bento, ali na Rua da Imprensa à Estrela nº 6, 1200-673 em Lisboa.
Dos vários cenários hipotéticos que já conhecemos, há um que pode também acontecer: Pedro Nuno Santos ser o próximo primeiro-ministro de Portugal.
Sabemos que António Costa, a confiar (desconfiando sempre) nas suas palavras, não será primeiro-ministro caso perca as eleições, ou seja, caso o Partido Socialista não seja o mais votado.
Ainda assim, poderá existir uma maioria parlamentar de esquerda, não sendo suficiente garantir uma estável governação com a soma de todos os deputados de direita, em caso de vitória do Rui Rio. Em suma, a história poderá repetir-se. Muito embora o PSD possa ganhar as eleições, com o Presidente da República a convidar Rio para formar o seu governo, este, ao apresentar o seu programa na Assembleia da República sem respaldo parlamentar necessário depressa chumbará, toda a esquerda, no caso de esta conseguir uma maioria parlamentar, fará cair a proposta de governo de Rui Rio.
Eis então que poderá o actual ministro das Infraestruturas e Habitação, bem mais próximo do Bloco de Esquerda, apresentar-se como uma solução à Assembleia da República.
Se tudo isto é na verdade constitucionalmente aceite, e sendo o cenário aqui apresentado bastante plausível, tudo isto é porém bastante triste.
E porquê?
Porque na qualidade de eleitores temos o direito de saber quem pode estar na liderança do nosso governo, que coligações podem ser feitas caso o partido mais votado seja o A ou o B sem maioria que o sustente e em que moldes.
Tudo deveria ser claro, significando isto que era preciso abrir-se o jogo pondo todas as cartas em cima da mesa e dizer cada um, sem medo, ao que vem.
À pergunta: quem poderá ser o próximo primeiro-ministro de Portugal num cenário idêntico a 2015, à data de hoje estamos sem resposta e este sonegar de hipóteses por parte do Partido Socialista não é compatível com a democracia, defraudando de forma intencional os eleitores.
É certo que não votamos para a pessoa A ou para a pessoa B mas há o direito de sabermos quem pode ser quem. E sim, sejamos claros, o PS está de facto a enganar-nos ao não dar a conhecer quem será de facto aquele que poderá estar no comando disto tudo se o Partido Socialista perder as eleições existindo uma maioria de deputados nas bancadas de esquerda.
O PS está a esconder o jogo da democracia, estando à espera e à espreita, para ver no que tudo isto vai dar para de seguida apresentar uma solução que não foi de forma explícita dada a conhecer aos eleitores. Por certo, nos bastidores do Largo do Rato, já tudo está pensado até ao mais pequeno detalhe. Pode o PS dizer-nos que não é bem assim, podem os seus dirigentes afirmar o que quiserem, mas a história responderá que não deixaram passar a possibilidade de ser governo caso à esquerda tenham assento uma grande parte dos deputados.
Para que votemos todos em consciência e não irmos ao engano como tem sido hábito, é preciso uma resposta clara antes do dia das eleições, porque nem tudo o que é legítimo é moralmente aceite, este é sem dúvida um dos casos em que na política não vale tudo, e isto a ser assim, não vale menos nada.
Se na verdade a hipótese que hoje aqui vos trago se materializar, então que fique claro: para além de milhões a voar, a verdadeira democracia poderá abandonar o país de vez. E pela Ryanair que é mais barato.