O horizonte de estabilidade política da presente legislatura, assente numa maioria parlamentar sólida, oferece todas as condições ao titular da pasta da Educação para governar com serenidade e ponderação. Desprendido de compromissos e exigências, tantas vezes esdrúxulas, da esquerda radical – que condicionaram fortemente a governação no período das duas legislaturas passadas – o Governo pode aspirar a fazer a diferença na área da educação.

João Costa tem, por isso, condições de excelência para fazer a diferença numa pasta que é vital para o país. Com a vantagem de trazer consigo a experiência de seis anos de governação. Os desafios são grandes. E se alguns podem ter um custo político imediato (caso do regime absurdo de contratação de professores para o ensino público estatal), outros apenas precisam de atenção e coragem.

No setor de Ensino Particular e Cooperativo (EPC), confiamos que o ensino privado tenha deixado de ser uma manobra de distração das dificuldades políticas de outros. Quantas vezes fomos atacados, ficando a impressão que não era nada connosco mas apenas uma prova de fidelidade numa relação conturbada.

No passado, como hoje, a condição central para o ensino privado poder continuar a cumprir a sua missão de serviço público resume-se numa palavra: autonomia. É no aprofundamento da autonomia do privado que reside não só o futuro do setor mas também a dinâmica do sistema educativo como um todo. Foi assim com a criação da figura do Diretor de Turma, foi assim com a introdução do inglês no primeiro ciclo, foi assim com a autonomia curricular ou com os planos próprios, hoje planos de inovação.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A autonomia que agora pedimos é a de podermos contratar livremente os profissionais que entendemos mais competentes para trabalhar connosco. A escassez de licenciados com a formação inicial que o Estado define como a necessária para se ser professor tem criado enormes dificuldades de recrutamento. É necessário resolver rapidamente o bloqueio no acesso à profissão para os licenciados pós-Bolonha. Mas é preciso ir ainda mais longe. O Governo deverá legislar no sentido de permitir ao ensino privado contratar para docentes quem entender mais adequado desde que seja licenciado. Não vemos qualquer fundamento para um colégio não poder contratar um licenciado em gestão para dar matemática ou um licenciado em letras para dar história. Chega a ser confrangedor pensar que os grandes vultos da nossa ciência. letras ou das artes não podem, se quiserem, ser contratados como docentes. Negar ao privado liberdade de contratação é uma pouco discreta defesa do status quo num monopólio que movimento mais de 6 mil milhões de euros por ano. Reconhecer liberdade aos privados para contratar não é uma questão de desclassificação laboral (a AEEP, associação patronal que representação o setor, já se comprometeu a exigir que na contratação coletiva as pessoas que venham a ser contratadas para a docência sejam colocadas na mesma tabela que os titulares de habilitação profissional). Trata-se sim de enriquecer as comunidades educativas com pessoas que têm um perfil de formação diferente, tiveram diferentes experiências profissionais, abrem a escola ao mundo real. No paradigma de trabalho em equipas docentes, temos de aceitar que a existência de contributos mais diversificados é uma vantagem para os alunos. Este tem que ser um processo discutido e debatido. Mas com a atual moderação, sensibilidade e bom senso será possível – acreditamos – chegar a bom porto.

Assim como esperamos poder avançar em outros domínios que até há dois anos atrás nem sequer equacionávamos: um ensino secundário mais flexível em que os alunos podem escolher disciplinas de ciências estando em letras ou artes estando em ciências ou qualquer outro combinação que lhes faça mais sentido; mais aprendizagem assíncrona ou não presencial incorporando o caminho de inovação educativa percorrido na pandemia; simplificação do processo de autorização de currículos não nacionais, dando resposta ao aumento destas ofertas educativas diferenciadoras e que têm registado assinalável procura.

Claro que também vamos ter de falar de recursos. Dos contratos de cooperação, de associação de patrocínio e simples. Da atualização de valores que já eram esmagados quando foram definidos e que estão hoje, passado mais de uma década nalguns casos, completamente desajustados.

Tudo isto são temas em que desejamos avançar, com moderação e sem preconceitos, em diálogo com o novo titular da pasta.