“A religiosidade é uma dimensão importante da vida dos jovens em Portugal e cerca de 90% dos que se afirmam religiosos são católicos.” Esta é uma das conclusões do estudo “Jovens, Fé e Futuro”, que o Centro de Estudos dos Povos e Culturas de Expressão Portuguesa, da Universidade Católica, desenvolveu para a Conferência Episcopal, e que foi apresentado, no passado dia 6 de Julho, em Lisboa.
Apesar do laicismo dominante, não apenas nas escolas estatais, mas também nos meios de comunicação social, que tendem a dar uma visão distorcida da religião e, em particular, da Igreja católica que, geralmente, só é notícia pelos piores motivos, 56% dos jovens portugueses, entre os 14 e os 30 anos, são crentes, e 49% são católicos. Dos que se dizem religiosos, 34% pratica, ou seja, participa com regularidade em actos de culto. Outras confissões, nomeadamente as cristãs não-católicas, como as evangélicas, ditas protestantes, têm também alguma expressão entre a juventude nacional.
É significativo que mais de um terço dos jovens do nosso país pratique a sua fé, quer rezando individualmente, quer participando, pelo menos com frequência mensal, em actos de culto, ou outras actividades religiosas.
A principal razão que 44% dos inquiridos indicam, como justificação para a não prática da religião, é a sua falta de compromisso e empenho, o que leva a crer que os mais novos, se não pertencerem a uma família crente, não frequentarem uma escola católica, nem estiverem inseridos em estruturas eclesiais, tendem a descurar a sua vida religiosa. De facto, a fé, que há-de ser pessoal, só pode ser vivida comunitariamente, ou seja, em Igreja.
Em relação à não-prática religiosa, este estudo distingue duas faixas etárias: dos 14 aos 17 e dos 18 aos 30 anos. A primeira etapa da juventude parece ser mais rebelde em relação ao pensamento politicamente correcto e, também, mais assertiva na afirmação da fé, enquanto os crentes com idade superior tendem a ser menos radicais e, por isso, mais transigentes com as novas modas. Os mais novos, através das estruturas eclesiais que frequentam, como as catequeses paroquiais, os grupos e movimentos, têm mais hipóteses de esclarecer a sua fé, enquanto os fiéis já imersos na vida profissional têm menos disponibilidade para actividades de aprofundamento da doutrina.
Com efeito, concluiu-se que 44% dos católicos, entre os 18 e os 30 anos, desculpam-se da falta de prática religiosa por razões de ordem doutrinal, nomeadamente por “desacordo com algumas normas da prática religiosa, revelando” – segundo este estudo – “uma reflexão mais aprofundada sobre a sua posição relativamente à dimensão espiritual da vida.” Pode-se, portanto, supor que estes jovens adultos manifestam lacunas na sua formação religiosa, que os levam a tomar atitudes de incoerência religiosa. É provável que alguns se tenham afastado por causa do escândalo da pedofilia no clero que, embora gravíssimo nos poucos, mas mesmo assim excessivos, casos verificados, foi exageradamente ampliado pela comunicação social.
Um dos aspectos mais polémicos, ou controversos, da doutrina católica é, decerto, a sua moral sexual. A fé cristã é taxativa na exclusão do aborto voluntário e da eutanásia, porque são homicídios, violações gravíssimas do 5º mandamento da Lei de Deus, que proíbe matar, salvo em legítima defesa. A doutrina católica também implica a indissolubilidade matrimonial e a fidelidade conjugal, bem como a paternidade e a maternidade responsáveis, sem esquecer a exclusão dos métodos não naturais de anticoncepção e das relações sexuais fora do casamento. Estes comportamentos decorrem do Evangelho, mas requerem uma adequada formação. Neste sentido, São João Paulo II, quer através das suas catequeses sobre a ‘teologia do corpo’, quer através do Catecismo da Igreja Católica, deu a estas questões a necessária fundamentação teológica. Contudo, estes seus ensinamentos, que são magistério da Igreja, nem sempre chegam a todos os crentes que, em consequência, têm dificuldade em os compreender e praticar.
É igualmente digno de menção que 28% dos crentes, entre os 18 e 30 anos, aponte, como razão para a sua não-prática religiosa, as “demasiadas atitudes e comportamentos negativos noutros praticantes”, justificação decerto compreensível, mas insuficiente, pois expressa uma certa imaturidade racional e espiritual.
Com efeito, deixar de praticar porque há quem o faça e não seja perfeito, faz tanto sentido como não ir à escola, por causa dos ignorantes que a frequentam, ou recusar-se a ir ao hospital, porque está cheio de doentes! Com certeza que os crentes que praticam a fé não são ainda santos, mas se vão ao templo é, precisamente, porque têm esse propósito e, por isso, não só confessam a sua condição de pecadores – como sempre acontece nas Eucaristias – como pedem a Deus, e aos seus irmãos na fé, que os ajudem a melhorar. Os que nada fazem e criticam os que se esforçam, são réus do seu próprio julgamento, porque maior é a hipocrisia dos que não praticam, à conta de que entre os praticantes há hipócritas, do que a dos que, sabendo-se pecadores, querem sinceramente deixar de o ser e, por isso, praticam a sua religião. A prática religiosa é sempre um convite à conversão pessoal, pela relação com Deus e a comunhão com os irmãos.
Este estudo também é ilustrativo dos principais interesses dos jovens portugueses: para 63%, é a guerra; 55% estão apreensivos relação às alterações climáticas; e 54% interessam-se pela equidade e não discriminação. Entre os crentes, a família ocupa o primeiro lugar, enquanto os outros interesses reflectem a ideologia dominante, mas também provam que, ao contrário do que alguns supuseram, a religião não só não aliena como, pelo contrário, consciencializa e compromete os cidadãos, porque lhes recorda a obrigação cívica, mas também religiosa, de construírem um mundo melhor.
Menos positiva é a constatação de que “a intenção de participação [nas JMJ] é baixa, sendo que apenas 13% declararam certeza relativamente à sua participação e 22% consideram que ‘provavelmente’ irão participar.” A fraca adesão explica-se pelo facto de o inquérito ter sido realizado mais de um ano antes deste evento e antes da peregrinação dos símbolos das JMJ por todas as dioceses do país, com efeitos muito animadores no que respeita à mobilização dos jovens fiéis. Pode ser que a tentativa de desvalorizar a sua natureza católica, em prol de uma abrangência ecuménica, inter-religiosa e, até, não-religiosa, tenha desmotivado alguns jovens crentes, que esperavam que o encontro de Lisboa, tal como as anteriores JMJ, fosse uma experiência de aprofundamento da fé católica. Esta aposta numa vaga fraternidade universal não parece ter tido grande êxito: 86% dos não crentes declarou que não vai participar nas JMJ.
Por último, é chamativo que 18% dos jovens já sofreram “alguma discriminação”, por causa das suas convicções religiosas, nomeadamente no seu grupo de amigos, na escola e na universidade. Não é de estranhar, porque é conhecida a perseguição estatal a uma família católica de Vila Nova de Famalicão, por causa da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento. Pelos vistos, nessas aulas não se ensina aos jovens a mais-valia da religião, nem se lhes inculca a virtude da tolerância em relação aos crentes, embora se lhes exija a aceitação de doutrinas anticristãs sem qualquer fundamento científico, como a ideologia de género.
O Estado laicista, como o nacional-socialista e o comunista, aposta na formatação da juventude e, por isso, encara com desconfiança e temor a religiosidade dos mais novos: a formação cristã dá razão e força para manter viva a chama da liberdade e, por isso, os jovens crentes são indesejáveis para os regimes totalitários. Mas, graças à sua fé e generosidade, eles são, sobretudo, a razão da esperança numa sociedade mais justa e humana, porque mais de acordo com o desígnio de Cristo, o Salvador do mundo (Jo 4, 42).