À semelhança daquela que tem sido a sua história, a NATO e os seus estados-membro enfrentam hoje, uma vez mais, inúmeros desafios que requerem atenção, renovação e inovação, tendo em vista a manutenção dos ideais que caracterizam a Aliança Transatlântica: a defesa intransigente dos valores da Democracia, Liberdade, Pluralismo e Segurança Coletiva.

Como sabemos, a verdade é que a Europa não apresenta mecanismos de hard power capazes, por si só, de dar resposta a possíveis ameaças trazidas por grandes potências mundiais, como são os casos da Rússia e da China. O mesmo aplica-se a ameaças mais recentes, tais como a dificuldade em apresentar soluções capazes de fazer face a um vírus insidioso, ou também a diferentes ataques híbridos que exigem uma enorme capacidade de coordenação e elevada expertise.

As relações económicas entre países assumem, com efeito, uma enorme preponderância no peso da influência que um país poderá ter sobre outro. A China exporta para o espaço europeu quase o dobro do que o inverso, tendo a chanceler alemã, Angela Merkel, visitado o país asiático 12 vezes desde que assumiu o poder, o que reflete uma enorme aproximação da Europa face à China. O facto é que a Alemanha dificilmente consegue viver sem o mercado chinês e os factos, esses, não têm modos.

Hoje já poucos são aqueles que têm dúvidas sobre o enorme poderio chinês em termos económicos, comerciais, sociais, geográficos e militares. Tal verifica-se através do seu domínio tecnológico por via de um controlo cada vez maior sobre a Inteligência Artificial, dos desenvolvimentos na Indústria 4.0, da Internet of Things (IoT) e das redes 5G. A China alterou a balança de poderes da ordem mundial, sendo iminente uma maior confrontação entre si e os EUA.

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Vistas as presentes vicissitudes, será fulcral que a NATO defina como se pretende posicionar-se face à estratégia global da China, que se encontra a fixar crescentemente presença no espaço euro-atlântico, através do seu projeto geoeconómico e político denominado “Belt and Road Initiative”, com fortes investimentos nas infraestruturas europeias, assim como em tecnologias avançadas com o consentimento e recetividade europeia, claro está. Tal terá, inevitavelmente, efeitos que incidirão na coesão (ou falta dela) da comunidade transatlântica e na forma como os seus países membros se posicionam perante esta nova potência global.

De facto, a China apresenta o segundo maior orçamento mundial para a Defesa, estando a investir de forma constante na modernização das suas capacidades militares, incluindo mísseis que poderão atingir países da Aliança. É perante esta realidade que a NATO se deve imbuir de uma união política mais cimentada, pensando e executando de forma definitiva parcerias de cooperação com países da região Ásia-Pacífico, como a Austrália, Japão, Nova Zelândia e Coreia do Sul, ajudando a conter uma China que se aproxima a todos os níveis do mundo Ocidental.

Torna-se essencial que aumente a cooperação transatlântica entre os EUA e os seus aliados europeus, assim como entre a União Europeia e a NATO, principalmente no momento em que a Europa regista retrocessos democráticos em alguns estados-membro, como são os casos da Hungria, Polónia e Turquia, para além do já consumado Brexit. Ao mesmo tempo, os europeus devem honrar o compromisso que assumiram, aplicando maior orçamento para a Defesa e para a NATO, investindo mais em investigação e desenvolvimento.

No que diz respeito à Rússia, a verdade é que este país tem vindo a adotar campanhas de desinformação, subversão, anexação e ataques híbridos que representam ações de desestabilização dirigidas ao Ocidente. A Aliança necessita de uma estratégia coerente no Báltico e a Leste, no Mar Negro, de forma a conter o poderio militar russo na Europa, preparando rápidas respostas políticas e militares às provocações do Kremlin.

Esta necessidade pode refletir-se no apoio que a NATO poderá dar aos seus parceiros no Mar Negro – Ucrânia e Geórgia -, aumentando o investimento no seu desenvolvimento económico e renovando os meios de segurança na região. Dando um exemplo de foro prático, o investimento em infraestruturas de transporte e energia, incluindo transporte marítimo entre os portos da Roménia e da Geórgia, bem como nos mares Negro e Cáspio, poderia beneficiar de forma decisiva o ambiente de segurança da região. Também a adesão da Roménia ao espaço Schengen viria impulsionar inquestionavelmente o investimento regional, aumentando assim a dimensão política da NATO, União Europeia e dos valores ocidentais.

É fulcral que a Aliança adicione e reforce a área de cybersecurity à ação que desenvolve na terra, no ar e no mar, recrutando as mentes mais preparadas do mundo da tecnologia, criando assim resiliência a novas ameaças que estão por entre as sombras do conflito. O papel da NATO face às atemorizações híbridas exige uma forte transparência e cooperação com outros atores, como a UE e o setor privado.

No que se refere à ameaça, também ela invisível, composta pelo novo coronavírus – ou por outras hipotéticas pandemias -, o facto é que esta realidade coloca em causa a segurança e o bem-estar da sociedade civil, constituindo um “ataque” que necessita veementemente de uma ação coletiva e efetiva de todos os seus países integrantes. Seria fulcral que a Aliança tivesse demonstrado esta capacidade e eficácia provando, uma vez mais, a importância da coordenação entre países e instituições das quais cada um destes é parte integrante.

Se há algo que a presente pandemia nos ensinou passa, precisamente, pela necessidade da criação de um plano de ação, também aplicável às denominadas guerras biológicas, esboçando um protocolo de resposta que envolva todos os estados-membro da NATO.

Urge agora, mais do que nunca, que os EUA e a Europa encontrem – e deem voz – a lideranças que representem a paz e o progresso que o multilaterialismo e a cooperação nos trouxeram, nunca esquecendo a importância que tal representa para as nossas vidas.

O tempo para a união é já hoje, sem fragmentação ou vozes separadas e desassociadas no Ocidente. As grandes potências com regimes e valores diferentes do nosso, exacerbados por nacionalismos vários, procuram e anseiam por essa divisão. Definem-na como alvo. Que nunca seja tarde o momento de perceber que nos cabe apenas a nós, em conjunto, salvaguardar a premência da Liberdade. Da Felicidade.