Fundada em 1949, a NATO procurou unir uma Europa que se encontrava destruída humana e fisicamente após o fim da 2ª Guerra Mundial e de longos anos de conflitos no velho continente, que teimavam em persistir. Importava – e ainda hoje importa — ter em consideração que as maiores atrocidades com que o mundo se deparou, o fascismo e o comunismo, tinham tomado lugar precisamente no espaço europeu. Urgiu à data, e até à queda do muro de Berlim em 1989, conter a ameaça soviética e a sua respetiva ideologia repressiva e autoritária.

Mais do que uma união de países que visava a sua defesa mútua, criando consensos e paz entre si, a NATO assentou desde logo na definição de uma ideologia bastante assertiva: a defesa intransigente dos valores da democracia e liberdade. Sendo Portugal um dos seus 12 membros fundadores, a verdade é que hoje a Aliança conta com 30 países do Ocidente espalhados por toda a Europa, bem como com os Estados Unidos e Canadá. A Macedónia do Norte foi o último país a desejar e a consumar a sua adesão já em 2020, após aprovação da unanimidade dos membros da aliança, conforme ditam as regras.

No entanto, nem tudo foi fácil ao longo desta caminhada que conta hoje 71 anos de sucessos, fracassos, avanços, recuos, boas e más decisões. De aprendizagens, como em tudo na vida. O início do século XXI, cujo vaticínio chegou a ser o fim da história, acabou por revelar, ao contrário, um péssimo começo com o ataque aos Estados Unidos, naquela que é uma luta que ainda hoje se trava pelas demais regiões do planeta: o combate ao Terrorismo.

Em 2008 deu-se uma nova ameaça ao progresso e solidariedade entre países por força da crise económica que se abateu sobre o mundo e cuja recuperação foi longa e penosa. Este ano, na viragem de uma nova década, iniciámos os anos 20 do século XXI com uma grave doença global que veio colocar em causa a saúde pública de todos. Tal veio a obrigar, numa primeira fase, ao confinamento dos cidadãos e à consequente paragem do mundo como ainda não o tínhamos visto nem conhecido.

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Embora não fosse surpresa para ninguém, o facto é que a pandemia tem vindo a colocar a nu algumas das falhas do projeto europeu. Desde logo, a Alemanha e França que bloquearam, de forma preocupante, a exportação de material médico para outros países da União Europeia, quando o seu propósito comum passa, com efeito, pela prossecução de um mercado único e livre. Ao mesmo tempo, do outro lado do oceano, os Estados Unidos iam-se revelando bastante lentos, tanto a compreender as vicissitudes do vírus que se preparavam (ou não) para enfrentar, como na apática ajuda a uma Europa cansada e incapaz de encontrar soluções entre os seus Estados.

Todo este processo moroso veio criar condições para que países como a Rússia e a China, por mais irónico que pareça, se apressassem a distribuir luvas, máscaras, ventiladores e staff médico aos países europeus afetados, sendo Portugal um dos recetores deste amparo. Só em abril, quando a Europa já passava uma situação bastante complicada e de incompreensível falta de coesão, é que a União Europeia demonstrou capacidade de se mobilizar na sua ação, anunciando programas de apoio financeiro, económico e sanitário.

A UE perdeu, uma vez mais, a oportunidade de marcar a diferença pela positiva e de contrariar aqueles que mais se insurgem contra o seu projeto. Se tivesse agido a tempo, o expoente máximo da sua ação teria residido não só na contenção e gestão da crise em solo europeu, como na capacidade de oferecer apoio aos Estados Unidos, país que já viveu dias de maior discernimento.

Dado todo este panorama tumultuoso, onde entra a NATO? É inquestionável o interesse dos Estados Unidos e da Europa em aumentarem e fomentarem a sua capacidade de atuação na produção de resultados práticos no que à saúde pública diz respeito. Melhor ou pior, a verdade é que a Aliança Transatlântica se tem vindo a adaptar aos consecutivos desafios que o tempo e as circunstâncias lhe têm exigido, acabando sempre por provar a necessidade da sua existência.

A NATO tem registado, com efeito, um papel importante na luta ao Covid-19, distribuindo equipamento médico através da sua enorme capacidade de transporte. Não deixa de ser verdade, no entanto, que poderia ter tido uma ação ainda mais planeada e consistente. Tal verificar-se-ia se a Aliança tivesse em stock uma avolumada quantidade de material médico considerado indispensável, apresentando equipamentos de proteção pessoal e outros recursos de combate à pandemia. Demonstrando esta capacidade, a NATO conseguiria evidenciar a sua vitalidade em mais uma frente para além do trabalho que produz na defesa militar e geopolítica. Como se vê, o combate a um vírus não deixa de ser um meio determinante para a segurança dos cidadãos de várias regiões do planeta.

Deveria ter sido traçada, portanto, uma estratégia transatlântica de contenção, capaz de dar resposta a uma pandemia como o Covid-19 — ou até a casos mais perigosos como as denominadas guerras biológicas –, definindo um escrupuloso protocolo de ação que evite a sua propagação global e que, com isso, garanta o bem-estar de todos. Lembro-me que na Cimeira da NATO do passado mês de dezembro de 2019, em Londres, para além das considerações habituais sobre as ameaças que são já sobejamente conhecidas, não houve qualquer nota contra uma eventual crise sanitária. Devia.

Afinal, é missão da Aliança prever focos de instabilidade, sejam eles aéreos, marítimos, terrestres ou híbridos, sejam expostos ou insidiosos.

Apesar de estarmos a viver um momento extremamente delicado, particularmente no que à saúde e economia diz respeito, as crises constituem, também elas, oportunidades de fomentar a cooperação entre Estados e instituições multilaterais. Independentemente do desafio que enfrentamos, devemos, mais do que nunca, criar políticas que garantam solidariedade, entreajuda e progresso entre membros, de uns para os outros.

No fundo, é o que os valores por detrás de instituições como a União Europeia e a NATO exigem. É o que nós, enquanto sociedade civil, delas esperamos.