Investir na educação é apostar estrategicamente no desenvolvimento futuro de um país. Por certo, isso não representa novidade para ninguém. Muito menos para os políticos, que fazem desta sentença um dos seus lugares-comuns preferidos, colocando-a com ênfase nos discursos. Mas há uma enorme diferença entre sabê-lo, dizê-lo e fazê-lo. Por exemplo, sendo certo que o PS o sabe e o diz, será que também o praticou nos quatro orçamentos que apresentou (2016-2019)? Esse balanço já pode ser feito. E a resposta é que, por imposição de Mário Centeno, o investimento do actual governo na educação ficou muito abaixo do seu valor estratégico.

Sim, é um facto que as dotações orçamentais dedicadas ao ministério da educação aumentaram de forma sustentada ao longo destes anos. Mas há o outro lado do espelho, que descrevi numa análise publicada há dias. Primeiro, medido em percentagem do PIB, o orçamento (inicial) do Ministério da Educação em 2018 ficará no nível mais baixo dos últimos 10 anos e, em 2019, ficará pouco acima disso. Segundo, mesmo em valores absolutos, o reforço orçamental ainda não supriu os cortes dos orçamentos do governo PSD-CDS (2012-2015). Terceiro, cerca de 85% do reforço orçamental desde 2016 explica-se com o peso dos salários, reduzindo a uma pequena porção desse reforço a parte relativa aos investimentos no próprio sistema educativo (em programas educativos ou em infra-estruturas). Quarto, esse reforço do peso dos salários não corresponde a um aumento proporcional do número de professores – ou seja, não corresponde a uma aposta de reforço de quadros. Enquanto no período 2011-2015 o sistema educativo perdeu 22 mil professores (por causa de menor contratação, cortes e reformas antecipadas), no período 2016-2018 o balanço foi apenas de mais 6 mil professores. Ou seja, o peso dos salários deve-se, sobretudo, ao fim da aplicação de cortes, aos ajustes salariais e agora aos aumentos na função pública – particularmente sentidos na Educação, pois o sector acumula perto de metade dos quadros da administração pública central.

Estes pontos de análise dos dados orçamentais da Educação servem de comprovativo para duas opções-chave de política orçamental, que compõem o legado de Mário Centeno na gestão das contas públicas. A primeira é que, ao cumprir o compromisso político de reposição dos rendimentos dos funcionários públicos, o governo engordou o orçamento do Ministério da Educação por via do custo dessa reposição nos salários dos professores. A segunda é que, porque aplicou a reposição e porque teve de manter níveis elevados de contenção orçamental, o governo optou por esmagar as margens orçamentais respeitantes ao funcionamento do sistema educativo, aplicando apenas pequenos reforços do investimento. Ou seja, a decisão política foi de aumentar salários dos funcionários públicos, em vez de investir nos serviços públicos em si.

Dir-me-ão que não é novidade nenhuma que essa tenha sido a linha condutora do governo. Sim, mas vê-la confirmada nos dados orçamentais é fundamental para a avaliação da geringonça. O ponto não é, claro, que a reposição de rendimentos não seja justa (é-o absolutamente), mas sim a velocidade a que deveria ter sido executada: ao optar por reposições mais rápidas e até aumentos salariais, o governo teve de manter o sufoco financeiro sobre os próprios serviços públicos. Isso vê-se na Educação, vê-se na Saúde e vê-se nas áreas sociais onde a degradação dos serviços está documentada. Agora, a um ano de eleições, não é expectável que isto inquiete uma alma que seja. Mas, daqui a alguns anos, talvez mais gente perceba a ironia de ter sido um governo das esquerdas unidas a sacrificar o Estado Social em nome do seu projecto político.

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