Todas as sondagens mostram que há uma descida nas intenções de voto no PS e uma queda na popularidade do primeiro-ministro António Costa. Num primeiro ano de mandato, num Governo com maioria absoluta, esta zanga do eleitorado seria perfeitamente natural e até desejável. Sinal de que o Governo, com as suas políticas, estava a mudar estruturas, o que se traduz sempre em perdas para alguns grupos. O problema é que não é isso que está a acontecer. Apesar de todo o dinheiro que lhe tem sido colocado no bolso desde a pandemia, o eleitorado parece estar a ficar zangado com António Costa. E até o PS começa a estar zangado consigo próprio.

Claro que falar de eleições antecipadas, quando o Governo foi legitimado há pouco mais de um ano com maioria absoluta, só faz sentido porque as razões que têm levado o PS a descer nas sondagens nada têm a ver com reformas estruturais, essas sim seriam razões boas para uma zanga dos eleitores – o tal problema de custos de curto prazo para benefícios a médio e longo prazo. A interrupção da legislatura só se percebe porque aquilo que está a induzir a impopularidade do Governo está relacionado com a perceção, correta ou incorreta, de incapacidade de governar e de escolher equipas.

Desde o início da legislatura que se sucedem os casos de erros na escolha de pessoas e somos confrontados com uma forma de governar amadora e a tratar o Estado como se pertencesse a quem governa. A sucessão de episódios relacionados com a TAP é aterradora, pelo que revela quanto à forma como se lida com o património público, mas também pelo que nos diz sobre as relações internas do Governo. A guerra interna dentro do PS, a opção de António Costa de ter Pedro Nunos Santos dentro do Governo quando se percebe, hoje mais do que nunca, que não fazia parte da equipa, tem de ter uma leitura. Ou António Costa está a fazer o que diz – dar espaço a potenciais sucessores para mostrarem o que valem – ou segue (ou seguia) a regra de manter os inimigos por perto – como dizia Winston Churchill é dentro do partido que estão os inimigos.

Ter como objetivo manter o poder, já sabemos, é a função de quem está na política. Mas o que se tenta acreditar, até através dos modelos da economia política, é que essa função objetivo é capaz de se conciliar com objetivos de desenvolvimento em geral e crescimento em particular. Neste caso não tem sido assim, até agora. A batalha pela conquista e manutenção do poder não se tem traduzido, na governação de António Costa, em progresso. Não, não podemos considerar progresso estarmos a crescer acima da média europeia quando ela é influenciada pelo baixo crescimento dos grandes países e somos ultrapassados pelos que estavam atrás de nós. E não, não podemos satisfazermo-nos com o turismo que um dia pode desaparecer. E menos ainda podemos estar satisfeitos com a degradação do Estado em geral e especialmente com o Estado Social na Educação e na Saúde.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Porque é que desta vez manter o poder não se está a traduzir num salto estrutural do país, especialmente quando temos um Governo com maioria absoluta e com dinheiro, condições necessárias para fazer esse caminho? Aparentemente porque faltam duas condições: saber o que fazer e ser capaz de executar. Podemos estar a ser injustos, até porque o Governo gosta de sublinhar que nenhum outro enfrentou primeiro uma pandemia e depois a guerra com inflação.

O problema que agora se coloca é que, com a degradação a que temos estado a assistir, com a incapacidade de melhorar partes do Estado muito expostas, como a Educação e a Saúde, cada vez mais António Costa terá dificuldade em mobilizar para a sua equipa pessoas capazes de fazerem a mudança.

António Costa está em grande parte a pagar o preço do método que usou para atingir as contas certas. Cortou no que não se via no curto prazo, mas que ia ser muito visível no médio prazo, que chegou agora. E, chegado a esse médio prazo no presente, em que estão expostas as feridas causadas pelos cortes no funcionamento dos serviços públicos, para distribuir dinheiro pelo eleitorado quando ainda não tinha maioria absoluta e precisava de agradar ao PCP e ao Bloco de Esquerda, o Governo vê-se sem capacidade para actuar.

Neste momento tudo indica que vamos perder uma oportunidade única para construirmos um Estado mais moderno, com instituições que funcionem e sejam capazes de ser amigas do crescimento. Estabilidade política dada por uma maioria absoluta e muito dinheiro, é uma das lições dos tempos em que vivemos, são insuficientes para garantirem políticas de desenvolvimento. Como em tudo, é na capacidade das pessoas que está o segredo.