O Bloco de Esquerda olha para os assuntos da guerra e da paz com a profundidade de pensamento de um adolescente com acne. Resumindo, é assim: a paz é boa, a guerra é má; nós gostamos da paz, nós não gostamos da guerra. Parece tudo tão simples, não?
Perante o conflito na Síria e o ataque deste fim de semana pelas forças aliadas, o BE comporta-se como uma espécie de Suíça hippie. Numa posição de santa neutralidade, criticou o “regime de Bashar Al-Assad” — proclamando que “o uso de armas químicas é absolutamente inaceitável” — e, ao mesmo tempo, atacou os Estados Unidos, o Reino Unido e a França pela “escalada de militarismo internacional”. Na nota emitida pela sua Comissão Política, exigiu que Portugal se “distancie claramente” dos aliados e apelou, lacrimejante, à resolução pacífica do conflito sírio.
No mesmo dia, o PCP também condenou, “com a maior firmeza”, o “inaceitável acto de agressão contra a Síria” — mas não se distanciou do regime de Assad. Com os comunistas, sabemos sempre que o pacifismo é apenas um truque para apoiar o belicismo de Putin; e sabemos que o ataque ao “imperialismo norte-americano” é apenas um slogan para disfarçar o apoio ao imperialismo russo. Aquelas palavras são uma arma política, não são um instrumento moral.
O caso do BE é mais grave porque os bloquistas acreditam mesmo naquilo que dizem e escrevem — acham, para lá de qualquer dúvida ou hesitação, que todos os conflitos se resolvem com flores e beijinhos. Nas suas juvenis cabeças, para acabar com uma parte substancial do problema bastaria desarmar todos aqueles que carregassem duas características: serem americanos; serem capitalistas. Talvez seja ocioso recordar-lhes que os Estados Unidos têm 242 anos, o capitalismo (segundo Marx, atenção) tem 600 anos — mas o primeiro registo de guerra tem 14 mil anos.
Quando recebeu o Prémio Nobel da Paz no início do seu primeiro mandato, Barack Obama lembrou que era o Comandante em Chefe de um país que estava a travar duas guerras e explicou muito bem explicadinho como funciona o mundo: “O Mal existe. Um movimento pacifista não conseguiria ter detido os exércitos de Hitler. As negociações não convencem os líderes da Al Qaeda a deixarem as armas. Dizer que por vezes a força pode ser necessária não é um apelo ao cinismo — é um reconhecimento da História, das imperfeições do ser humano e dos limites da razão”.
Mas não se pode esperar que a Comissão Política do Bloco perceba o que Obama quer dizer. Quando levamos o pacifismo aos limites do bom senso, perdemos sempre o compasso moral. No seu comunicado, os bloquistas falam sobre os Estados Unidos — “Não é aceitável qualquer normalização da violência e da barbárie, de ataques contra civis e da violação contínua do Direito Internacional” — sem perceberem que, na realidade e involuntariamente, estão a descrever a atuação do regime sírio. E não percebem porque, de facto, na sua cabeça não há qualquer diferença moral entre as armas químicas do regime sanguinário de Assad e os mísseis dos regimes democráticos dos Estados Unidos, do Reino Unido e da França. Para Catarina Martins, todas as armas são iguais e todas as motivações para as disparar são igualmente condenáveis. Quando chegamos a este ponto de relativismo já não há mais nada a fazer.