No rescaldo de mais um chumbo do Tribunal Constitucional a cortes na despesa do Estado e com a crise provocada pelo colapso do BES ainda longe de estar resolvida, vale a pena pensar no Orçamento de Estado. Não tanto no de 2015 (ainda que a configuração e execução final deste também seja relevante), mas principalmente no de 2016. Considerando que 2015 será ano de eleições legislativas e que, a avaliar pelas sondagens conhecidas, o leque de resultados mais previsíveis está longe de oferecer garantias de estabilidade governativa, as difíceis decisões que será imprescindível tomar no Orçamento para 2016 assumem particular relevância.
Vale a pena recordar que, não obstante toda a retórica em torno da “austeridade” e os sucessivos aumentos de impostos, o défice continua claramente acima de um valor que seja sustentável no médio e longo prazo. É justo reconhecer que, em situação de emergência e sob forte pressão externa, foi feita uma significativa contenção da despesa no curto prazo. Mas os determinantes estruturais da despesa continuam em larga medida inalterados pelo que a pressão de crescimento dos gastos do Estado se continuará a colocar.
Os sucessivos chumbos do Tribunal Constitucional – tendo sempre como alvo medidas de corte na despesa no Estado e nunca as de aumento da carga fiscal suportada pelos contribuintes – não justificam tudo, mas agravam ainda mais a situação. Para além da incapacidade do actual Governo para reduzir estruturalmente a despesa do Estado, o funcionamento do Tribunal Constitucional como uma espécie de segunda Câmara não eleita com forte inclinação estatista é um dado preocupante e que terá de ser enfrentado pelo próximo Governo.
É verdade que, na eventualidade de se verem confrontados com um Governo liderado pelo PS, é de esperar uma maior moderação na tendência dos juízes do Tribunal Constitucional para vetar medidas do executivo. É até possível que, subitamente, o Tribunal Constitucional passe a adoptar uma interpretação bastante mais restritiva dos seus próprios poderes e legitimidade para interferir na governação do país. Mas mesmo tendo isso em conta, o precedente dos últimos três anos é algo que fica marcado para o futuro e que enviesa ainda mais as políticas públicas em Portugal no sentido do aumento contínuo da despesa.
Por outro lado, as implicações totais do colapso do GES e do BES são ainda desconhecidas – em particular no que diz respeito aos outros principais bancos portugueses, dos quais, recorde-se, o maior continua a pertencer ao Estado – e não é de excluir problemas adicionais no sistema financeiro. Tendo em conta a dimensão do BES e também o grau de degradação que a situação atingiu, a conta final para os contribuintes pode acabar por ser bastante significativa, com as consequentes implicações nas já muito debilitadas finanças públicas.
Considerando a conjugação de todos estes factores políticos e económicos, podem muito bem estar reunidos todos os elementos necessários para desencadear uma tempestade perfeita em 2016. É verdade que o facto de Portugal continuar integrado na União Europeia e na zona euro deverá, em princípio, evitar no curto prazo os cenários mais catastróficos. Mas não é menos verdade que essa salvaguarda tem também associados compromissos, nomeadamente no âmbito da disciplina nas finanças públicas. Compromissos que poucos em Portugal parecem estar a ter em conta.
Considerando todos os factores referidos, o cenário que se perspectiva para a elaboração e posterior implementação do Orçamento de Estado para 2016 é francamente complexo. Tanto no plano económico como no plano político, tudo aponta para grandes dificuldades – e uma potencial crise – na sequência das eleições legislativas de 2015 e da preparação do Orçamento para 2016. Seria bom que todos os candidatos a líderes do PS e PSD tivessem isso em conta nas respectivas campanhas.
Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa