Informações da CNN confirmam que os mortos no terremoto que atingiu a Turquia e a Síria já passam a casa dos 20 mil e os feridos chegam a quase 80 mil. O número de vidas que se perderam já ultrapassa as do terremoto de Fukushima, no Japão, em 2011. No entanto, a cada dia que passa, a cobertura da mídia sobre o ocorrido se torna cada vez menos significativa, no Brasil, sobretudo.
Em que pese o fato de a Turquia ser parcialmente europeia, fica evidente que não é assim que o mundo enxerga o país. A própria Ucrânia, numa outra medida, vive uma situação semelhante naquilo que diz respeito à visão mundial acerca daquilo que acontece em seu território. É como se nas entrelinhas se lesse que o país é europeu, mas não o bastante para gerar uma comoção mais intensa.
A velocidade com a qual certas desgraças caem no esquecimento não está necessariamente atrelada à gravidade dos fatos, à violência com a qual ocorreram, nem mesmo com o número de mortos, em si. A velocidade do esquecimento tem relação muito mais íntima com a posição geográfica do evento, bem como com dados como PIB e IDH da nação atingida.
Sempre me lembro dos atentados terroristas em Mogadíscio, na Somália e, inevitavelmente, comparo-o, por exemplo, com o atentado em Paris, no Bataclan. Não se trata de dizer que uma vida aparentemente vale mais do que outra, mas se trata da atenção que se dá a cada morte. Do valor que se confere a cada perda, tratando-a como única ou como genérica.
Escrevi uma vez sobre os mortos em atentados ou desastres naturais que ganham rostos e biografias e aqueles que não ganham nem uma coisa nem outra. Aqueles que ganham apenas números. Vinte e um mil mortos no terremoto que atingiu a Turquia e a Síria. Quem estava nos escombros, além da bebê que nasceu no terremoto e perdeu toda sua família? O que mais sabemos sobre eles? Até onde vai nossa solidariedade?
No Brasil, balas perdidas têm seu valor mensurado de acordo com o trajeto que percorrem. Se forem na direção do morro ou de outras regiões periféricas, não importa tanto quem elas irão atingir. Se mulher ou homem, adulto ou criança. Mas se o trajeto for em direção de bairros de elite, subitamente o potencial lesivo da bala perdida ganha outras conotações. Ela se torna mais grave, mais triste, mais absurda, mais dramática.
Uma vida é uma vida. Mas há vidas vistas como provisórias, precárias. Aquelas que não estavam ali numa perspectiva ascendente, mas sim descendente. Aquelas que apenas aguardavam seus desfechos dramáticos em vez de aguardar destinos melhores. A solidariedade do mundo é fluida. Nossos sentimentos acabam guiados pela mídia e o esquecimento e indiferença acabam por reinar com certa facilidade.