As duas décadas de entrada em circulação das notas e moedas de euro, que se marcaram no dia 1 de Janeiro de 2022, são o pretexto para fazer balanços. E quando olhamos para estes mais de 20 anos da participação de Portugal na União Económica e Monetária temos todas as razões para estar insatisfeitos.

Entrámos no euro logo no primeiro grupo, em 1999, quando nasceu. E, excluindo os anos da pandemia, somos o terceiro país que menos cresceu. Pior que nós só a Grécia e a Itália. Desde a adesão só em seis anos crescemos mais do que a média da Zona Euro, quatro dos quais entre 2016 e 2019. Mas isso não impediu que a nossa taxa média de crescimento se tenha ficado em 1,1%.

Fonte: Ameco;
Notas: Taxa média de crescimento desde a adesão ao euro até 2019, ano anterior à pandemia; Entre parêntesis: ano da entrada no euro.

É verdade que a Zona Euro cresceu sempre menos do que a União Europeia nestes últimos 23 anos, mas integrar a moeda única não nos destina a um crescimento medíocre. Podemos dizer que os países do Alargamento estão na primeira fase e por isso crescem tanto. Mas isso não foi assim connosco – deixámos de convergir logo em 2000 e só há um ano, 2009, em que convergimos, mas aparentemente sem capacidade de sustentar esse crescimento, já que em 2011 entrámos em colapso financeiro. Depois convergimos entre 2016 e 2019, num processo que a pandemia interrompeu.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O exemplo é sem dúvida a Irlanda. Entrou no euro ao mesmo tempo que Portugal, registou, como Portugal, um colapso financeiro, com a sua banca basicamente falida e, apesar disso, foi a economia que mais cresceu nestes 23 anos de União Económica e Monetária, com uma invejável taxa média de 5,2%.

Paul Krugman descreveu a Irlanda como a “Economia duende” ou “Leprechaun Economy” – um duende sapateiro que estava sempre a arranjar o mesmo sapato, segundo se pode ler em algumas referências da mitologia celta. Na altura Krugman atribui o salto que a Irlanda deu no PIB, de 26,3% em 2015, basicamente ao facto de a Apple ter aí contabilizado os seus lucros. Os irlandeses, apesar de Krugman ter dito que tinham sentido de humor, não acharam graça. O embaixador da Irlanda nos Estados Unidos considerou uma “calúnia inaceitável, considerando que o sucesso do crescimento irlandês não é unidimensional, mas antes fundado na educação, mais do que nas vantagens fiscais que oferece às multinacionais tecnológicas. Esse teste será em breve feito quando entrar em vigor o acordo de tributação mínima que está a ser negociado no quadro da OCDE.

Seja qual for a razão, o certo é que a Irlanda é um inegável caso de sucesso que nos devia obrigar a olhar para ela. Não temos, com toda a certeza, condições para aplicar as suas políticas. As medidas em matéria de impostos dificilmente respeitam a hierarquia de valores dos portugueses, se levarmos em conta o que é revelado através das preferências partidárias. Mas há certamente muitas outras medidas que podem ser adoptadas.

Para assinalar os 20 anos da entrada em circulação das notas e moedas de euro, a Sábado editou uma revista especial onde o ex-Presidente da República Aníbal Cavaco Silva identifica, em entrevista, um conjunto de reformas, a que chama “choque reformista” para sairmos desta sina de baixo crescimento: justiça, administração pública e sistema fiscal. Outros economistas poderão identificar outras prioridades, mas é difícil perceber como podemos crescer mais sem, pelo menos, resolvermos os problemas que temos na justiça e na administração pública. E, quer num caso, quer no outro, estamos basicamente a falar de simplificar, dar mais certeza e previsibilidade na relação dos cidadãos com o Estado.

Na apresentação do programa eleitoral do PS, António Costa falou nisso. Para além das matérias que são obviamente temas de sedução de eleitorado, há compromissos que podem fazer a diferença. São eles, designadamente, a redução dos custos de contexto, com intervenção na justiça, com especial relevo para a administrava e fiscal; o regresso do Simplex, uma bandeira do PS que, desde que Maria Manuel Leitão Marques foi para o Parlamento europeu, parece ter caído no esquecimento, e um quadro fiscal mais amigo do investimento. O programa eleitoral do PSD será conhecido esta sexta-feira.

Uma vez que a escolha de 30 de Janeiro se faz entre estes dois partidos, PS e PSD, era fundamental que se concentrassem no objectivo de garantir um crescimento mais elevado para Portugal, em vez de se perderem em vários objectivos, e tendo sempre como referência que a estabilidade financeira – as contas certas como diz António Costa – tem de estar garantida para não deitarmos tudo a perder.

Com mais prosperidade tudo se torna mais fácil de garantir, da redução de impostos e aumentos de salários, a uma educação e saúde de maior qualidade. Fazer do combate à burocracia, lutando pela simplificação nas relações com o Estado, e garantir uma justiça mais rápida e previsível seriam dois pilares de acção que contribuiriam, sem dúvida, para aumentar a produtividade de boa parte das empresas, libertando recursos para o investimento e para pagar melhores salários. E ter uma educação e formação mais exigentes. Olhemos, pelo menos em parte que seja, para a Irlanda.