Dizem que um exemplo vale mais que mil palavras. Vamos ao exemplo: uma pessoa que ultrapassou a barreira dos 40 anos, licenciada no pré-Bolonha, ou seja, nos idos de 90 do século XX, com 5 anos de estudos académicos. Seguiu para mestrado e reforçou ainda as suas competências a níveis variados. Com muitos outros “jovens para reforma e velhos para serem empregáveis”, a pandemia conduziu-a ao desemprego e à busca incessante de trabalho.

E aqui começaram os entraves, não só relacionados com a idade como também pelo próprio IEFP – Instituto de Emprego e Formação Profissional, sendo ainda desprovidos de atratividade para potenciais empregadores.

Por um lado, ainda não se descobriu como dar a volta ao relógio do tempo, logo há que fazer “perder tempo”. O IEFP sugere a tipologia de “cursos e formações”, de, entre vários, inglês para principiantes ou outras matérias, optando por ignorar que estes seus “formandos”, na sua grande maioria dominam o inglês tão bem como o português, que já não estamos num Portugal unilingue, ou então a alternativa de um outro “curso” totalmente desfasado para se obter o resultado desejado, a empregabilidade.

Em termos estatísticos, os desempregados em contexto de “formação” não são considerados para o cálculo da percentagem de desemprego, e assim se vai criando e alimentando a ilusão sobre o número efetivo de cidadãos em situação de desemprego – independentemente do subsídio.

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Segundo os dados da Pordata, em 2021, no extenso universo dos desempregados, 50.435,7 tinham o ensino superior completo. No início deste mês, o INE revelou que a taxa de desemprego do primeiro trimestre de 2022 se situava nos 5,9%.

Se analisarmos os números e “retirarmos” da equação crianças, jovens, estudantes, reformados e pensionistas e ainda os designados “desencorajados”, constatamos que temos uma grande faixa da população, com capacidade, em situação de desemprego. E dentro destes, temos o novo fenómeno distinto das últimas décadas do século XX: pessoas com mais de 40 anos, habilitações académicas, carreiras, competências e skills próprias.

O Governo respondeu com o apoio de fundos europeus, criando os “estágios ativar”, uma medida que abrange a faixa dos 18 /30, dos 30/ 45 e os maiores de 45. Na extensa burocracia que existe para que algumas empresas se possam candidatar a estes apoios (o prazo das candidaturas termina a 30 de junho), convém perceber aqui duas coisas: Um desempregado que seja contratado ao abrigo deste programa será sempre um “estagiário”, tenha 18 ou 50 anos. E o valor da bolsa em função das qualificações académicas é o mesmo para um jovem de 23 anos com parca experiência e uma licenciatura de 3 anos, ou para um desempregado de 50 anos e com uma carreira no curriculum.

O que o Governo oferece é um “estágio” de 6, 9 ou 12 meses aos novos desempregados e salários brutos que oscilam entre os €576,16 (pessoas sem qualificação) e os €1108,00 (pessoas com um doutoramento). As empresas podem ser “ajudadas” com valores que variam entre os 80% e os 95% (em circunstâncias especiais) mas se uma entidade empregadora pode contratar um jovem de 23 anos, irá escolher o profissional de 50? As empresas portuguesas não estão ainda preparadas para contratarem a experiência, razão pela qual os anúncios de emprego referem sistematicamente que estão a recrutar juniores.

Os novos desempregados são estas pessoas, que são aos olhos de uns “os outros”, que se tiverem a sorte de serem recrutados passam de profissionais (alguns, de excelência), a estagiários. Já para as empresas, a burocracia do processo de candidatura e os tempos de espera são extensos. Mas as empresas, nesta retoma pós pandemia, também não podem esperar. Porventura, seria mais útil se o IEFP criasse protocolos, inscrevesse os seus utentes como candidatos a todos estes programas, sabendo que ter uma licenciatura de 5 anos é quase igual, na maioria das condições, aos novos mestrados. E seria muito mais eficaz se o Governo olhasse com atenção para estas “bolsas” que oferece. Basta fazer contas. Uma pessoa com um doutoramento no âmbito do programa “ativar” passa automaticamente a estagiário e no limite leva para casa €1108,00 + €4,77 por dia de subsídio de alimentação. É tempo do Governo ativar mecanismos e apostar na excelência e nas competências do seu próprio País.