As condições parecem estar reunidas para que na próxima legislatura o salário mínimo aumente para 700 euros. Entre 2014 e 2019, o salário mínimo aumentou de 485 para 600 euros, isto é, 24%. O aumento de 17% (+ 100 euros) nos próximos quatro anos está previsto no programa eleitoral do PSD. O PS, embora condicione o aumento do salário mínimo à evolução dos restantes salários e de outros indicadores da economia, coloca ênfase na política de rendimentos. António Saraiva, presidente da CIP, concorda com o aumento para 700 euros. Os sindicatos, obviamente, querem ir ainda mais longe.
Estamos todos de acordo que os salários em Portugal são baixos. Os dados mostram-nos que os salários portugueses estão entre os mais baixos da União Europeia. Em 2018, o salário médio dos trabalhadores por conta de outrem (tendo em conta as diferenças de poder de compra entre países) posicionava Portugal na 21ª posição entre todos os países da UE. É de facto um valor muito baixo, mas corresponde exactamente à posição que Portugal ocupa em termos de PIB per capita.
Quando consideramos apenas os países da UE que têm salário mínimo, em termos de PIB per capita e de salário médio, surgimos na 15ª posição, e em termos do valor do salário mínimo surgimos na 13ª posição – ver Tabela.
Estes dados sugerem que o salário mínimo, tendo em conta a posição da economia portuguesa em termos de PIB per capita, não compara mal com os restantes países da UE. Esta observação é reforçada pela proximidade do salário mínimo em relação ao salário mediano: em 2018, o salário mínimo correspondia a 61% do salário mediano. Na UE, apenas a França (62%) apresentava um valor deste indicador (índice de Kaitz) superior a Portugal. O valor daquele indicador é ainda mais elevado fora das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, onde os salários são mais baixos.
Em 2017, os trabalhadores abrangidos pelo salário mínimo representaram mais de 25% dos trabalhadores por conta de outrem. Em sectores como o ‘Alojamento e a Restauração’ ou a ‘Construção’ aquela percentagem chegou a ultrapassar, respectivamente, os 40% e os 30%. É uma fracção muito elevada dos salários determinada por legislação nacional e significa uma diminuição do espaço das empresas para diferenciar os salários.
O aumento do salário mínimo justifica-se por razões sociais, nomeadamente a proteção do nível de vida de trabalhadores com baixas qualificações e com reduzido poder de negociação salarial. Sendo Portugal um dos países com maiores desigualdades salariais, o aumento do salário mínimo pode ser um instrumento eficaz na redução das desigualdades. Os resultados dos últimos quatros anos sugerem que o aumento do salário mínimo foi eficaz nessas dimensões.
O aumento do salário mínimo pode induzir o investimento das empresas com o objectivo de reduzir as despesas com pessoal, que resultará em aumentos de produtividade, que por sua vez gerará mais crescimento, mais emprego e criará condições para aumentos sustentados dos salários no futuro.
Por outro lado, o aumento do salário mínimo pode também retirar do tecido produtivo empresas com níveis de eficiência muito baixos, contribuindo para o aumento da produtividade global da economia.
As decisões em relação aos aumentos futuros de salários devem ter em conta estes efeitos e devem ser sustentadas em estudos. O facto de o aumento de 20% do salário mínimo, nos últimos anos, ter coincidido com o aumento de 300 mil empregos não nos pode levar a concluir que aumentos do salário mínimo não poderão vir a resultar numa redução do emprego no futuro.
Como sugerem os dados acima, para aumentarmos os salários temos de aumentar o PIB per capita. Para que este aumente temos de aumentar a produtividade. O aumento desta dependerá do aproveitamento dos recursos altamente qualificados que saem das nossas universidades e da atração de investimento directo estrangeiro que acelere a inserção na economia global.
O crescimento sustentado da produtividade e dos salários dependerá da capacidade de continuarmos a transformar a economia portuguesa numa economia mais exportadora. As empresas portuguesas têm de fazer parte das Grandes Cadeias de Valor Globais e crescer com elas em dimensão e na capacidade de criar mais valor. Uma política que vise o aumento sustentado dos salários, terá de promover as condições de competitividade das empresas nos mercados globais.
Para ilustrar os riscos de uma política centrada no aumento dos salários basta recordar o que aconteceu aos salários dos funcionários públicos e às pensões. Sem margem orçamental para aumentar aquelas despesas, será uma tentação para o Governo prosseguir as políticas de aumento do salário mínimo, até porque são suportadas pelas empresas, beneficiam uma parte significativa do eleitorado e permitem a arrecadação de mais receitas fiscais e da Segurança Social. No entanto, e apesar dos benefícios que referi acima, pensar que podemos sustentar o crescimento dos salários em aumentos do salário mínimo será voltar aos erros do passado.
Infelizmente, os salários não aumentam por decreto.