O governo apresentou recentemente o PETS (Plano de Emergência e Transformação da Saúde), o que pretendo fazer neste texto é uma análise crítica do documento, procurando dar a minha contribuição de forma a que possa ser melhorado, servindo dessa forma melhor os utentes. Em primeiro lugar, parece-me justo saudar o esforço aqui feito de identificar problemas e apresentar (algumas) soluções numa área tão complexa, negligenciada e mal tratada nos anos mais recentes. Se o esforço em concretizar este documento merece a minha saudação, o resultado fica aquém das expectativas. O plano divide-se em cinco eixos estratégicos (resposta a tempo e horas, bebés e mães em segurança, cuidados urgentes e emergentes, saúde próxima e familiar, saúde mental).

O eixo 1 – resposta a tempo e horas, tem como objectivo “operar todos os doentes oncológicos que tenham ultrapassado o tempo máximo de resposta garantida num período de 3 meses, sob incentivo à produção adicional nos hospitais públicos”. De acordo com os números mais recentes são mais de 9000 doentes nestas situações, ou seja, para que todos sejam operados em 3 meses será necessário realizar cerca de 143 cirurgias por dia, um número ambicioso,  (ainda para mais em período de férias) mas que todos desejamos que seja alcançado. O plano prevê também a “criação de programas que evitem o crescimento das listas de inscritos para cirurgias e das listas de espera para consultas” através da “revisão de protocolos para referenciação por partes dos Cuidados de Saúde Primários e revisão dos protocolos para inclusão dos doentes em lista de espera para cirurgia”. São palavras bonitas mas vazias de significado, é absolutamente incompreensível que neste documento as palavras “inteligência artificial” apareçam um total de zero vezes, esta que será porventura a maior revolução na área da saúde e que poderá dar um contributo extraordinário, por exemplo, na marcação de consultas; hoje um médico hospitalar perde centenas de horas a ler as referenciações de médicos de família quando devia estar a usar esse tempo para operar e fazer consultas. A realidade com que os profissionais de saúde se deparam é com a utilização de inúmeras plataformas informáticas que funcionam de forma ineficiente e que não comunicam entre si, levando muitas vezes ao desespero aqueles que as usam, tal é o número de vezes em que simplesmente estão inoperacionais.

A realização de mais cirurgias só será possível com o aumento do número de blocos operatórios em alguns hospitais, o que o plano não prevê.

O eixo 2 – bebés e mães em segurança, prevê corrigir o maior falhanço da governação socialista, a incerteza e insegurança a que milhares de famílias foram sujeitas na altura do parto, o ministério da saúde não conseguirá inventar blocos de partos nem obstetras, o que se pede é organização e gestão dos recursos existentes e que essa informação chegue de forma rápida e actualizada às grávidas.

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Eixo 3 – cuidados urgentes e emergentes. Neste eixo o plano prevê “a criação de centros de atendimento clínico e consulta do dia seguinte nos cuidados de saúde primários” e “libertar camas indevidamente ocupadas por situações sociais nos internamentos hospitalares dedicados a doentes com patologia aguda” mais uma vez a pergunta que se impõe é como é que o governo prevê fazer isso? Numa população cada vez mais envelhecida, a aposta nos cuidados continuados é fundamental e a sua ausência neste plano é uma lacuna grave.

Eixo 4 – saúde próxima e familiar. Sobre este eixo convém começar por dizer que a Associação Portuguesa De Medicina Geral e Familiar não foi ouvida por quem elaborou o plano, o que o seu coordenador apelidou de “lapso”. Este eixo prevê o “lançamento de concurso público para a implementação de 4 agrupamentos compostos por 5 USF modelo C, cada um em regiões com carências de médicos de família”, mais uma vez o plano não concretiza o mais importante, quem construirá e quem gerirá essas USF? O que se ganha exactamente com este modelo? Sejamos claros, se o governo quiser dar de facto médico de família a cada português terá que, forçosamente, contar com o sector privado, e neste caso, muito mais importantes que os grandes hospitais e grupos de saúde, o que tem que ser feito é um acordo de larguíssima escala com as pequenas e médias clínicas de bairro e com os consultórios de médicos privados de forma a que estes possam formar carteiras de utentes, sobretudo com doentes crónicos (hipertensos e diabéticos), crianças, jovens e grávidas. O plano prevê ainda uma coisa extraordinária, “estimular a adesão dos médicos a uma carteira adicional de até 200 utentes em regime voluntário”, percebe-se que este plano foi elaborado por quem não tem qualquer noção do volume de trabalho de um médico de família. Mais uma vez, será fundamental retirar toda a carga burocrática e ineficiência informática a que os médicos de família estão sujeitos, para que estes se dediquem ao que realmente sabem e devem fazer, consultas.

Eixo 5 – saúde mental. Sobre este eixo parece-me que a “requalificação das urgências psiquiátricas em  termos de instalações e equipamentos” deva ser prioritário para evitar o que acontece na maioria dos hospitais em que os doentes psiquiátricos estão lado a lado com todos os outros, o que causa “constrangimentos” a todos. O reforço de 200 psicólogos nos cuidados de saúde primários peca por escasso e o recente anúncio de cheque-psicólogo e cheque-nutrição apenas a alunos do ensino superior, mais uma vez mostra o desconhecimento da realidade.

Em resumo, este plano identifica alguns problemas relevantes, no entanto, as soluções que apresenta são vagas, gerais e algumas dificilmente exequíveis. Percebe-se que o governo queira mostrar trabalho rapidamente, pede-se que quando o faça tenha de facto alguma coisa para apresentar.